Rui Ramos
A novidade nos últimos tempos foi
a adoção pela esquerda democrática do método comunista de difamar os adversários,
primeiro com o apodo de “neoliberais”, agora com o labéu de “racistas”
No massacre de Barcelona,
participaram mais de uma dezena de jovens muçulmanos árabes, sob a direção do
imã de uma mesquita local. O problema está nas conclusões que não podemos
tirar, sem passarmos pela farsa das acusações de racismo e islamofobia: que a
imigração muçulmana está a ser usada pelos jihadistas para semear na Europa o
sectarismo violento do Médio Oriente, e que a democracia, o pluralismo e o
Estado de direito no Ocidente estarão em risco se não houver um controle
rigoroso das migrações e uma exigência muito clara aos imigrantes e seus
descendentes para se conformarem com os valores, as leis e os costumes das sociedades
de acolhimento. Mas quem disser isto, e só por dizer isto, é “racista”.
Os racistas existem. Mas
racismo é agora usado da maneira mais discricionária. Vamos entender-nos:
racista é qualquer doutrina ou atitude que pressuponha a divisão da humanidade
em “raças” e a hierarquização dessas “raças” de modo a excluir algumas delas
dos direitos e consideração devidos às “raças superiores”. O que significa que
argumentar que membros deste ou daquele grupo, num determinado momento ou
lugar, parecem ter um certo problema pode ser verdade ou mentira, mas não é
necessariamente “racismo” nem sequer fobia. As sociedades ocidentais, como aqui
lembrou Gabriel Mithá Ribeiro, foram aquelas que, no mundo, mais esforço alguma vez fizeram
para eliminar a discriminação racial. Mas foram também aquelas em que a
denúncia de racismo se tornou um truque barato para marcar pontos políticos.
Esse costume tem tido dois efeitos: por um lado, impediu o debate sério sobre
qualquer questão que envolva uma “minoria étnica”, como é o caso do terrorismo
jihadista na Europa; por outro, tornou muitas dessas questões um exclusivo dos
populismos nativistas, o que por sua vez serve à esquerda radical para tentar
assimilar a esses movimentos quem quer que repare nos problemas, de um ângulo
diferente do seu (o terrorismo jihadista deve-se apenas ao imperialismo
americano).
Há muito tempo que a esquerda
radical usa a acusação de “racismo” como uma variante de “fascista”: racistas e
fascistas são todos aqueles que não são comunistas (na Alemanha dos anos 30,
até os sociais democratas eram “sociais fascistas”). Os resultados são tão
absurdos como isto: Pedro Passos Coelho é “racista” apenas por sugerir que as
fronteiras devem estar fechadas a criminosos, mas Arménio Carlos pode incitar
ao ódio contra os funcionários “escurinhos” do FMI. Por quê? Porque Passos é
do PSD e Arménio do PCP. Se Martin Luther King ou Nelson Mandela por acaso
voltassem e se inscrevessem no PSD, a esquerda radical arranjaria maneira de
lhes chamar racistas.
A novidade nos últimos tempos
foi a adoção pela esquerda democrática deste método comunista e neocomunistas
de desqualificar os adversários, primeiro com o apodo de “neoliberais”, agora
com o labéu de “racistas”. Em 1975, o PS escusou-se a tratar os que resistiam à
hegemonia comunista como “fascistas”. Agora, porém, alinha levianamente na
campanha contra o inventado “racismo” da oposição parlamentar. É a medida da sua
crescente incapacidade de resistir às redes da esquerda radical.
Com o devido respeito, a
esquerda democrática está apenas a desempenhar o papel do proverbial “idiota
útil”. Porque este jogo serve sobretudo àqueles que gostariam, um dia, de ver
os cidadãos das democracias ocidentais obrigados, como nos anos 30, a escolher
apenas entre duas alternativas autoritárias, digamos, para usar exemplos de
hoje: ou a Venezuela de Maduro ou as Filipinas de Duterte. Resistir sem medo às
suspeitas absurdas de racismo não é apenas um meio de manter a liberdade de
espírito necessária para enfrentar problemas como os que derivam das migrações
do Médio Oriente: é também um meio de defender a democracia.
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