Alberto Gonçalves
A solidariedade é assim. Na
Alemanha, desde Junho que uma escola da Baviera aconselha as alunas a vestir
"modestamente", leia-se a taparem-se inteirinhas para não ofender as
centenas de refugiados muçulmanos alojados nas imediações. Na Grécia,
refugiados muçulmanos recusaram ajuda da Cruz Vermelha, supõe-se que por causa
da iconografia. Em Portugal, o município de Penela prepara-se para acolher
refugiados muçulmanos e providenciar-lhes aulas de português com separação de
sexos. E parecem-me evidentes os motivos que levam centenas de refugiados
muçulmanos a fugir da ilha de Lesbos. Os refugiados, não sei se o referi, são
na maioria muçulmanos, característica associada a numerosos preceitos
comportamentais que nós, em nome da hospitalidade e boas maneiras, devemos
respeitar.
A existir a séria
possibilidade de uma família alargada de iraquianos acabar cá em casa ou na
vizinhança, estou empenhado em evitar ofensas gratuitas. Ou até pagas. É
verdade que não possuo o espírito magnânimo de Raquel Varela, a
historiadora/comunista/activista que posou para o Facebook com um cartaz a
dizer "Refugees Welcome" e agora tem o conforto do lar incrementado
graças à presença de quatro sírios sortidos, dois casais líbios e um paraguaio
exilado por dormir com uma chinchila. Porém, basta notar a quantidade de
infelizes que fogem do Médio Oriente e dividi-la pela dimensão do território
europeu para concluir que é matematicamente impossível um ou oito refugiados
não me caírem em cima.
À cautela, adoptando o
preceito popular segundo o qual é melhor prevenir do que ter um afegão furioso a
perseguir-nos na cozinha, há regras de hospedagem a cumprir. A minha mulher
começou a andar embrulhada num lençol da cabeça aos pés (enquanto não chega a
remessa de bonitas burkas encomendadas online). O fiambre e os enchidos foram
para o lixo, e só não foram para os cães porque estes, sendo considerados
demoníacos pelos seguidores de Alá, também foram para o lixo. No que toca a
livros, já despachei os que tratavam do Holocausto, os que incluíam referências
simpáticas sobre Israel, os EUA e as democracias em geral, os que padeciam de
licenciosidade em matéria de costumes e três romances de Michel Houellebecq
(neste momento, a minha biblioteca resume-se a dezassete fascículos da
Teleculinária e Doçaria, com as páginas alusivas às costeletas de porco devidamente
excisadas). Os canais televisivos estão bloqueados em peso, com as naturais
excepções da Al Jazeera e da SIC Notícias. Por falta de paciência para catar
blasfémias, doei todos os DVD ao ecocentro local. Por fim, aboli a expressão
"Cruzes, credo" e enterrei uma garrafa de aguardente velha
Ferreirinha.
Em suma, decidi facilitar a
vida aos refugiados, para que estes possam regressar a cada fim de tarde da
limpeza das matas e encontrar um ambiente compatível, não com os decadentes
horrores do Ocidente, mas com a fé e a cultura que tanta alegria lhes têm dado.
Se eles não fariam o mesmo por mim, seria obviamente para o meu bem.
Bem-vindos, pois.
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