Rafael Marques de Morais
João Lourenço quer e vai
governar com eleições roubadas. Mas até quando?
João Lourenço quer e vai
governar como subordinado de José Eduardo dos Santos. Enquanto presidente do
MPLA, é JES quem designa o governo, quem aprova o programa de governo, quem
determina a agenda legislativa. Enquanto vice-presidente do MPLA, João Lourenço
obedece. Mas até quando teremos um presidente nestas condições?
João Lourenço quer e vai
governar sob a influência do infame general Manuel Hélder Vieira Dias Júnior
“Kopelipa”, o comandante da campanha eleitoral do MPLA, o “arquiteto” das
empresas INDRA, SINFIC e LTI, que prestaram os serviços de organização das
eleições. Foi o trabalho e a truculência do Kopelipa que “ofereceu” as eleições
ao MPLA e a João Lourenço.
Com que cara e com que poder
vai João Lourenço governar o país durante cinco anos?
Durante décadas na Presidência,
José Eduardo dos Santos foi um mestre a manipular a opinião pública,
conseguindo fazer-se de vítima mesmo quando espalhava o terror. Foi essa
mestria que lhe permitiu, por exemplo, gerir as disputas legais contra o jovem
Nito Alves, que o atormentava com umas t-shirts provocatórias. Desde os 15
anos, Nito Alves era espancado pelas autoridades, girou as várias cadeias de
Luanda e ainda foi acusado de crimes contra a segurança do Estado, de injúria
contra Dos Santos e de associação de malfeitores. Dos Santos foi um ditador com
uma obsessão legalista. Porrada não bastava. Era preciso arranjar cobertura
“legal” para os seus atos. Foi assim com os 15+2, a quem inicialmente também
acusou, por via do infame PGR, general João Maria de Sousa, de tentativa de
assassinato do chefe de Estado. Dos Santos era o mestre das invenções de casos
contra quem se lhe opusesse.
João Lourenço estreia-se de
forma brutal, roubando as eleições – mas sem quaisquer veleidades legais. O
MPLA já ganhou com 82% (2008) e a UNITA viu fumo. O MPLA já ganhou com 72%
(2012) e a UNITA viu fumo. Mas, como Dos Santos gosta, as aparências legais lá
estavam e ele dispunha de trunfos. Havia o fantasma da guerra. Havia o discurso
do crescimento económico, da reabilitação das infraestruturas, da cidade do
Kilamba, do dólar que circulava pelas cidades aos maços, desvalorizado. Nessa
altura, os angolanos queriam ganhar em kwanzas, tal era a ilusão.
João Lourenço não tem nenhuma
máscara legal, não dispõe de trunfos, não tem conversa nem mestria. Herda um
poder já disfuncional, mas no pico do saque e do abandono das suas funções
sociais ao nível da saúde e da educação. A juventude não tem emprego. Herda um
país com a mais elevada taxa de mortalidade infantil do mundo. Mesmo assim,
contra todas as probabilidades, João Lourenço apresenta-se como o fazedor do
“milagre económico”.
João Lourenço não engana, não
manieta, não corrompe nem intimida a oposição, como Dos Santos tem sabido
fazer. O MPLA espera que a oposição se renda e é provável que consiga. Mas o
povo não se rende. É e será sempre soberano. Está no limite da frustração e
está consciente da sua soberania que lhe foi usurpada.
João Lourenço rouba as
eleições ao povo sem saber sequer como aldrabar. Esse povo que está farto dos
desmandos do poder, da cleptocracia que enche os bolsos de Isabel dos Santos,
José Filomeno dos Santos, Manuel Vicente, Kopelipa, agora o Danilo dos Santos e
tantos outros da família Dos Santos e da nomenclatura do MPLA.
A porta-voz da CNE, Júlia
Ferreira, já é vista como a maior mentirosa da história. O juiz Silva Neto,
presidente da CNE, que a instruiu, ainda está a salvo das críticas.
O MPLA pode agora cometer o
erro fatal de julgar que está em disputa com a UNITA, o seu velho inimigo para
todas as justificações. Ou contra o Abel Chivukuvuku (ex-UNITA), como indicia a
campanha panfletária que o MPLA lançou de avião no dia 22 de agosto, em que
injuriava a CASA-CE e coagia a população com a ameaça de guerra. O MPLA pode,
como sempre, quebrar a “espinha” da UNITA com o estalar dos dedos.
Mas são os eleitores que se
sentem roubados. Os eleitores que estão contra a corrupção, a falta de
empregos, a falta de seringas nos hospitais, as mentiras diárias do poder. Os
eleitores não aguentam mais a arrogância, os abusos de poder dos dirigentes do
MPLA. É um sentimento generalizado. Muitos se perguntam como será possível
aguentar mais cinco anos sob este tipo de regime.
João Lourenço tem duas
hipóteses: ou mostra, de forma radical, que é pelo povo e pelo diálogo,
respeitando a sua vontade, e cumpre agora com a sua promessa de corrigir o que
está mal, revendo os resultados que o MPLA e a sua CNE anunciaram sem apurarem
os votos, ou então, como parece vir a acontecer, mantém a cara podre de roubo e
acarta com as consequências da falta de legitimidade aos olhos do povo.
Contem os votos, camaradas.
Respeitem a vontade do povo, escutem o descontentamento do povo, sejam humildes
e aprendam a dialogar com o povo. Doutra forma, João Lourenço e o MPLA estão a
escolher o caminho da confrontação com as massas. Podem sacrificar mais o povo,
mas não serão respeitados, não serão amados e só poderão gerar um sentimento coletivo
de revolta.
João Lourenço, torne-se o
engenheiro da paz! Repare as fissuras deixadas pelo arquiteto da paz.
Título, Imagem e Texto: Rafael Marques de Morais, Maka Angola,
26-8-2017
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