Humberto Pinho da Silva
Estando na companhia amiga
de meu cunhado, a almoçar suculenta feijoada brasileira, onde não faltava boa
farofa, couve guisada e abundante carne, tudo bem regado com fresco e encorpado
vinho gaúcho, este, volvendo-se afetuosamente para mim, disparou:
"Por que não obtêm bilhete
de identidade brasileiro, como o avô de minha mulher que era português?”
Fiquei mudo de espanto. Ele,
risonho, prosseguiu:
"Eu ajudo... Casou com comunhão de bens,
com paulistana, em Perdizes, perante Juiz de Paz. Foi abençoado na Bexiga. Tem
muita família e amigos no Brasil, e casa em Santa Catarina. Fala português. Tem
documentos brasileiros. Não é jovem, em breve estará aposentado. Não vai tirar
emprego a ninguém..."
Enquanto assim falava,
pensava na alegria que daria à minha mulher de poder passar, em minha
companhia, a velhice, no torrão natal.
Fomos à Polícia.
Atendeu-nos jovem funcionário. Historiei a situação, apresentei certidão de
casamento...
Alegrei-me, quando me
disse: "Basta ser português, com casa no Brasil, não deve haver
obstáculo”.
Gentilmente indicou o fotógrafo, que tirava retratos, com os requisitos necessários.
De fotografias na mão,
dirigi-me de novo à Polícia. Mandaram-me preencher papelada...
Depressa se esvaneceram as
minhas esperanças. O malfadado computador teimava em não aceitar os documentos,
perante a estupefação do amável empregado.
Então surgiu homem grandalhão, de voz meiga, lamentando o sucedido. "Que fosse à Polícia Federal... Que fosse à Federal..."
Receoso, penetrei no
edifício da Federal. Expus o pretendido. Encaminharam-me para gabinete
sobriamente decorado, onde fui recebido por carrancudo guarda. Ao tomar
conhecimento do pretendido, a fisionomia desnudou-se, abrindo-se em festivos
sorrisos:
"Para nós, os
portugueses são nossos irmãos. Infelizmente não o posso satisfazer. Mas
consegue, direito de residência; mas, cuidado! Se se ausentar mais de seis
meses, caduca! Naturalmente, se pedir será de novo concedido”.
Respondi-lhe: o
brasileiro, para obter a nacionalidade portuguesa, basta-lhe ter ascendência
portuguesa, ou residir meia dúzia de anos em Portugal...
Com disfarçado risinho,
bailando nos grossos lábios, afirmou:
"Isso é em Portugal!
e na Europa!...”
Título e Texto: Humberto Pinho da Silva, agosto de 2025
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