sexta-feira, 26 de janeiro de 2024

[Aparecido rasga o verbo] Torto final

Aparecido Raimundo de Souza 

AOS SETENTA, a gente dá uma parada básica em nossa vida. É o momento em que olhamos, ressabiados, para todos os lados e descobrimos, tardiamente, que estamos sem eira nem beira no meio do nada. O nada, aqui, se apresenta como um deserto na figura de um animal feroz. Um bicho desconhecido com a fuça carrancuda e sorumbática de tudo aquilo que a gente nem pensava existisse na face da Terra. Sem saída, lembramos que passamos a ser uma coisa esquecida como um cacareco velho e desusado. Me sinto assim. Uma tranqueira imunda à espera do final.

Um brinquedo jogado, uma roupa que não se usa mais. Para piorar a situação, me flagro preso ao acorrentamento de num desvio que não me permite retornar ao caminho principal. Ao trilho pelo qual seguia alegre e saltitante. De repente, me enxergo sozinho, atordoado, amordaçado e, de certa forma, amedrontado por não saber como fazer contato com a civilização. Tardiamente tomo consciência que me assemelho a um estrangeiro alheado em uma viagem sem destino de qualquer chão conhecido da rota previamente traçada. 

Diante desse quadro borrasquento e “infortunante” só me resta espiar. Espiar para onde? Para os esbugalhos que me atormentam de um lado e de outro. É certo que nada verei com a precisão da mocidade. A idade e o peso de sete décadas, não permitem que veja certas coisas, por mais grandiosas que sejam. Apenas o básico. Distingo mal e porcamente me contemplando campos e montanhas verdejantes a se perderem na distância. Enxergo ao divorciado, um céu azul, onde um sol mavioso de nuvens claras, desenha uma tênue esperança. Contudo, ela, a esperança, se nega a indicar a posição certeira para empreender os primeiros passos e regressar ao mundo maravilhoso que fazia parte da minha vida cotidiana. 

Para onde quer que direcione a visão, nada capturo que me alente uma pontinha de alegria. Não encontro atalhos ou veredas. Nada próximo, nenhuma casinha perdida aqui ou acolá.  Sequer uma alma de coração aberto para trocar meia dúzia de palavras. A mim parece que o tempo se perdeu numa espécie de estágio estranho, sem rumo definido, ou se embrenhou por uma intermitência sem espaço para abrigar o agora. Não sei como, ou de que forma, tudo que estava ao meu alcance se degringolou para um recinto apertado e sem tempo, ao menos para me dar tempo para que se pudesse capturar no vazio de um espelho o reflexo de minha própria imagem e pensar em algo que me devolvesse o sorriso de outrora. 

Em algo aprazível que me fizesse voltar a raciocinar com a precisão dos anos vigorosos. Apesar de me ver no mato sem cachorro, lembro que mamãe, quando respirava vida em abundância vivia apregoando que “pau que nasce com a fisionomia esquisita, até as cinzas jogadas ao vento se fazem incompatíveis.” E completava, dona de si: “mesmo se lançadas à terra, se espalhariam disformes.”  Suas palavras me trazem à lembrança, a convicção de que embora tenha nascido em berço pacato, sem as benesses das riquezas, algo fósmeo se moldou aos esborratados da sociedade de forma séria e intransponível. 

Apesar de ter vindo de boa estirpe, não fui um bom filho. Sempre dei trabalho à autora dos meus dias. Tive uma porrada de mulheres, arranjei uma renca de filhos e não me lembro de ter criado lastro ou vínculo nenhum ao correr do cotidiano de cada uma dessas criaturas que Deus colocou em meu caminho. Tudo começou com a Regina Célia, que me deu a Érica. Depois a Dalva me presenteou com o Eduardo. Na sequência, a Carla trouxe ao mundo a Narjara. Aumentando o rol, conheci a Marlucia, que me enfeitou os dias tristes com as princesas Amanda e Luana. 

Finalmente, não satisfeito, em uma de minhas muitas e tresloucadas viagens, Brasil e mundo afora, arranjei uma barriga inesperada com uma cantora e apresentadora que tinha um programa semanal num canal de televisão em São Paulo. Ela engravidou depois de me “pegar para trouxa” e dessa imbecilidade galopante, me tornei pai da Antonella. Em rápidas pinceladas, traçarei comentários em torno de cada uma, procurando ser sucinto para não tornar cansativa e ao mesmo tempo enfadonha a leitura. 

Érica foi minha primeira filha. Nasceu de Regina Célia, com quem somente tive um caso. Não chegamos a casar. Moramos juntos. Com o nascimento de uma bebê linda, a mãe veio à óbito em face de uma eclampsia. Novo demais e sem juízo, criei a menina à trancos e barrancos em companhia da mãe dela e do pai (meus sogros), com quem aliás, passei a morar de favores na mesma casa, num bairro chamado Croácia, em Santa Cruz, Zona Oeste do Rio de Janeiro. Anos depois, Érica me agraciou com a Ellen, hoje minha neta com treze anos de idade. 

