Decisão servirá de parâmetro para casos
idênticos em andamento no pais
Livia Scocuglia
A responsabilidade da TAP
Manutenção e Engenharia sobre dívidas trabalhistas de uma filial da Varig será
definida, de uma vez, pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST). A responsabilização
ou não da companhia poderá ser um indicativo para o mercado de investimentos,
uma vez que definirá se quem adquire ativos de empresa em recuperação ou falida
deve também arcar com o seu passivo. Do outro lado, também terá impacto para os
funcionários que deixaram de receber da empresa que não conseguiu continuar no
mercado.
Até agora, três correntes
diferentes norteiam o caso na Corte trabalhista. Há ministros que reconhecem a
responsabilidade solidária da TAP como integrante do mesmo grupo econômico.
Outros julgadores isentam a empresa e, por uma terceira via de interpretação, o
tribunal define que a companhia deveria arcar com o pagamento dos débitos
trabalhistas até novembro de 2005, quando deixou de fazer parte do grupo.
Os ministros do TST vão
decidir se sobre o caso incide a isenção determinada pelo artigo 60, caput e
parágrafo único, da Lei de Recuperação e Falências (Lei 11.101/2005), que
isenta de responsabilidade trabalhista o comprador de filiais de empresas
falidas ou em recuperação judicial, ou se seria o caso de responsabilidade
solidária prevista na Orientação Jurisprudencial 411 da Subseção 1
Especializada em Dissídios Individuais do TST, que abre exceção em casos de
má-fé ou fraude na sucessão.
No TST, o processo será
primeiro analisado pelo Pleno que irá decidir a questão jurídica do caso.
Depois, o caso será encaminhado para a Subseção I Especializada em Dissídios
Individuais (SDI-1) do tribunal, que vai consolidar a jurisprudência. O
processo será analisado sob o rito dos recursos repetitivos que, portanto,
servirá como parâmetro para outros casos idênticos em andamento no país.
Segundo o advogado trabalhista
Daniel Chiode, se o TST decidir que não há sucessão, estará alinhado com o
contido na Lei de Falências e com o entendimento da Justiça comum sobre o
tema.
“Isto favorece as
recuperações. Ajuda as empresas e os credores a buscarem meios para reerguer a
empresa ou, ao menos, para quitar as dívidas. Neste sentido, haveria
interpretação conforme a lei e a segurança jurídica”, opina.
No entanto, afirma o advogado,
se o tribunal decidir no sentido da sucessão e da responsabilização, isto será
um desestímulo aos que compram ativos ou unidades produtivas em processos de
recuperação.
“Com aumento do risco, haverá
menos interessados e o valor destes ativos ou unidades será menor. Logo, isto
será maléfico para a recuperação e implicará aumento do número de falências.
Haverá, ainda, decisão passível de ser questionada no STF por manifesta invasão
de competência da Justiça comum”, afirma.
O advogado Paulo Calheiros,
sócio da Mandel Advocacia, concorda. Segundo ele, a responsabilização da TAP
poderá dar um recado ruim para os investidores.
“O artigo 60 da Lei de
Falências foi criado para incentivar investimentos em ativos de empresas em
recuperação ou falidas. O pior cenário que pode ter é empresa que possui ativos
que podem ser vendidos para terceiros para quitar algumas dívidas, mas cuja
venda não se realiza por receio dos potenciais investidores de trazer
consigo problemas da sucessão.”
Do outro lado, a Associação de
Pilotos da Varig, o Sindicato dos Aeroviários de Porto Alegre e a Associação
dos Participantes e Beneficiários do AERUS (APRUS) defendem a responsabilidade
solidária da TAP. Alegam que a empresa assumiu direitos trabalhistas ao
absorver diversos empregados da Varig Engenharia e Manutenção (VEM),
independentemente do processo de recuperação e da falência da Varig.
Segundo o advogado Otávio
Bezerra Neves, representante da APRUS, a TAP “levou praticamente de graça a
VEM”, que não foi negociada como unidade produtiva isolada ou filial da Varig.
“Ela comprou a empresa sabendo
que estava em dificuldade, sabendo das dívidas, pagando por ela um preço muito
baixo, usufruiu desse arcabouço e deve ser responsabilizada”, afirma.
O caso
Tudo começou em 2005 quando a
TAP anunciou a compra da VEM (engenharia e manutenção) e da VarigLog
(logística) – do grupo Varig – por R$ 62 milhões.
No entanto, a TAP vendeu os
ativos e deixou de fazer parte deste grupo – isso antes de leilão promovido no
processo de recuperação judicial.
Neste ponto é que se encontra
a controvérsia a respeito da existência de fraude, já que a TAP vendeu os
ativos 40 dias antes de aprovado o plano de recuperação judicial do grupo.
