Cesar Maia
1. Uma certa euforia de quase todos, incluindo a imprensa, com a
passagem de Macron para o segundo turno na eleição presidencial da França,
deixou de lado o fato de que se trata de um candidato sem partido. Macron criou
seu partido – EN MARCHE – em maio de 2006 e utilizou as letras de seu nome.
Terá que governar sem base parlamentar, a qual terá que atrair caso a caso,
supondo que a tradição partidária na França não deverá gerar uma migração
partidária expressiva para sua base parlamentar.
2. O isolamento de Marine Le Pen, de extrema-direita, gerou um
alívio. Os riscos para o Euro se vão. Mas o fato de um país como a França - referência
histórica da política e da sociologia desde a revolução francesa, que batizou
as expressões direita e esquerda conforme seus posicionamentos no plenário da
assembleia nacional - ter levado ao segundo turno e, provavelmente, à
presidência um candidato sem partido, mostra a gravidade da crise política na
Europa.
3. Ex-ministro de economia de François Hollande, dissidente que
adotou um programa híbrido, de corte liberal, social, nacional, etc., talvez
por isso tenha sido caracterizado como candidato de “centro”. Seu programa de
governo não indica isso.
4. Comprometeu-se em seu programa de governo a suprimir 120 mil
vagas de servidores e a reduzir os gastos públicos em relação ao PIB com corte
de 60 bilhões de euros durante seu mandato. Disse que vai aumentar as pensões
mínimas em 100 euros por mês, sinalizando uma postura social-liberal. Fala em
exigir ficha-limpa de candidatos e proibir parlamentares de contratar
familiares, numa alusão ao candidato do PS – Fillon – desgastado com o fato de
sua esposa.
5. Diz que vai restabelecer o serviço militar obrigatório, criar 15
mil vagas de prisão e contratar mais 10 mil policiais civis e militares, num
aceno ao eleitorado impactado com as ações terroristas.
6. Num aceno à modernidade, apresentou um plano de investimentos de
50 bilhões de euros priorizando os incentivos à formação profissional e à
transição energética.
7. Em outro aceno, agora aos nacionalistas que cresceram com a
crise dos refugiados, Macron informa que vai criar mecanismo de controle de
investimentos estrangeiros em setores industriais estratégicos e vai lutar
contra a otimização fiscal de grandes grupos de internet.
8. Os analistas políticos e partidos brasileiros devem ficar
atentos à situação francesa. A provável pulverização do quadro eleitoral na
eleição presidencial de 2018 tende a levar ao segundo turno candidatos que,
como na França, não atingirão 25% dos votos, abrindo espaço à antipolítica ou a
candidatos quase-independentes, e que incluirão em seus programas de governo
uma mescla de propostas que agradem a persas e babilônicos, e um governo
híbrido e de pouca mobilidade política.
9. Se for assim, a crise política brasileira, como provavelmente a
francesa, não terão solução em curto ou médio prazos.
Título e Texto: Cesar Maia, 25-4-2017
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Dois pequeninos reparos:
ResponderExcluirNão, a euforia não ‘incluiu’ a imprensa, ao contrário, a euforia (antes, durante e depois) foi da imprensa. Oxalá essa euforia midiática e ‘clintoniana’ tenha o mesmo desfecho do que aquele que ocorreu lá pertinho do Canadá.
François Fillon não era candidato do Partido Socialista, mas sim do ‘Les Républicains’, que sucedeu ao UMP-Union pour Un Mouvement Populaire; o candidato do PS foi Benoît Hamon.