Em seguida, veio o Eduardo, meu filho com a Dalva. Com essa, casei. O matrimônio, apesar de todo o amor que ambos fingíamos sentir, não prosperou. Num declive brusco cada um seguiu por abruptos diferentes. Eduardo teve dois casamentos e três filhos. Eu aumentei a conta de um trio de netos que nunca consegui colocar os olhos em cima. Eduardo mora em Boca Raton, na Flórida. O varão se tornou um filho tipo “ovelha desgarrada.” Nunca deu sinais de vida. Por conta, ele, minha nora e netos estão nas redes sociais. Faz um par de anos que tento aproximação, sem, contudo, obter sucesso. Na sequência, veio a Narjara, minha filha com a Carla. Esposamos, separamos... tempos depois, cada um tomou rumo desconhecido. 

Carla fez o que a justiça rotulou de “alienação parental.” Tenho um neto, o Miguel. Não sei onde mora, tampouco possuo o endereço. Nunca me chamaram para um almoço ou um lanche. O mais hilário. Moramos na mesma cidade e nas poucas vezes que consigo ver o pequeno, os “encontros” acontecem numa padaria. Grosso modo, a tal “alienação parental” só mudou da mãe para a filha. Depois da Carla, veio a Marlucia. Essa jovem me deu de presente duas mocinhas lindas. Amanda e Luana. Apesar de eu ter abandonado as três, com poucos meses de vida e ganhado as estradas das incertezas, Marlucia nunca me negou ver as crianças. Temos um relacionamento normal. Ela me trata sem trazer à tona o passado que a magoou, e nunca (o mais importante), jamais me proibiu de ver as meninas. 

Amanda e Luana me deram dois netos. João Eduardo e Heitor. Com eles, meu relacionamento poderia ser classificado como nota mil. Finalmente, tive o desprazer, a falta de sorte, ou pior, o azar, a urucubaca de me envolver com uma cantora e apresentadora em São Paulo. Declinarei apenas o primeiro nome da criatura. Patrícia. A infeliz poderá até me processar se esse texto chegar ao seu conhecimento. Estive participando de seu programa na televisão. Aliás, fui apresentar meu primeiro livro de crônicas “Quem se abilita” (sem o agá mesmo), publicado por uma editora com sede no Rio de Janeiro. 

A tal figura possui vários discos (CDs) gravados, muitas canções rodando nas redes sociais. Inclusive a música que abre o programa é de minha autoria gravado por ela. Pois bem! Dessa euforia estabanada do “pega aqui, me larga ali, me solta e me deixa acolá,” nasceu Antonella. Uma filha que só lembra que eu existo todo dia dez de cada mês cobrando a pensão alimentícia. A mãe abriu um processo no qual me vi condenado a pagar uma quantia vultuosa todos os meses. Por assim, se procrastino um dia, logo vem a dondoca cobrando ou, na falta dela, a jararaca da mãe (aliás, uma desgraça em figura de gente) ameaçando reabrir o processo e executar a sentença objetivando me botar na cadeia. 

Interessante ressaltar que antes do ingresso na justiça, eu gastava mais com a menina, quando ia visitá-la em sua cidade no interior de São Paulo. Ou quando a pequena vinha até o Espírito Santo. Me dispunha a contribuir com as passagens de avião da donzela e da velha rabugenta (a avó), sem falar em compras, roupas, e etc. Depois de aberto o processo, me limitei a enviar, via conta bancária, apenas o estipulado pela justiça, ou seja, os 43% por cento do que não ganho. Explico: minhas carteiras de trabalho estão em branco. Patrícia foi a única das minhas ex-mulheres (nem chegou a ser, pois nunca moramos juntos) que resolveu bater às portas da justiça. 

Se eu parar de pagar o “quantum” devido... seja por falta de dinheiro, ou pela idade, ninguém, literalmente falando, teria como provar documentalmente o quanto ganho, mês a mês, até pelo motivo de que, de fato, nada ganho. Depois de desfiado e trazido à público esse rosário de mazelas, devo deixar um conselho aos garanhões de plantão. Cuidado para não caírem na esparrela e irem se deitando com qualquer uma. Com exceção da Patrícia, devo dizer, de peito aberto e coração em festa, que as mulheres que fizeram parte da minha vida, relembrando, Regina Célia, Dalva, Carla e Marlucia, se preciso for, eu daria a minha vida para socorrê-las numa eventualidade. 

Patrícia, ao inverso, estaria descartada como uma espécie infame de coisa ruim e nojenta, pegajosa e extremamente má e cruel. Deixando explicitado, que a minha filha Antonella estaria fora dessa confusão, ainda levando em conta um fato acontecido recentemente. Da última vez em que nos falamos, via WhatsApp, Antonella simplesmente me bloqueou. Voltando às palavras sábias de minha mãe (que Deus a tenha em sua Santa Misericórdia), “pau que nasce com a fisionomia esquisita, até as cinzas jogadas ao vento são incompatíveis, e mesmo se lançadas à Terra, se espalharão disformes.” Em face disso, cuidado meus caros leitores e amigos. Parem, pensem, reflitam, analisem. Contem até mil, antes de se deitarem com uma desconhecida do tipo “Patrícia boca larga.” Entenda “boca larga” como aquela protagonista que só visa o dinheiro.” Pode acontecer de vocês terem uma dessas “peruas” ao lado e, por azar, o ato impensado de uma “noitada mal dada,” fazer de suas vidas “melifluosas,” a pior jornada tipo aquela de Jesus Cristo em direção ao Calvário. 

Título e Texto: Aparecido Raimundo de Souza, do aeroporto Internacional de Viracopos, em Campinas, São Paulo, 26-1-2024

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