Ferreira Gullar
A saída é cortar os gastos
supérfluos com a máquina estatal e desonerar de taxas o custo da produção
Informações recentes parecem
indicar que a economia brasileira caminha inexoravelmente para uma situação
crítica, de difícil solução. A se efetivar tal previsão, dela resultaria uma
crise política que poria em questão a hegemonia lulista sobre o sistema de
poder.
A título de especulação, vamos
tentar avaliar a natureza dessa crise futura e suas consequências. Mas, para
isso, será necessário examinar o processo político e econômico que ajudou a
criar a situação crítica a que se referem economistas e analistas da matéria.
Ninguém põe em dúvida o fato
de que os governos de Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso introduziram
mudanças importantes no processo econômico brasileiro, criando condições para
um crescimento saudável e sustentado.
Graças a essas medidas, o
Brasil se livrou da inflação crônica que inviabilizava o crescimento da
produção e consumia o valor dos salários. Aquelas foram medidas necessárias,
mas não suficientes.
Lula assumiu a Presidência da
República em 2003 e, muito embora tenha combatido todas aquelas medidas,
resolveu adotá-las e usá-las como um modo de consolidar seu prestígio político
e ampliá-lo. Graças a isso, pôde eleger Dilma Rousseff sua sucessora e, com
isso, estender para diante seu projeto político.
A verdade, porém, é que, como
não tinha um programa de governo nem muito menos um projeto estratégico para o
país, valeu-se da estabilidade econômica e do momento propício do crescimento
mundial para ampliar seus programas assistencialistas e propiciar aumentos salariais
que beneficiaram amplas camadas da população mais pobre.
O crescimento do mercado
interno, entre outros fatores, permitiu que o país passasse relativamente ileso
pela crise que atingiu a economia mundial a partir de 2008.
Noutras palavras, desde que o
petismo assumiu o governo, nenhuma medida foi tomada para atender às novas
condições criadas pelo próprio crescimento da economia. De fato, o que se fez
foi onerar os setores produtivos, ampliar a máquina estatal e aumentar as
despesas públicas. O número de ministros subiu de 27 para 39 -ou 40, já nem
sei- e, com eles, o número de funcionários concursados e não concursados.
Seguindo o exemplo do
Executivo, a Câmara, o Senado e o Judiciário criaram novos encargos para o
Tesouro, aumentando o deficit público. Naturalmente, todas essas medidas - que
ampliaram o consumo e mantiveram o crescimento da economia - deixam a população
otimista, disposta a gastar, ainda que se endividando a cada dia.
E tudo isso, sem que se pague
salário justo a professores e médicos, que desempenham papel vital para a
sociedade. Mas essa gastança aproxima-se do fim, porque ou se põe termo a ela,
ou o país caminhará para o impasse.
As mais recentes informações,
colhidas nos institutos de pesquisa, compõem um quadro preocupante, a começar
pelo índice de crescimento da economia que, no último ano, ficou em apenas
2,7%, abaixo de quase todos os país da região, exceto Guatemala e El Salvador. Esse
dado poderia ser visto como um fato conjuntural, não fossem outros, igualmente
preocupantes, como o índice de investimento, que ficou em 19% do PIB, contra o
índice de 23% da região, enquanto a produtividade do trabalhador brasileiro
ocupa o 15º lugar na América Latina. Por outro lado, nossa produção industrial
perde competitividade, devido à desvalorização do dólar, mas também aos encargos
que oneram a folha de pagamento.
Noutras palavras, o país chega
ao limite de seus gastos, quando a solução para o impasse seria investir na
infraestrutura (portos, estradas de ferro, rodovias) e na formação de
profissionais de alto nível técnico. A saída é cortar os gastos supérfluos com
a máquina estatal e desonerar de impostos e taxas o custo da produção. Mas,
para isso, teria que contrariar os interesses dos partidos da base aliada e o poder
das centrais sindicais, aliados do governo. Dilma teria que topar essa briga.
Se esse diagnóstico está
correto, a lua-de-mel lulista com o poder parece aproximar-se do fim. Podem até
ganhar as eleições deste ano e as de 2014. Não sei. O certo é que, cedo ou
tarde, a realidade cobra seu preço.
Título e Texto: Ferreira
Gullar, Folha de S. Paulo, 01-04-2012
Colaboração: Rafael Picate
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