sexta-feira, 22 de agosto de 2025

O cão que fuma


Marcelo Duarte Lins

Todo tempo tem seus paradoxos. Entre fumaça e silêncios, entre a pressa da notícia e a lentidão da memória.

O cão que fuma é um espaço para olhares inquietos. Feito de perguntas mais do que de respostas, de reflexões que não cabem nos manuais e de histórias que sobrevivem ao esquecimento.

Por que “o cão que fuma”? Porque toda imagem absurda carrega em si uma verdade escondida: o insólito nos obriga a pensar. O cão não deveria fumar — mas fuma. O poder não deveria ser autoritário — mas é. A vida não deveria ser tão breve — mas é.

Este espaço é convite a quem gosta de crônicas, ensaios, lampejos filosóficos e observações que atravessam política, história e cotidiano. Aqui, o que importa não é a certeza, mas a centelha.

Entre, sente-se. O cão já acendeu outro cigarro.

O cão traga devagar. Solta a fumaça como quem suspira pelo mundo. Observa os homens correrem atrás de suas próprias correntes — chamam de rotina, chamam de progresso, chamam de vida.

A História, no entanto, insiste em repetir-se como se fosse piada sem graça. Robespierre acreditou na lâmina como instrumento de justiça, e terminou descobrindo que toda guilhotina tem sede insaciável. Lavoisier, que decifrou a matéria, foi reduzido a pó pela mesma lâmina que servia à República.

Mudam os cenários, mas não as sinas. Sempre há um poder travestido de democracia, um autoritarismo com máscara de virtude, um governante que se diz salvador da pátria. E, diante disso, o povo permanece — ora rebelado, ora silenciado, ora descrente.

O cão que fuma observa. Sabe que o homem é capaz de erguer catedrais e, ao mesmo tempo, acender fogueiras para queimar hereges. Sabe que a verdade é volátil, que a justiça oscila como a fumaça, e que a vida, no fim, cabe inteira numa baforada.

Talvez por isso ele fume: para lembrar que cada trago é breve, cada sopro se dissipa, cada século repete sua sina.

Título e Texto: Marcelo Duarte Lins, 21-8-2025

Relacionados:
[Conversamos com] Marcelo Lins: “Lamentavelmente o Governo Federal nunca teve intenção de ajudar a salvar a VARIG e o AERUS.” 
O mundo atravessa um período de guerra e de rearranjo no equilíbrio do poder global 
Síndrome de carência de protagonismo
O vento invisível
[Conversamos com] Marcelo Duarte: “Enquanto pilotávamos os aviões, os que estavam pilotando a empresa estavam quebrando a VARIG e o AERUS” 

Um comentário:

  1. Marcelo,
    Sensibilizado, agradeço deveras a sua bonita homenagem à nossa revista.
    Agradeço em meu nome, e também em nome dos tantos "entrevistados", "colunistas", colaboradores e leitores que construiram O cão que fuma nestes últimos 15 anos. 🐕‍🦺🙏

    ResponderExcluir

Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.

Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.

Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-