Gastão Reis
Poucos dias antes antes da operação de 28 de outubro passado, nas comunidades da Penha e do Complexo do Alemão, eu me perguntava por que a grande mídia não dava o devido destaque ao que vinha realmente acontecendo no dia a dia de quem tinha, a contragosto, de conviver com o terror do narcotráfico. Aquela história para boi dormir de que havia sido estabelecido um modus vivendi entre os traficantes e as pessoas que lá viviam escondia o clima de medo que imperava na base da lei da selva.
É sempre desanimador, a
despeito da urgência, constatar a técnica de empurrar com a barriga as medidas
realmente necessárias para enfrentar o problema em toda sua amplitude, que vai
muito além do Rio de Janeiro. Ficava no ar a suposta incompetência do governo
do estado em enfrentar o problema. Na verdade, a ADPF 635 das “brilhantes”
mentes do PSB e do STF virou um instrumento de impedimento para ações mais
efetivas e eficazes.
O governador Cláudio Castro,
corretamente, se referiu a ela como a maldita ADPF 635. Ou seja, a arguição de
descumprimento de preceito fundamental, que veio envelopada como ação
constitucional proposta pelo PSB – Partido Socialista Brasileiro. Ela foi apresentada
ao STF em novembro de 2019. Pouco depois, em junho de 2020, o STF concedeu a
liminar que impôs duras restrições às operações policiais nas comunidades do
Rio de Janeiro, exigindo justificativas detalhadas para as operações a serem
realizadas. (Alguns analistas da impreensa de alcance nacional parecem não ter
se dado conta de que a mortandade do 28 de outubro se deveu ao fato de que o
Rio de Janeiro havia se tornado o quartel general dos chefes nacionais dos
traficantes com mais de quarenta deles escondidos nas duas áreas de confronto.
E que a parede do BOPE na floresta da pretendida fuga não foi enfrentada pelos
bandidos com bandeiras brancas de paz, mas com reação a tiros até de
metralhadoras. Optaram por morrer por uma “causa” cujo respeito pelo próximo é
zero.)
As medidas da ADPF 365 que
impediam a necessária ação policial foram modificadas somente em abril de 2025,
com outras determinações que substituiram as situação anterior de deixar os
narcotraficantes à vontade. Foi só então, cinco anos depois, que o governador
Cláudio Castro pode tomar, após longo e minucioso planejamento, as medidas
necessárias para deslanchar a operação de 28 de outubro
passado.
Se houve demora de anos a fio,
a conta deveria ser enviada ao PSB e ao STF. Não obstante, o ministro Alexandre
de Moraes veio ao Rio para tomar satisfações do governador Cláudio Castro.
Justo seria o oposto. Na verdade, já aconteceu quando o governador se referiu à
maldita ADPF 635 expedida pelo STF, que o impediu de agir com a presteza
necessária. Tudo que ele possa desejar saber já teria sido dito.
Castro teve o cuidado de
informar aos diversos órgãos federais que iria levar adiante a exitosa
operação, que recebeu amplo apoio da população, inclusive das próprias
comunidades submetidas ao terror dos traficantes. Será que ninguém sabia que
imperava a Lei do Silêncio nas comunidades? Denunciar poderia acabar na morte
de quem ousasse. E isto sem mencionar cenas de tortura e assassinatos de
habitantes da comunidade a supostos dela-tores ou daqueles incapazes de saldar
seus débitos pelas drogas consumidas.
O lado trágico na vida das
comunidades foi a omissão das autoridades em dar conta de suas obrigações
legais. Na verdade, a decisão do STF postergou por anos o que precisava ser
feito em defesa das comunidades. É impossível que as referidas autoridades desconhecessem
o que estava ocorrendo em tantas comunidades no Rio de Janeiro e Brasil afora
quanto à crueldade e clima de terror implantados nessas áreas sob a batuta dos narcotraficantes.
Eurípedes, o famoso dramaturgo grego, que abria espaço em suas peças para
sábias reflexões políticas e filosóficas, é o autor da seguinte máxima: “A
língua é mais poderosa do que a lâmina.” Estava ressaltando o poder de quem,
hoje, tem a caneta na mão, como foi o caso do STF, não só nesse episódio da
vida das comunidades como naquele de permitir, após descondenar um condenado
por um colegiado de juízes, para voltar à presidência da república. Aquele
senhor que foi aplaudido nos presídios quando os detentos souberam de sua
eleição em 2022. Fica ou não fica no ar um clima de conivência?
O envio por Lula do ministro
Lewandowski ao Rio de Janeiro nos faz lembrar daquele dito em que a emenda
ficou pior que o soneto. Na entrevista pública conjunta entre o ministro e o
governador, este deixou claro a omissão do governo federal, e até mesmo da
Polícia Federal, que foi comunicada, mas não se mexeu. Num primeiro momento,
Lula estava obedecendo ordens de seu marqueteiro Sidônio Palmeira para que ficasse
de bico calado, mas depois voltou a dizer bobagens. Castro não pediu ajuda a
Lula por saber de antemão que o não estava garantido.
Em relação ao futuro, o lado
positivo foi a reunião de apoio de nove governadores à operação exitosa de
Castro. E foi assim que o País se deu conta da guerra, sim, da guerra, a ser
travada contra o narcotráfico. E que também já recebeu apoio de nossos vizinhos,
a saber: Argentina, Paraguai, Uruguai e Bolívia. Ou seja, o problema do combate ao crime organizado extrapolou nossas fronteiras,
envolvendo praticamente toda a América Latina.
Pesquisa recente nos mostra
que 72% da população brasileira apoia enquadrar os narcotraficantes como
terroristas. E ainda endurecer as medidas de combate ao crime organizado. Na
entrada de uma das comunidades do Rio de Janeiro, havia uma placa onde estava
escrito Comando Vermelho. Quem conhece o dia a dia das pessoas que vivem sob o
clima de terror do narcotráfico não tem a menor dúvida de que eles agem como donos do território.
O único a ter dúvida foi o presidente Lula. Parece estar mais preocupado com os direitos humanos dos narcotraficantes, esquecendo os diretos humanos das habitantes das comunidades sob o jugo do terror há muitos e muitos anos.
Nota: Digite no Google “Dois minutos com Gastão Reis: Inversão de valores”, ou pelo link: https://www.youtube.com/watch?v=CSpng1r_oRA
Título e Texto: Gastão Reis, e-mail: gastaoreis2@gmail.com, O Dia, 8-11-2025

Megaoperação na esquerda
ResponderExcluirAs consequências políticas da megaoperação policial nos complexos do Alemão e da Penha, na última semana, seguem acontecendo. E não só na direita. À esquerda, o debate também se acirrou.
Políticos se dividiram em três grupos nessa história: os que seguem criticando tudo nesse tipo de ação; os que consideram que algumas operações são necessárias, mas não como foram as da última semana; e os que defenderam o que ocorreu terça passada.
Nesse último bloco está Washington Quaquá, prefeito de Maricá, que vem endurecendo seu discurso em relação à segurança pública.
Quaquá não está sozinho nessa. No entanto, ainda há muita gente com medo de concordar com ele publicamente e perder votos progressistas por isso. Esse será um dos temas centrais da próxima eleição. Vamos ver qual será o discurso até lá.