João Marques de Almeida
A censura aos livros escolares serviu
também para as esquerdas mostrarem que sabem usar o poder com a brutalidade que
for necessária. A censura funciona sempre como um aviso para todos
43 anos depois do 25 de Abril, a
censura voltou a Portugal. E regressou com as esquerdas no poder, as que mais
lutaram contra a censura do Estado Novo. Com o apoio dos comunistas e dos
bloquistas, o governo socialista forçou a Porto Editora a retirar livros do
mercado. Fez o que o Estado Novo costumava fazer. A censura aos livros
escolares vai muito além da questão do politicamente correto e da igualdade do
gênero. A discussão sobre o politicamente correto serve mesmo como uma
distração. Estamos perante uma estratégia política com elementos totalitários,
a qual não está disposta a tolerar opiniões diferentes. Valerá a pena reler o
magnifico livro de Hannah Arendt, As Origens do Totalitarismo (para
aqueles que julgam que constitui um livro de referência para a direita, convém
relembrar que o Le Monde o considerou um dos 100 livros mais importantes
do século XX). A leitura do livro à luz do que se passa em Portugal é
perturbadora.
De certo modo, nada disto nos deveria
surpreender. O PCP e o BE sempre apoiaram ideologias e regimes políticos
totalitários. Aliás, a “marca” Bloco de Esquerda não é mais do que um exercício
de propaganda política para esconder a natureza do PSR e da UDP. O sucesso
desta operação de “marketing político” é de resto evidente. A maioria dos
portugueses olha para o Bloco como um movimento moderno e progressista, quando
se trata na realidade de uma coligação de forças reacionárias e totalitárias. É
neste aspeto que o politicamente correto das esquerdas serve para esconder a
sua verdadeira natureza. A estratégia da dissimulação é de resto bem explicada
por Arendt. Quanto ao PCP, nem sequer se dá ao trabalho de disfarçar, como
testemunha a sua admiração pela Coreia do Norte e pelo totalitarismo soviético.
Mas onde o totalitarismo das esquerdas
radicais é altamente perturbador é na sua tentativa de acabar com a distinção
entre as esferas pública e privada. Como explica de um modo admirável Arendt,
os movimentos totalitários começam sempre pelo ataque à esfera privada. Nada é
privado e tudo é político, como se vê hoje com a discussão política da vida
privada, deste a censura à linguagem usada em conversas privadas até aos
ataques públicos a hábitos de alimentação. As ideologias totalitárias procuram
dominar todos os aspetos da vida dos indivíduos. Ninguém tenha dúvidas, essa é
a ambição do PCP e do BE.
No entanto, a linguagem da igualdade
entre gêneros e raças não passa de uma propaganda das esquerdas radicais e
sobretudo de um instrumento para desqualificar as direitas. Olhamos para as
bancadas parlamentares e para os órgãos dirigentes do PCP e do BE, e o que mais
se nota são indivíduos negros, ciganos e de outras minorias étnicas. Caso para
dizer das nossas esquerdas, façam o que dizemos, mas não o que fazemos. Quanto
à igualdade de gênero, o PCP nunca na sua história teve uma líder mulher (tal
como o PS). Mas não é necessário chegar ao lugar de topo, a vida do PCP em
todos os níveis de direção tem sido completamente dominada por homens brancos.
Passa-se o mesmo nos sindicatos ligados à CGTP. Quem são os principais rostos
do sindicalismo comunista? Homens brancos. Está na altura dos defensores da
igualdade do gênero exigirem a paridade entre mulheres e homens nos órgãos dos
sindicatos. Se há pressão sobre as empresas para o fazerem, por que não sobre
os sindicatos?
E a antiga União Soviética, o grande
modelo do nosso PCP? Alguém se lembra de uma mulher à frente da União
Soviética? Nenhuma, nem em qualquer outro regime comunista. Estudem as
histórias dos regimes comunistas da Europa Central e verão que não encontram
qualquer mulher entre as lideranças políticas. A igualdade de género e a
inclusão étnica não passam de propaganda política. O movimento comunista
internacional foi construído e liderado por homens brancos.
Mas a censura aos livros escolares
serviu também para as esquerdas mostrarem que sabem usar o poder com a
brutalidade que for necessária. A censura funciona sempre como um aviso para
todos. A geringonça está determinada a mostrar aos portugueses o preço a pagar
pela discordância, pelo pluralismo e pela dissidência. Mesmo os que discordam
do conteúdo dos livros deveriam defender o direito à publicação e deveriam ter
atacado o ato da censura. As nossas esquerdas totalitárias sabem explorar muito
bem a passividade, senão mesmo a apatia, da maioria dos portugueses em relação
a questões como a liberdade de opinião e os perigos da censura. Foi
impressionante como a maioria da imprensa portuguesa desvalorizou, e em muitos
casos apoiou, a censura aos livros escolares. Percebe-se que se chegou a um
ponto crítico quando a comunicação social não se indigna com a censura.
E o PS, no meio disto tudo? Apesar da
geringonça, continuo a distinguir o PS do PCP e do BE. É, contudo, preocupante
não ouvir nenhuma figura de referência do PS a criticar um ato de censura.
Caramba, ninguém se indigna com o que se passou com os livros escolares? Onde
estão as vozes do PS que sempre lutaram pela liberdade e contra a censura? Onde
estão os herdeiros de Mário Soares? Soares talvez fosse um defensor da
geringonça, mas não aceitaria a censura. Estou certo que se fosse vivo teria
criticado o Governo. O Governo socialista tem respeitado os compromissos
europeus, apesar da geringonça. Deve fazer o mesmo com as questões fundamentais
de liberdades e direitos. Recordando um antigo presidente socialista, o
socialismo democrático deve existir para além das regras do défice. A censura
constitui um ataque ao coração da democracia.
Título e Texto: João Marques de Almeida, Observador,
27-8-2017
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