sexta-feira, 12 de janeiro de 2024

[Aparecido rasga o verbo] Certas coisinhas atrapalham

Aparecido Raimundo de Souza 

SEMPRE ACHEI
que o sujeito que usa óculos escuta menos que as pessoas que não precisam desse artifício para viver, ou ver, de certa forma melhor e mais detalhada, as coisas ao redor. A prova do que aqui falo, meu amigo de muitos carnavais, o Oziel Faca de Brechó. Atropelado em pleno meio dia, sol à pino, quando atravessava a Paulista, em frente ao número 900, no sentido de quem olha para o prédio da Fundação Cásper Líbero, encimada com a torre de televisão lhe dando adeus lá do topo.

Foi mais ou menos assim: Estava o coitado na famosa via, armação escura na fuça comprida (um desses Ray-Ban falsificados vendidos às dúzias nos camelôs da Vinte e Cinco de Março) cobrindo os olhos esverdeados, a pele suada, os cabelos lisos e esbranquiçados como a cauda de um rinoceronte fujão. Se distraiu um milésimo de segundo (não olhando para a torre), babando escancaradamente para uma jovem de caricatura espetaculosa e dona de um rabo de fechar o comércio. Nesse exato momento o inesperado atonou.

Se viu o azarado colhido frontalmente por um motoqueiro vesgo, mal-ajambrado, magro e fino como uma folha de papel sem nada escrito, tanto de um lado, como de outro, a calça jeans com dois rombos à altura dos joelhos, a camiseta suja e, por cima da molambenta, uma jaqueta com uma dezena de buracos, lembrança dos ataques de oito de janeiro. O sujeito era entregador de comida chinesa na modalidade Delivery. Após o acidente, o espertalhão (naturalmente todo irregular), se evadiu do local e a moto idem, ambos, correndo cada um para um lado, sem prestar socorro.

Todo esfolado e com o corpo cheio de contusões, Oziel Faca de Brechó parou no pronto atendimento do hospital Santa Catarina, na Bela Vista (perto de onde fora acidentado), assim mesmo porque uma alma de coração fraterno o colocou em seu carro particular e resolveu ampara-lo por conta própria, sem esperar pela chegada da polícia e de uma unidade básica de suporte do SAMU. Foi a sorte de Oziel. Andar de ambulância, em São Paulo, ainda que de uma esquina à outra, para o tamanho do seu medo, seria como um “suicídio-único-surreal” diante do STF, que ele nem sabe onde fica tal pardieiro.

Perdeu, por conta disso, a polpuda comissão de quase cinco mil reais, dinheiro que iria ajudar – e muito, na construção de dois cômodos em Francisco Morato, num terreno que comprara numa imobiliária e vinha pagando mensalmente as prestações. Devido a cábula opressiva, deixou de fechar a venda de quatro máquinas depiladoras de suínos com cara de Lula e igual número de boxes para atordoamento ou insensibilização desses animais à um empresário dono de um matadouro e vários açougues na região de Campinas e cidades adjacentes.

Diante desse infortúnio inesperado, liberado do pronto socorro duas horas e meia depois, resolveu ir direto para casa. Havia perdido o dia mesmo..., não adiantava chorar sobre o leite derramado. Ainda capengando e mal se segurando desceu à estação Vergueiro do Metrô, embarcou num trem abarrotado e varou no terminal Barra Funda. Da Barra Funda, baldeou para outro trecho e encarou um segundo “enforcador de pobres,” mais humilhante que a Papuda, em direção à Carapicuíba. Queria sair de Carapicuíba e mudar, de vez, com a família para Francisco Morato.

Pelo jeito, o sonho de deixar definitivamente de pagar aluguel ficaria para depois. Desse terminal, ainda teria que caminhar uns quilômetros até a COHAB, onde morava com a mãe e duas irmãs adolescentes num apartamentozinho contendo apenas três dependências. Uma cozinha, um quarto e um banheiro. Para entrar, se fazia necessário deixar do lado de fora, os problemas, a sombra e os pecados. O dinheiro para ingressar num “quarenta janelinhas” e apear na porta de seu domicílio estava completamente fora de cogitação. Havia gasto mais que o necessário para um só dia. Não fosse o bendito óculos escuro, certamente não teria colocado os pés no caminho daquela Titan 150.

