Depois do pobre que vira classe
média sem sair da pobreza, o Brasil Maravilha inventou o ex-miserável que
continua paupérrimo. Vai acabar inventando o mendigo magnata
Augusto Nunes
Às vésperas da celebração dos
10 anos da Descoberta dos Cofres Federais, a presidente da República animou a
quermesse do PT com outra notícia assombrosa: falta muito pouco para a completa
erradicação da miséria em território nacional. “Mais 2,5 milhões de brasileiras
e brasileiros estão deixando a extrema pobreza”, informou Dilma Rousseff em 17
de fevereiro.
Eram os últimos indigentes
cadastrados pelo governo federal. Graças aos trocados distribuídos pelo
programa Brasil Carinhoso, todos passaram a ganhar R$ 71 por mês. E só é
miserável quem ganha menos de R$ 70. Passou disso, é pobre. Nesta
segunda-feira, depois de cumprimentar-se pela façanha, Dilma reiterou que o
miserável-brasileiro só não é uma espécie extinta porque cerca de 500 mil
famílias em situação de pobreza extrema estão fora do cadastro do
Bolsa-Família.
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Para o governo, os mendigos de
São Paulo estão acima da classe média
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Como nem sabe quem são,
quantos são e onde moram esses miseráveis recalcitrantes, o governo não pôde
transferi-los para a divisão superior. “O Estado não deve esperar que essas
pessoas em situação de pobreza extrema batam à nossa porta para que nós os
encontremos”, repetiu no Café com a Presidenta. Até dezembro de 2014, prometeu,
o governo encontrará um por um.
Queiram ou não, estejam onde
estiverem ─ num cafundó da Amazônia ou no mais remoto grotão do Centro-Oeste – ,
todos serão obrigados a subir na vida. Enquanto isso, perguntam os que não perderam
o juízo, que tal resolver a situação dos incontáveis pedintes visíveis a olho
nu, o dia inteiro, nas esquinas mais movimentadas de todo o país?
O que espera a supergerente de
araque para estender os braços do governo às mãos de crianças que vendem balas,
jovens com malabares, adultos que limpam parabrisas sem pedir licença, mulheres
que sobraçam bebês, velhos hemiplégicos e outros passageiros do último vagão?
Porque não são miseráveis, informam os especialistas em ilusionismo estatístico
a serviço dos farsantes no poder.
Desde maio de 2012, por
decisão do Planalto, vigora a pirâmide social redesenhada pelo ministro
Wellington Moreira Franco, chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos.
Segundo esse monumento ao cinismo, a faixa dos miseráveis abrange quem ganha
individualmente entre zero e R$ 70 reais. A pobreza vai de R$ 71 a R$ 250. A
classe média começa em R$ 251 e a acaba em R$ 850.
Os que embolsam mais de R$ 851
são ricos, e é nessa categoria que se enquadram milhares de seres andrajosos
que plantam de manhã à noite nos principais cruzamentos de São Paulo. Esmolando
oito horas por dia, cada um ganha de R$ 35 a R$ 40. Quase todos rondam os R$
1.200 por mês. São, portanto, pedintes de classe média. Caso melhorem a
produtividade, logo serão mendigos milionários.
Os analfabetos são quase 13
milhões, há mais de 30 milhões de analfabetos funcionais, a rede de ensino
público está em frangalhos. Metade da população não tem acesso a serviços
básicos de saneamento, o sistema de saúde pública é indecente. As três
refeições diárias prometidas por Lula em fevereiro de 2003 nunca desceram do
palanque, um oceano de desvalidos tenta sobreviver com dois reais e alguns
centavos por dia.
De costas para o mundo real,
os vigaristas no comando seguem fazendo de conta que o Primeiríssimo Mundo é
aqui. O pior é que uma imensidão de vítimas do embuste parece acreditar na
existência do Brasil Maravilha registrado em cartório. E vota nos gigolôs da
miséria com a expressão satisfeita de quem vive numa Noruega com muito sol e
Carnaval.
Essa parceria entre a
esperteza e a ignorância faz milagres. Depois de inventar o pobre que sobe para
a classe média sem sair da pobreza, inventou agora o ex-miserável que não tem
onde cair morto. Vai acabar inventando o mendigo magnata.
Título, Imagem e Texto: Augusto Nunes, 26-02-2013
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