Aparecido Raimundo de Souza
No pior dos mundos, me contentaria em ser seu lençol, seu travesseiro, seus olhos que a tudo transpassam, bem ainda seu gatinho de pelúcia, ao qual você se abraça, ou o tapete... ou no esquisito de um estado infrene: as suas pantufas. Ainda que assim me sentisse, às rés do chão, subiria ao céu montado num cavalo veloz se me fosse dada a oportunidade de afastar definitivamente a solidão incomodante que ronda o seu mundinho atarantado de visões imaginárias que não se concretizam. Eu seria, acredite, o homem mais feliz do planeta.
Me pegaria realizado e dono do seu corpo inteiro. O seu “eu” é um
relicário sutil de poemas e eu os leria inebriado de uma felicidade
“dementadamente” rara. Meus dias seriam alegres e saltitantes. Quiçá minhas
horas, do amanhecer ao acordar, até o instante de voltar aos macios da alcova.
Certamente meu conjunto de expectativas futuras fluiriam com mais intensidade e
esperança. Eu não me incomodaria em velar seu sono, acariciar seu rosto de
menina-flor, bulinar no íntimo do seu regaço e descobrir, inebriado, os
segredos que nele se escondem além do portal “sentinelado” por uma infinidade
de calcinhas minúsculas que você gosta de usar depois que sai do banho.
Como um menino bobo, libertado de um curto circuito inexplicável, enfeitaria as suas noites de vigília, e a partir daí você não careceria de vigiar os prédios vizinhos, deitada na rede estendida em sua varanda, ou se importaria com o barulho da avenida movimentada em posição da calçada que atravessa o nível da portaria. De igual modo, abraçaria seus medos, agarraria pelos fundilhos as suas quimeras mais prementes. Seria o anjo trinado e fiel aos seus caprichos. E, como tal, beijaria seus pés.
Subiria, sem pressa, para o meio de suas pernas e me deteria, saliente, na entrada da grutinha, onde um outro mundo paralelo explodiria ao meu contato e todas as delícias adormecidas surdiriam. Em contínuo, mordiscaria as suas orelhinhas, falaria palavras melosas em seus ouvidos e presentearia você com a paz das noites tranquilas. As primeiras horas de um novo raiar, acordaria seu espanto com um delicioso café completo, do jeito que você gosta. E quando você estivesse pronta para sair pela porta da sala, eu iria dentro do seu núcleo.
Seguiria grudado em seu peito, me faria atarracado em suas vísceras, não permitindo que ninguém mais ousasse perturbar o seu cotidiano. Eu sonho, desde sempre e incansavelmente em ter o seu coração e acredite, minha princesa: só esse sonhar absurdo, esse gostar sem limites, esse desejo de devorar as suas loucuras obscenas... tudo isso em volúpia girando como um carrossel, é o que me mantem vivo, desperto, vigilante, e fora de mim. Tudo que lhe disse nessa confissão de uma criatura por demais apaixonada, deverá seguir assim: em cautela total, para que ninguém saiba ou desconfie.
Minhas ânsias, apetites, suspiros, fantasias, ganas e distúrbios (tudo, tudo e mais um bocado), se entrelaçam e agem em mim. Me devoram pôr dentro, me bebem como um antídoto de natureza benéfica. Você literalmente, se fez no remédio derradeiro contra as dores da paixão abafada, porém, está dentro de mim retida e represada. Em verdade, carrego um conjunto de subversões que, em epítome, se eu descuidar, emergiria transubstanciando a cerne que me mantém respirando.
Título e Texto: Aparecido Raimundo de Souza, de Vila Velha, no Espírito
Santo, 29-12-2023
Decisão de abordagem
“Corriquências” do dia a dia
A fossa do acetábulo
Um pouquinho de muitas coisas
Como se caminhasse num labirinto de espelhos estilhaçados
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