Aparecido Raimundo de Souza
Ainda que eu não
esteja no teclado, somente ouvindo ou dedilhando o som das suas notas, como se
vindas de um ponto distante. Não importa. Nessas horas simplesmente me
transporto. Quando a música começa, o mundo ao meu redor desacelera. As paredes
do meu apê desaparecem, e de repente sou lançado por trilhas suaves e
invisíveis. Viajo nesses momentos mágicos, por horas e horas. Me deleito por
sendas que não reconheço, mas que me acolhem.
É como se cada nota
tocada ou ouvida fosse uma bússola apontando o futuro para dentro de mim e não
só me direcionando, ou me revelando paisagens, todavia, conduzindo meu espírito
para lugares que nunca explorei. De roldão, visitarei lembranças esquecidas,
abraçarei desejos não realizados, me livrarei de medos bobos que se camuflavam
de coragem. Essa música, me fará viajar sem malas e sem mapas. Me levará por
desertos de silêncio e florestas de emoções imorredouras. Às vezes, me encontro
em um mundo paralelo.
Me pilho num vilarejo
onde o tempo parou, e então fico ouvindo vozes que falam em línguas que não
conheço, mas por algum motivo entendo. Noutras, estou flutuando sobre cidades
futuristas, como se estivesse plainado ao redor de prédios altos, onde cada batida
me impulsiona em direção ao além mavioso de um céu desconhecido. Ela, a música,
me ensina que o incógnito adventício e duvidoso, logo em seguida me mostrará
que por onde eu transitar não será um lugar de perigo, porém de novas
descobertas.
Em paralelo, me fará ver também que há uma beleza rara e incomum naquilo que não compreendo de imediato. Me fará crer que viajar em suas ondas sonoras não será apenas mudar de lugar, outrossim de perspectiva. E quando a derradeira nota ecoar, prevalecerá um arroubo sempiterno ameno e deleitável, e eu não serei mais o mesmo de antes. Trarei de volta, para o meu mundinho retido dentro do meu apartamento, um porvir esplendoroso.
Regredirei diferente é
claro. Regressarei extasiado, contemplativo, arrebatado, embebido dos pés à
cabeça com algo novo formado dentro de todo meu “eu”, ou seja, me exaltarei
empanturrado, inundado a alma toda com ideias corpulentas, ingurgitadas numa sensação
e no ar que respiro uma paz jamais sentida. Essa música que ouço e se espalha,
não me dará somente respostas. Ela me proporcionará algo mais e me mostrará
caminhos sedentos de amanhã.
Essa música eu diria
sem medo de errar, acabou com a minha quase demência, com meu início de
alzaimer. Não sei o nome dessa música. Apenas me foi dado conhecer e entender
que é composta de uma melodia que completou a minha vida. Me sinto, por conta,
vivo. Igualmente me abraso livre, me incendeio. É a música terapia da minha
vida. A indagação que agora deixo para você, meu caro amigo, é uma só: qual é à
música da sua vida? Qual a melodia que lhe transportará para lugares além do
chão onde atualmente está pisando?
Sugiro que você pare e
tente capturá-la. Se atenha a uma canção suave e serena, que seja envolvente,
que provoque a sua alma, que contemple o seu espírito e, sobretudo, que lhe
faça sentir seguro. Como a mim, você verá se dissolver o nevoeiro que o está afligindo.
Acredite, essa música existe em cada um de nós e pasme, ela não só devolve a
paz, alimenta a alegria de viver...e nos guia para um campo neutro onde nos
sentimos realizados.
Essa música lhe
devolverá, no mesmo tempo, ao que melhor existe dentro do oco que fere a sua
vida cotidiana. Faça, pois, como eu. Crie um ritual. Apague o mundo. Se recolha
em sua cama, coloque os fones no ouvido e se deixe levar pelo som do amor. Ele
lhe conduzirá. Dia seguinte, você não acordará apenas desperto. Você se
maravilhará vivo. Lembra sempre do que direi antes de terminar: quando a mente
começar a falhar, você se deparará, do nada com uma forma de dizer: “Ainda
estou aqui.”
E estará mesmo.
Inteiro, saltitante, repaginado. Não é preciso muito para viajar longe. Nem
passaporte, nem estrada, nem dinheiro. Basta um par de fones de ouvido e a
coragem de se entregar ao som da música certa. Não qualquer som, não o barulho
do que está ao seu redor, não o batuque frenético que o empurrará para fora,
mas aquela centelha sutil que o desconectará do habitual. Tente capturar a
música certa, aquela que não gritará nem agredirá seus tímpanos.
A música certa, meu
caro amigo é a que sussurrará. Ela é feita de instantes suaves, de acordes que
parecem respirar. Poderá vir de um órgão solitário tocando como se conversasse
com o infinito. Poderá ser de um piano, de uma sanfona, de uma guitarra, ou de
um violino que deslizará acordes como água sobre pedra. O importante é que ela
não lhe tire o foco, apenas o distraia e se revele a você por inteira. Você não
precisará entender de música. Só carecerá de sentir. À noite, quando tudo se
acalmar, repito para que não esqueça: tome um banho, desligue as notificações,
apague as luzes.
Tente se desconectar e
se ater ao som limpo, puro, como se ele fosse feito para você. E então,
acontecerá. Algo mavioso, inesperado. A sua mente desacelerará. O coração
mudará de ritmo. Baterá mais leve. Os pensamentos antes embaralhados, começarão
a se alinhar como estrelas cadentes num céu magnânimo. Você não dormirá. Você
se reconectará com você mesmo. Quando o dia seguinte nascer, você não acordará
apenas descansado. Seu todo pulará para a vida, saltará de alma nova. Você, meu amigo, se verá inteiramente R E
N O V A D O.
Título e Texto: Aparecido Raimundo de Souza, de Vila Velha, no Espírito Santo, 16-9-2025
Anteriores:Algumas palavras sobre “La Liberté guidant le peuple”
Foi assim, inexplicavelmente incrível
Ela seria uma espécie desconhecida de sólido geométrico?
O julgamento do ano ou a divina sacanagem da comédia humana?
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-