Marlos Ápyus
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Foto: Brotin Biswas/Pexels
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Só de jornalismo, Nilson Lage
acumula meio século de experiência. Aos 81 anos, aposentado mais de uma década
antes, o mestre em Comunicação e doutor em Linguística e Filologia
mostrou-se ainda em dia com o noticiário. Como poucos, por exemplo, pareceu ter
entendido o Brexit e a eleição de Donald Trump:
“Os Estados Unidos embarcaram,
há décadas, em um processo de esvaziamento da economia industrial em nome da
globalidade do poder. (…) O programa de globalização potencializado por Obama
(…) garantiria a riqueza eterna dos ricos e a pobreza dos trabalhadores
americanos. (…) Tanto a eleição de Trump quanto o Brexit são reações ao mesmo
processo de declínio do estado de bem-estar social.”
Mas o que o ex-professor
adjunto da UFRJ tem a dizer sobre a imprensa é ainda mais urgente. Em
entrevista ao A Tarde, Large foi claro e direto: a imprensa vive de informações não
verificadas.
“Trabalhei
meio século nessa profissão: a mídia não checa um por cento daquilo que publica.
Nem poderia. A
mídia confia em fontes oficiais, que mentem pelos cotovelos; relatos de
testemunhas que contam um conto e acrescentam vários pontos; agências
internacionais com vieses que se desconhecem; assumem versões tortas de
advogados espertos. Já se foi o
tempo em que o repórter hábil arrancava a verdade do informante ingênuo. Até um
jogador de time de várzea tem assessor de imprensa: ninguém fala à
mídia sem que tenha alguma intenção; como saber qual?“
Questionado sobre a atuação
dos “fact-checkers”, jornalistas que tomaram a frente dos mecanismos de busca e
das redes sociais com a missão de “checar fatos”, o linguista parecia não botar
muita fé na iniciativa:
“A exatidão se
aplica a fatos, não a versões. Um fato admite ‘n’ versões. Combinado com outros fatos, o volume cresce
numa espécie de análise combinatória que multiplica o número de fatos que se
combinam com o número de versões consideradas de cada fato. O
que pode ser checado é parte do que se publica, e nem sempre a mais relevante,
ou a que tem maiores consequências. (…) O jornalismo trata de causas, consequências, versões, motivações
subjetivas, correlação de fatos, ideias e proposições. Não há como reduzi-lo ao
relato factual, nem afirmar, com certeza e presteza, sua verdade. A
checagem dos fatos é importante, mas é só uma parte ínfima – em volume – da
informação jornalística.”
Lage ainda se pronunciou a respeito dos filtros
e critérios utilizados pelas empresas do Vale do Silício. E chegou à conclusão
de que, se continuarem no caminho que tomaram, fatalmente cumprirão a função de
um censor.
“Empresas como Google ou Facebook não
têm como saber se algo que está sendo ou vai ser difundido é verdadeiro ou
falso; teriam que partir de pressupostos, isto é, de critérios de censura.”
A liberdade de expressão enfrenta um risco em
escala global. Portanto, é seguro afirmar que se trata de um dos momentos mais
críticos de sua curta história. É urgente que seja defendida mesmo por quem vê
nela um problema em potencial. Afinal, trata-se de um direito humano e, como tal, precisa ser preservada.
Título e Texto (e Marcações): Marlos Ápyus, Implicante,
23-8-2017
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