A filha de uma égua vinha chutada, com um motoqueiro apavorado carregando uma mochila bag baú nas costas para ser entregue em tempo recorde na recepção de um dos muitos escritórios existentes ao longo da movimentada avenida. Assim como os óculos atrapalham a audição, é bom que todos saibam de algumas particularidades importantes que podem trazer inconvenientes no dia a dia se não forem observadas com o devido rigor. Quem usa brinquinhos nos lóbulos da orelha, por exemplo, enxerga menos.

Dependendo do lugar onde estão colocadas essas bobices (invenções do consumismo barato), podem arranjar, sem querer, uma boa dor de barriga com caganeira irremediável. É o caso de Piercings nos dentes do umbigo. Provoca uma cólica dos diabos. O uso do capacete faz o cidadão perder pelo menos 40% (quarenta por cento) do desejo carnal na hora extrema do ato em si. É por isso que as pessoas tiram o capacete quando vão fazer sexo, principalmente se a coisa for por via oral ou nasal. Tagarelar ao telefone quando se está em duas rodas, é outro problema de proporções às vezes irremediáveis. Pior que atacar a democracia.

Provoca, em paralelo, segundo o doutor Drauzio Varella, cócegas no traseiro. Geralmente, a maioria dos acidentes no trânsito (com criaturas jogando conversa fiada num celular), nasceu ocasionadas em face de não haver quem, em sã consciência, resista ao maldito comichão na bunda, o que resulta, evidentemente, no esquecimento total dos controles da motocicleta, provocando, dessa forma, ocorrências sérias, às vezes até com vítimas fatais ou óbitos irreversíveis.

O mais sensato, portanto, é não falar em hipóteses nenhuma, ao telefone, quando estiver envolvido num trânsito ou engarrafamento. Fora a multa, se numa blitz policial, as autoridades fardadas derem um flagra inesperado, o condutor estará “FU.” Geralmente atrelado ao prurido intenso naquele lugar, o irresponsável também terá que fustigar inquestionavelmente os bolsos e arrancar uma “graninha” para aliviar as ocorrências da ilegalidade cometida. Se nada do que aqui explanei serviu para ajudar na sua meditação quanto aos fatos trazidos acima, ao menos pense no meu amigo Oziel. Você bem poderá, se for descuidado, ou pior, imbecil, estar no lugar dele, num mero e corriqueiro peido maroto, na hora exata de abrir ou fechar um simples guarda-chuva.

Título e Texto: Aparecido Raimundo de Souza, de Vila Velha, no Espírito Santo, 12-1-2024

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4 comentários:

  1. Apesar do seu comentário draconiano, existe um conceito para nós, que vem da aviação:
    -ESCUTE O "ENVIROMENT" ou ambiente, porisso temos 2 ouvidos.
    TEMOS DOIS OLHOS para eviat os erros de paralaxe.
    COM O ADVENTO DOS CELULARES, as pessoas tendem a ficar deficiências de tato nos dedos e dores nos ombros.

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  2. Estava sentindo falta de suas observações em meus textos. Disse de mim para comigo mesmo. Vanderlei Rocha me abandonou. Não deu mais o ar da graça. Fico feliz em saber que voltou. Seja bem vindo de volta. Com relação ao texto, acrescentaria às suas observações, o seguinte: não só a "deficiência de tato nos dedos e dores nos ombros," igualmente teremos um bando de parasitas esquisitos e trocentos mongoloides, os olhos esbugalhados e os pescoços desformados pelas posições errôneas como grudam nos celulares, além da cegueira nas vistas e logicamente, na alma. Estamos pagando o preço da MODERNIDADE.
    Abraços
    Aparecido Raimundo de Souza
    de Vila Velha, no Espírito Santo.

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  3. Não há falta, eu considero que textos que abrangem conteúdos sexuais inócuos;
    Temos 5 sentidos e 3 deles não atingem o sexo;
    Sexo são feromônios sentidos pelo olfato e o orgasmo pelo tato, ou seja, os ouvidos e os olhos são dispensáveis.

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  4. Saiba amado mestre, que eu não tenho celular, não preciso, também não tenho instagram e já cancelei o twitter. Eu gostava do orkut, a gente podia chamar de filho da puta e mandar tomar nocu.
    Hoje tem muito MIMIMI. Reiterando detesto conteúdo sexuais.
    As mulheres fazem sexo até o último momento de suas vidas e os homens chegam um momento que nem viagra e papaverina adiantam.

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