sexta-feira, 7 de novembro de 2025

Globalismo vs Nacionalismo


Francisco Henriques da Silva

Revejo-me, ainda hoje, num texto que escrevi há seis anos — que aqui retomo com algumas (bastantes) adaptações, mas cuja essência permanece intacta.

Na tensão entre globalismo e nacionalismo persiste uma clivagem profunda, ideológica e estrutural. Durante décadas, o pensamento dominante — político, económico e mediático — apostou no globalismo como solução universal, a suposta panaceia capaz de resolver todos os males da humanidade. Falava-se em “aldeia global”, em “mercados abertos”, em “governação supranacional”. Parecia o futuro inevitável.

Mas a realidade acabou por desmentir essa utopia. As crises sucessivas — a financeira de 2008 (subprime), a das dívidas soberanas a partir de 2011, a instabilidade e apreensão derivadas das guerras na Ucrânia e Médio oriente, a desindustrialização acelerada, a perda de coesão social , o advento da inteligência artificial, o descontrolo da imigração, os problemas securitários — revelaram as fragilidades desse modelo.

No Sul da Europa, os efeitos foram devastadores: economias asfixiadas, jovens forçados a emigrar, Estados endividados e sociedades exaustas.

Presente um pouco por toda a parte, mas com especial ênfase na Europa Central e de Leste, o nacionalismo nunca deixou de pulsar. Submetido durante décadas ao jugo soviético, manteve-se latente, pronto a ressurgir assim que a oportunidade o permitisse. E regressou com força. Acompanhado, é certo, de populismos e demagogias, mas também de um sentimento profundo de pertença e de defesa da soberania nacional — uma reação natural à arrogância e ao distanciamento das elites globalistas ocidentais.

A União Europeia, por seu lado, escolheu o caminho errado. Apostou numa integração excessiva, ignorando as especificidades e as soberanias nacionais. Em vez de uma “Europa das Nações”, optou por uma “Europa sem nações” — uma tecnocracia centralizadora, desconectada dos povos que a compõem. Os resultados estão à vista: descrédito das instituições, ascensão de forças antissistema, fragmentação política e desconfiança generalizada.

Hoje, figuras como Donald Trump, Recep Erdogan, Viktor Orbán, Giorgia Meloni, Robert Fico, Andrej Babiš, Krzysztof Nawrocki, Marine Le Pen, Santiago Abascal, André Ventura e Geert Wilders, entre outros, não são acidentes de percurso. São sintomas — e, para muitos, respostas — a um mal-estar global. Representam a rejeição do cosmopolitismo abstrato e da governação distante, em nome do regresso à identidade, à soberania e à autodeterminação.

Não se trata aqui de exaltar nem de condenar, mas de compreender: estes fenómenos têm causas reais. São a reação natural a décadas de desilusão e impotência.

Não pretendo alongar-me — o tema é complexo e polissémico —, mas deixo o alerta: o ciclo do globalismo acrítico chegou ao fim. Entrámos num novo tempo político, em que as nações reclamam novamente o direito de ser donas do seu destino.

Os sinais estão por todo o lado. Cabe-nos apenas saber interpretá-los — e, sobretudo, agir antes que o pêndulo balance demasiado para o outro extremo.

Título, Imagem e Texto: Francisco Henriques da Silva, (licenciado em História, diplomata e autor. Foi Diretor-geral de Assuntos Multilaterais no MNE e embaixador na Guiné-Bissau, Costa do Marfim, Índia, México e Hungria), ContraCultura, 7-11-2025 

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