As pessoas, assim como os meus
filhos se fartaram da Play Station, também se fartaram dos políticos
Os meus filhos perguntam-me o
que é ser de direita ou de esquerda. Normalmente respondo que a esquerda é
assim como eles, gasta dinheiro e acredita no Pai Natal, e que a direita é
assim como eu, ganha o dinheiro para eles gastarem e não acredita no Pai Natal.
Uma explicação simples que mantém a ordem doméstica. Eles, compreensivelmente,
não querem ser de direita – adoram gastar. Sabem que um dia, quando tiverem de
pagar contas e de comprar presentes de Natal para os filhos em vez de ficarem
especados a olhar para chaminé à espera que o pai Natal desça de lá, serão de
direita. Mas até lá são confortavelmente de esquerda.
Em vésperas de eleições estas
questões agudizam-se. E todos os dias vejo os meus filhos aparecerem na
televisão: quando abro a televisão ou ouço rádio, são os meus filhos que ali
estão. A gritar, a argumentar, a refilar e a exigir. O debate político não é
político é infantil. De um lado estão eles, a queixarem-se dos cortes, da vida,
dos cortes, do futuro e dos cortes; e do outro lado estou eu, a explicar que
tem de se poupar porque o dinheiro não cresce das árvores, que tem de se pagar
as dívidas antes de comprar brinquedos novos, que é preciso estudar para sermos
donos e senhores do nosso futuro e que se são tivermos as continhas bem feitas
ninguém nos abre uma rampa no super-mercado.
Pois é por isto, por esta
experiência doméstica, que posso dizer com propriedade que as ideologias estão
crise. Não há ideologias, há contas para pagar. Ou seja, foram séculos a
escrever livros e teorias sobre modelos sociais, direitos fundamentais,
organização política, ideologias, vá, para se chegar ao século XXI e aquilo que
domina o debate político são cortes. Cortes. Não há palavras. E Montesquieu, e
Marx, os gregos e a democracia, onde estão? Não estão. O que interessa aqui é
quem corta onde e quem diz que não corta. O que se fala é de dinheiro, ponto.
Como é que ele aparece, não interessa, quais os mecanismos para melhor o
distribuir, ninguém quer saber, como fazer com que tenhamos mais, também é uma
questão menor. O que interessa são os cortes. A questão é por isso pragmática:
que governo nos vai dar mais dinheiro? É assim como uma questão que agita de
tempos em tempos os meus filhos: qual é o tio que me vai dar o melhor presente
de anos? O tio que é brincalhão, que tem um carro muita giro, namoradas muita
giras, mas não trabalha e deve milhares aos pais? Ou o tio chato que anda num
modesto Opel Corsa, trabalha que se farta e só fala de coisas sérias? Não há
nada de ideológico nisto.
As únicas excepções a esta
dualidade são os “outros”, ou seja, as “coisas novas”. Toda a gente acha que
devia aparecer “uma coisa nova” porque “são sempre os mesmos”. Ou seja, é
preciso um “abanão”. Qual? Não se sabe. Um governo de girafas? Não se sabe. Uma
coisa assim exótica? Talvez. O que interessa é que seja novo. As pessoas, assim
como os meus filhos se fartaram da Play Station, também se fartaram dos políticos.
Dos que cortam e dos que endividaram o país como se não houvesse amanhã. Por
isso, a dita coisa nova, talvez seja uma solução. Ora, se percebo esta crise de
ideologias porque, como reza o povo, as ideologias não pagam contas, já não
percebo a teoria das coisas novas. O que são coisas novas? Pois, fui falar com
os meus filhos para esclarecer a questão: “Filhos, acham que deviam aparecer
outros políticos ou acabar com os políticos e substitui-los, por exemplo, por
futebolistas ou engenheiros químicos?”. A resposta foi obviamente política:
“Era giro, pelo menos era uma coisa nova”. Está tudo em aberto para dia 4.
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