domingo, 2 de novembro de 2025

Brasil: governadores contra a ditadura?


Walter Biancardine

O que vimos na quinta-feira, no Rio de Janeiro, poderia ter sido mais que uma reunião administrativa: quisera fosse o primeiro despertar de um poder popular que ameaça o império burocrático da ditadura esquerdista no Brasil. Governadores de Minas Gerais, Goiás, Santa Catarina, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Espírito Santo atenderam ao chamado do governador fluminense Cláudio Castro após a mega operação policial que ceifou dezenas de criminosos e expôs, de novo, o domínio das facções sobre o Estado.

Dali surgiu o assim chamado Consórcio da Paz – um pacto interestadual para troca de inteligência e ações conjuntas contra o crime organizado. Mas o nome é eufemismo: o que realmente me interessaria que se desenhasse seria o surgimento de uma frente federativa conservadora, uma reação contra a ditadura cultural, política e institucional da esquerda que usurpou a República.

Essa frente, se amadurecesse, representaria algo inédito desde a redemocratização: governadores desafiando abertamente o poder central. Seria a redescoberta do princípio federativo, o eco longínquo das antigas Províncias reagindo ao absolutismo da Corte.

O governo federal, centralizador por natureza e esquerdista por vocação, não tolerou sequer a operação policial. Já se moveu, e rápido: bastou Cláudio Castro levantar a voz para que o sistema inteiro se erguesse contra ele. No mesmo dia da reunião, o Ministério Público Eleitoral anunciou a reabertura do processo que pode cassar seu mandato, alegando “abuso de poder político e econômico”. A coincidência é grosseira demais para ser inocente.

Quando um governador age, o sistema pune. Quando um estado se ergue, a máquina ameaça. Eis a pedagogia do medo – instrumento preferido de ditaduras que fingem democracia enquanto exercem coerção. 

A possibilidade real de uma frente anti-sistêmica

A pergunta é: haverá coragem para seguir adiante?

Os sinais são ambíguos e, infelizmente, nada promissores. Há governadores de temperamento resoluto que não escondem incômodo com o autoritarismo ideológico do governo federal, mas há também os que titubeiam, sempre atentos à manchete de amanhã, aos fundos de Brasília, aos sorrisos do STF.

Formar uma frente não é apertar mãos diante das câmeras; é assumir risco político, enfrentar o Leviatã administrativo, e estar disposto a pagar o preço da autonomia. A história brasileira mostra que os estados nunca sustentaram longamente um movimento federativo robusto – sempre sucumbiram à chantagem financeira e à propaganda moralista do centro.

Ainda assim o momento é propício, embora pouco promissor. A indignação popular cresce, o país real está exausto de slogans e relativismos, e cada nova morte causada pelo crime organizado torna mais evidente o fracasso do modelo progressista de segurança pública – aquele que “entende” o bandido, “vítima” do cidadão, mas não protege o homem comum pagador de impostos.

Se esses governadores mantivessem firmeza e unidade, poderiam construir um contrapoder legítimo. Hesitando ou fazendo apenas um teatro político, serão tragados pelo mesmo pântano institucional que devorou tantos, antes deles. 

A ausência de Tarcísio e a máscara do “governador técnico”

Nesse cenário, a ausência de Tarcísio de Freitas no encontro foi sintomática – e, diga-se, vergonhosa. O governador de São Paulo limitou-se a participar por videoconferência, alegando prudência, “análise” e “neutralidade”, além de “ter poucas informações”.

Tradução: covardia política.

Quem teme o desgaste de aparecer ao lado de governadores combativos não é líder, é gerente de condomínio estatal. Tarcísio foi ungido pela direita, eleito pelo impulso conservador, e agora age como funcionário do sistema. Fala em eficiência, mas silencia diante da usurpação de liberdade; apregoa gestão, mas foge do confronto moral.

Enquanto Cláudio Castro é caçado pelo aparato judiciário, Tarcísio assiste de camarote, medindo as palavras para não contrariar o jornalismo militante que o bajulava em tempos de campanha e, principalmente, seus padrinhos togados.

E assim se revela o que muitos já suspeitavam: ele é do sistema. Talvez sem perceber, tornou-se peça de reposição do mesmo maquinário que fingiu combater. 

O povo do Rio: sofre, mas não aprende

Resta falar do povo do Rio de Janeiro – um povo de natureza dramática, capaz de heroísmos e abismos na mesma respiração. Desde o governo de Leonel Brizola, em 1982, o carioca e o fluminense sofrem com o crime, a corrupção e o caos moral, mas o carioca em especial parece persistir em entregar o poder aos mesmos rostos que o condenam à decadência.

A eleição de Eduardo Paes é o exemplo acabado disso: o malemolente praiano prefere o prefeito do samba, da piada pronta e da autopromoção ao gestor que imponha ordem e disciplina.

É o vício de um povo que reclama da lama mas tem medo do sabão.

O Rio sofre, mas não aprende. Quer segurança, mas vota em quem protege a desordem; quer decência, mas se encanta com o cinismo. Cláudio Castro, por mais limitado que seja, teve a audácia de romper o cerco. E por isso será perseguido.

Enquanto o povo permanecer adormecido, a cidade continuará refém – não apenas das facções armadas, mas também das facções políticas que as chefiam e delas se alimentam. O Brasil precisa de governadores que compreendam que a luta pela lei é também uma luta pela civilização, uma luta pela própria vida.

E precisa de um povo que entenda, de uma vez por todas, que quem vota em demagogos está assinando o próprio atestado de servidão.

Ainda assim, insisto em sonhar com uma frente de governadores derrubando a ditadura.

Quem sabe?

Título e Texto: Walter Biancardine, ContraCultura, 2-11-2025

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