Aparecido Raimundo de Souza
ELA TEM APENAS TREZE ANOS. É uma criança. No sentido látego da palavra,
uma garotinha sem eira nem beira. Não passa, juridicamente falando, de um ser
despreparado para a vida adulta, infortúnio penoso que a sua mãe lhe empurrou
goela abaixo sem que lhe consultasse se tinha vontade de ser e de viver como
uma comandada, tal como uma abécula conduzida como marionete entrelaçada por
fios e cordéis invisíveis aos olhos da sociedade. De concepção ainda em
formação, a angelical se distancia da circularidade do seu agora e se flagra,
forçada a suportar uma trajetória adulta, infecunda, tipo uma estéril repetição
de um fuzuê infindável, como se tivesse o tino de botar ordem no galinheiro.
Ao descomedimento das rugosidades que enfrenta, mal e porcamente sabe
precisar onde fica a ponta do seu nariz. Na verdade, a cândida sequer alimenta
a ideia de se defender a si mesma, e, tampouco, tem noção do que é possuir um
nariz e qual a função dele além de estar grudado em seu rosto. Semelhada a uma
dócil virginal, desfralda às vicissitudes de não poder ser uma mocinha como
seria do seu agrado. Vive seu rosário
desfraldando a sua puerícia, se passando por adestrada embutida num quadro
esquizofrênico somente para ingleses verem. Em tempo real, se faria urgente
fugir da estéril repetição que lhe corrói. Ter seu tempo livre dentro de um
“espaço-laser” onde pudesse ruminar seus próprios sonhos e viver o seu “hoje”
como melhor lhe desse na telha.
Mesmo norte, onde no sabor da fogosidade que lhe mantém respirando,
gozasse, sem esbodegos, dos prazeres imaculados de evoluir numa ambição
sucessiva de novos horizontes à espera do alcance das suas demasias em excessos
de saciedade, pelo menos a ponto de se ver desarticulada e tivesse o comando de
seus atos, sem claro, se vestir nas preocupações degradantes de uma dona de
casa com todas as obrigações inerentes de uma mulher casada, nelas
compreendidas as arrumações cotidianas
de uma esposa, mãe e babá, algemadas às afazerancias e aos encargos das
lavagens de banheiros, ordenações dos quartos, salas e varadas e ainda, o mais penoso: cuidar, em tempo
desembaraçado, do café, de colocar a mesa do almoço, de preparar as mamadeiras...
Em sequência, trocar as fraldas de um guri sapecamente frenético e
intransigente e ainda, de sobremesa, deixar em plena ordem as louças do almoço
e do jantar. Aos treze anos, a casta não poderia se ver encarcerada nas
correntes de uma roda infame precisando, praticamente à toque de caixa, se
conformar em cuidar de dois irmãos menores, verdadeiros capetinhas endiabrados
que não sabem fazer outra coisa a não ser criarem turbulências em graus
elevadíssimos. Sem mencionar, mas já o fazendo, em desconfortos medonhos que
ultrapassam o bom senso do desassossego, usque as fomentações das
desinquietações e efervescimentos que, sem sombra e dúvidas, nem Lúcifer
levaria à termo tal empreitada, caso essas disparidades lhe fossem destinadas.
”