Maria Eugénia Mata
Só em 2001 Portugal acabou de pagar uma dívida
contraída em 1902. Em julho de 2001, o Estado pagou a última das 198 prestações
a que se tinha obrigado pelo convénio assinado com os credores externos em
1902.
O convénio fora necessário para regularizar a
situação da dívida pública externa portuguesa, que vira o pagamento dos seus
encargos ser parcialmente suspenso em 1892. Portugal reduzira unilateralmente o
pagamento dos encargos para menos de um terço do contratualmente estabelecido e
foram precisos cerca de dez anos de negociações com os credores para se chegar
a um acordo. Esse acordo fez subir os pagamentos para um pouco mais de metade
do inicialmente contratualizado, a meio caminho entre esse compromisso contratual
e a posição tomada pelo Governo português como ponto de partida para as
negociações.
A dívida em questão fora contraída entre as
décadas de 30 e 80 do século XIX principalmente para financiar as expedições
militares que estabeleceram o regime constitucional em Portugal e apar apoiar a
construção de meios de transporte e comunicação, em particular os primeiros
caminhos-de-ferro (assim como estradas, portos, telégrafo e escolas).
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Foto: Christian Gollnick
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O pagamento dos encargos a que Portugal se comprometeu
em 1902 foi a princípio bastante penoso para o País. Na década de 20 do séc. XX
chegou a ser mesmo necessário limitar os pagamentos aos portadores portugueses
desses títulos de dívida externa, pela fixação de uma taxa de câmbio mais
desfavorável do que a corrente no mercado. Porém, as coisas mudaram com a
Segunda Guerra Mundial. Foi possível converter cerca de metade da dívida do
convénio de 1902 em dívida consolidada interna, cujos encargos eram de
pagamento muito mais confortável para Portugal. Essa dívida continua hoje a
fazer parte da nossa dívida pública interna (trata-se do empréstimo a 4% de
1940).
Que os custos das guerras liberais e da construção
dos primeiros caminhos-de-ferro só tenham acabado de ser pagos em 2001, mais de
um século e mesmo século e meio depois de as despesas terem sido feitas (e, num
certo sentido, ainda estejam a ser pagos, embora em montantes muito reduzidos),
poderia e deveria ser motivo de reflexão quanto à prudência necessária na realização
de despesas públicas. Infelizmente não parece ser o caso.
Texto: Maria Eugénia Mata, "Visão História – As crises
do capitalismo”, página 20.
Digitação: JP
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