Aparecido Raimundo de Souza
ENQUANTO ESPERAVA pela minha simpática secretária Carina, no saguão do Aeroporto de
Viracopos, em Campinas, onde voaríamos para Nova York, sentado praticamente na
cara do portão de embarque dos voos internacionais, um sujeito tentou me contar
uma historinha triste. Percebi que ele trazia no rosto corado (não de vergonha,
mas pela falta de destreza em arranjar uma desculpa que convencesse), uma
cronologia negativa de outras pessoas anteriormente abordadas.
Deve ter imaginado, ao olhar para mim, que eu era um desses idiotas
improvidentes, com o rabo entre as pernas, cheio de medos, fácil de ser levado
no bico, e que se afogava tropeçando os pés em pouca água. Como me considero
macaco velho, e em razão disso não meto a mão em cumbuca, ando longe, portanto,
de cair como um patinho nesses tipos de lorotas baratas expostas às voracidades
construídas em botecos de esquina, diante da aproximação do cabra, fiquei,
pois, em completo estado de alerta.
Em sentido idêntico, estou careca de saber que nos ajuntamentos de
grandes terminais há sempre algum safardana contador de rodelas, procurando
tirar proveito da ingenuidade alheia, notadamente dos sem malícia e dos puros
de espírito, e, principalmente, fazendo valer a degenerescência de caráter,
muito comum em quem não tem respeito pelos seus semelhantes. Assim, quando a
criatura chegou com um sorriso maroto à mostra dos dentes bem tratados, já
estava em guarda e tratei de me livrar rapidinho do estouvado, sem magoar a sua
coragem, usando de toda elegância possível que me ia na alma.
Nos minutos que ficou ali na minha beira, jogando conversa fora tentando
criar cenários ficcionais e se passar pelo bom moço, descobri que o meu
interlocutor havia saído do interior de Belo Horizonte para trabalhar em São
Paulo. O empregador (depois de ele ter laborado por trinta dias ininterruptos),
não pagou ninguém, deu calote e fugiu com o dinheiro deixando todos os
funcionários a verem ossos onde sequer existiam pedaços apodrecidos de
“pecanhas” (carnes de galinhas sem unhas).
Esses operários, como ele, chegavam a mais de duzentos. Corroborando a
sua tese, exibiu um bilhete da Azul (companhia aérea datado de quatro meses
atrás), referente à sua vinda com a respectiva taxa de embarque coletada no
aeródromo da Pampulha.