Rogério Amorim
O prefeito Eduardo Paes promoveu seu segundo megashow em dois anos do atual mandato. Até o fim do governo atual, certamente o morador de Copacabana já terá abandonado ou bairro ou entrado com merecido processo judicial pedindo a redução de seu IPTU – pois o prefeito se compraz em ocupar o bairro com suas idiossincrasias. A notícia ruim que eu tenho para esses moradores é: o prefeito governa por imagens, e para o restante do Estado e do País (quiçá do Mundo) a imagem de Copacabana é sempre persuasiva.
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Foto: Marcelo Piu |
Para o prefeito, ter 500 mil
pessoas aos gritos em Copacabana rende mais votos do que um mediador em sala de
aula para crianças com deficiência. Ter uma cantora lacrando (Madonna) com
bailarinos gays vale muito mais do que médicos especialistas atendendo nas UPAs
em vez de médicos generalistas. Ter os holofotes das áreas VIPs mostrando a
comida dos chefs de cozinha vale mais do que incentivar os projetos para
pacientes de fibromialgia – doença que, curiosamente, traz sofrimento à cantora
Lady Gaga.
Mas o pior do governo por
imagens é saber que a maior parte das imagens é mentirosa. Não falo aqui do
absurdo que é colocar 200 metros de área VIP separando do palco os fãs que
chegam de manhã à praia para o show. Me refiro ao inacreditável anúncio de que
o evento reuniu 2,1 milhões de pessoas, uma contagem que só existe na cabeça do
prefeito e que foi devidamente desconstruída nas redes sociais pelo engenheiro
têxtil Franklin Weise. Vou reproduzir abaixo o que ele ponderou, com muita propriedade.
O primeiro questionamento é: qual a área necessária para acomodar 2,1 milhões de pessoas? Com efeito, depende da densidade. Nas partes mais próximas do palco – perdão, da área VIP, dá para estimar algo como 5 pessoas por metro quadrado, um cenário no qual é impossível um ser humano. Podemos até tentar três pessoas por metro quadrado – com mobilidade bem reduzida.
Weiser então resolve ser
generoso com o prefeito Eduardo Paes: “vamos supor que metade do espaço ocupado
tenha cinco pessoas por metro quadrado e, outra metade, três pessoas. Sendo
assim, os 2,1 milhões de pessoas precisariam de uma área de 525 mil metros
quadrados.
O checador de dados vai mais
longe na generosidade: considera então a largura média de 150 metros entre os
prédios e o ponto médio do fim da faixa de areia (na água). E multiplica pela
extensão toda da praia, do Leme ao Forte de Copacabana. E sabemos que o show
não ocupou tudo isso. Ele então calcula 600 mil metros quadrados e desconta 10
por cento de espaço para mobiliário urbano e equipamentos do show. Ainda assim,
chega-se ao número de 540 mil metros quadrados, 15 mil metros quadrados a mais
do que o necessário.
Mas este cálculo está
considerando toda a área útil entre Leme e o Posto Seis, mais de quatro
quilômetros. E o que vemos nas imagens com as quais o prefeito pretende
governar? Público concentrado entre o Copacabana Palace e a pequena Rua Antonio
Vieira, já no Leme. Uma grande faixa de público, sem dúvida. Mas a conta não
fecha: uns 700 metros multiplicados por uma largura média de 180 metros, ou
seja, cerca de 126 mil metros quadrados no total, descontando o mobiliário
urbano e os equipamentos chegaríamos a 113 mil metros quadrados.
Para caber 2,1 milhões de
pessoas neste espaço, a densidade seria de 19 pessoas por metro quadrado. Algo
que é humanamente impossível.
Claro que o prefeito, ao
abordar a Folha de S.Paulo nas redes sociais (sem nenhuma réplica do jornal,
algo incrível), usa o argumento do “público em movimento”. Para aceitarmos isso
e concordar com 2,1 milhões, seria necessário que todo o público no local fosse
substituído quatro vezes ao longo do show. “Uma vez a cada 30 minutos”, diz
Weiser, que calculou 453 mil presentes, um público grande, realmente. É quase o
público que em 1981 lotou o concerto no Central Park da dupla americana Simon
& Garfunkel.
O que é verdadeiramente
incrível é a cumplicidade de toda a mídia – com exceção deste DIÁRIO DO
RIO – que em vez de buscar os números reais aceita de forma passiva o
que o prefeito diz. Ele governa por imagens, mas não exibe as pessoas com
dificuldades de assistir ao show, obstruídas pelo muro de sua área VIP (mais de
10 milhões em dinheiro público).
Governa por imagens, mas não
exibe em suas redes os seguranças truculentos impedindo os fãs de alcançarem as
proximidades das muretas. Por conta disto, protocolei PL proibindo que sejam
instaladas áreas VIPs em espaços de uso do povo, públicos, como praias e praças
– projeto também protocolado na Alerj pelo meu irmão deputado estadual Rodrigo
Amorim (União)
É muito fácil governar quando
o compromisso é só com a lacração e o ufanismo cego. Difícil é ser desgovernado
por eles. Difícil é morar em Copacabana sabendo que o único interesse do
prefeito é transformar o bairro em playground de subserviência a cultura
estrangeira e de lascívia. Tenho feito esforços para melhorar a situação, como
o PL recente em que proponho a transferência da passeata gay para o Sambódromo.
Mas seria apenas mais um evento – e convenhamos, com as artistas convidadas
pelo prefeito até agora, não é nem necessário que haja passeata gay.
No governo das imagens, a
mentira é a campeã de audiência.
Título e Texto: Rogério
Amorim, Diário do Rio, 7-5-2025
Dois milhões de pessoas na Lady Gaga?
O Show da Gaga e o Circo Fiscal do Rio: A Mentira Brilhante com Maquiagem de Pop Star
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