Aparecido Raimundo de Souza
VOCÊ CHEGOU até aqui, não sei vinda de onde, ou a mando de quem. Sei
apenas que apareceu do nada, a procura de uma vaga de emprego. Deixou um
currículo simples sobre a minha mesa, com foto, telefone de residência,
celular, três pessoas conhecidas para discorrerem sobre o seu caráter. Enfim,
um portfólio simples, resumido, com os acessórios necessários para um contato
posterior, caso eu optasse por eleger o seu nome ao cargo vago na empresa da
qual exatos vinte anos tenho sido o insubstituível diretor de recursos humanos.
Aconteceu que junto com a pequena apresentação por você trazida, veio algo mais
forte embutido no contexto. Na verdade, de roldão, caiu de dentro do envelope
rosa, um elo forte, mais robusto que a sua própria vontade de querer trabalhar.
Diria que junto com aquela folha de papel, um perfume inebriante (cuja
essência entrou pela sala) se fez mais fornido. Grudou nas paredes. Em
contínuo, aderiu aos quadros, se anexou aos móveis e, deles, partiu direto se
“adjuntando” para dentro de mim, indo, por consequência, se alojar sorrateiro
num lugarzinho secreto existente em meu âmago e também no centro nevrálgico do
meu coração. Você deixou, melhor dito, não deixou... ficaram de você,
pedacinhos de sua beleza entrelaçados com estilhaços do seu carisma. Igualmente
fragmentos de sorrisos bonitos e indescritíveis permaneceram gravados na minha
retina. De contrapeso, um mistério bucólico se projetou no ar, e junto, um
segredo perene, um mimo cresceu imensamente a partir do momento em que, dado
por encerrada a entrevista, você se levantou, me desejou um bom dia, sorriu
brejeira e maviosa.
Em seguida, a sua beleza ímpar virou as costas e foi embora. Partiu, e
quando me dei conta, percebi que o calor abrasante da sua presença havia se
incrustrado em minhas entranhas. O seu cheiro de mulher se fez retido no HD da
minha memória. E não foi só. O seu cheiro de fêmea à flor do cio, persistiu
veemente, e, logo em seguida, se propagou ensandecendo o meu franzino de homem
literalmente esfanicado. A sua voz, ainda agora, tanto tempo passado, ouço,
serena e calma, tranquila e deliciosa, “caliente” e fagueira nos meus sonhos,
de onde, aliás, nunca mais consegui apagar. Digo tudo o que me vai na alma,
nesse exato momento e, tal fato, jogado no ar, assim abertamente, tem o condão
de extravasar de dentro da alma o que antes se fez convicção, porque depois
daquela despedida, algo inusitado mudou os destinos e os rumos da minha vidinha
pacata.