A controvérsia sobre a
sucessão trabalhista estava pautada no Tribunal Pleno para ser julgado no
próximo dia 20 de fevereiro, mas por conta da quantidade de informações novas
que chegou no processo, o relator do caso, ministro Guilherme Augusto Caputo
Bastos, pediu mais tempo para votar. Ainda não há data definida para o
julgamento.
Audiência
pública
A quantidade de novas
informações chegou ao processo após uma audiência pública que ocorreu no
tribunal em fevereiro e reuniu seis expositores selecionados para tratar sobre
o caso.
Na data, os representantes da
TAP Manutenção e Engenharia Brasil e da Confederação Nacional da Indústria
(CNI) defenderam a isenção do passivo trabalhista na compra de ativos de
empresa em processo de recuperação judicial, desde que a aquisição seja aprovada
pela assembleia de credores e autorizada pela Justiça, como ocorreu.
“Apresentamos proposta de US$
62 milhões, no curso do processo de recuperação judicial, e os credores
aprovaram a compra, com autorização do juiz da vara
empresarial”, afirmou o advogado Fernando Souza Pinto,
representante da TAP.
O advogado Sérgio Murilo
Santos, que representou a CNI, defendeu que o dispositivo da Lei de Falências é
norma “excepcionalíssima” à regra geral da sucessão. Isso porque a aquisição se
dá no âmbito de um processo de recuperação judicial no qual o adquirente só
terá recursos para pagar credores se ficar isento desses débitos.
Pela responsabilização
solidária da TAP, a Associação de Pilotos da Varig, o Sindicato dos Aeroviários
de Porto Alegre e a CUT Nacional alegaram que a empresa assumiu direitos
trabalhistas e questionaram o que poderá assegurar que o empregado receba os
seus créditos, se não for o patrimônio da empresa.
“Numa estratégia que separa no
patrimônio o passivo para um lado e no outro o ativo para vender para o
empresário em leilão, quem vai pagar os trabalhadores?”, questionou o
advogado Paulo Roberto Alves da Silva.
Jurisprudência
Na corrente das decisões que
responsabilizam a TAP pelas dívidas da Varig, o argumento principal utilizado
pelos ministros é de que é “incontroverso” que a VEM, atualmente TAP
Manutenção e Engenharia S.A., era mero “departamento” da Varig, tendo sido
desmembrada e repassada ao controle acionário de terceiros, ainda no curso do
contrato de trabalho do reclamante.
Além disso, apontam que a TAP
respondia solidariamente pelos créditos da autora por ter integrado o grupo
Varig antes do pedido de recuperação judicial.
“Diante desse contexto, tem-se
que a responsabilidade solidária da TAP decorre da formação de grupo econômico
com a VARIG, o qual é anterior à deflagração do processo de recuperação
judicial dessa última. Logo, não se trata de caso de incidência do art. 60,
parágrafo único, da Lei 11.101/2005, uma vez que a TAP não adquiriu unidade
produtiva da Varig no leilão em processo de recuperação judicial”, diz trecho
da decisão no ARR 91700-53.2007.5.04.0009.
Ainda, ministros entendem que
a TAP, na qualidade de sucessora da VEM, passou a compor o mesmo grupo
econômico da Varig, assumindo, por sucessão, as obrigações trabalhistas
contraídas pela sucedida.
Uma segunda jurisprudência da
Corte entende que a TAP, na condição de sucessora da VEM, passou a integrar o
mesmo grupo econômico da Varig, assumindo, assim, por sucessão, as obrigações
trabalhistas adquiridas pela sucedida.
Entretanto, a responsabilidade
solidária quanto aos débitos trabalhistas seria limitada até o momento em
que houve a transferência do controle acionário da TAP para a empresa Aero LB
Participações S.A., ocorrida em 09/11/2005. Tal decisão foi proferida no
ARR-121400-58.2008.5.04.0003.
A última corrente isenta a
empresa com base no artigo 60, parágrafo único, da Lei de Falências, que
desincumbe do pagamento dos créditos o adquirente de filiais ou unidades
produtivas de empresas falidas ou em recuperação judicial.
Citando a lei decisão do
Supremo Tribunal Federal na ADI 3934, certos ministros entendem que a alienação
de empresa em processo de recuperação judicial não acarreta a sucessão pelo
arrematante e, por conseguinte, não há que se falar em responsabilidade
solidária da TAP pelos direitos que emergiam da aludida sucessão.
(RR-112800-97.2008.5.04.0019). Na ADI, o Supremo entendeu que aqueles
que adquirem, nos termos da Lei de Falências, ativos de empresa em recuperação
judicial não podem ter esse patrimônio afetado por obrigações trabalhistas
exigidas de quem sucede o empregador.
Título e Texto: Livia Scocuglia – Brasília, JOTA,
24-3-2017
Colaboração: Francisco Barros
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