Ex-coordenadora da Lava Jato em São Paulo
lamenta a saída de Deltan Dallagnol e dispara contra Aras: ‘É apenas um chefe
administrativo’
Roberta Ramos
Na semana em que o coordenador
da Operação Lava Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol, deixou a força-tarefa para
cuidar de assuntos pessoais, várias dúvidas surgiram. Para responder parte
delas, Oeste fez cinco perguntas à procuradora Thaméa Danelon [foto],
que também já fez parte do grupo que mudou o combate à corrupção no país.
Como a senhora enxerga a
saída do procurador Deltan Dallagnol da Operação Lava Jato?
Ele saiu por questões
familiares, mas por um lado não deixa de ser uma perda porque ele é um grande
ícone no combate à corrupção, foi um dos grandes responsáveis por esse
resultado todo que tivemos na operação. Contudo, não é fácil ficar por seis
anos sendo atacado, perseguido, sendo pressionado por poderosos que não querem
que o Brasil se transforme.
É completamente compreensível
a saída, primeiramente pelas questões familiares, ainda que, do meu ponto de
vista, mesmo que não houvesse essa questão, acho que ele já deu uma imensa
contribuição e penso que ele tem de descansar um pouco, se dedicar à família,
porque não é fácil ficar nesse front, lutando contra a corrupção
contra essas pessoas tão poderosas, que se valem de injustiças de leis para
tentar acabar com a Lava Jato e tentar prejudicar as pessoas que participaram.
A senhora acha que, além do
problema de saúde da filha, pode ter havido algum outro motivo para a saída do
procurador que ele não expôs?
Não, acredito que não. O
Deltan [Dallagnol] sempre foi muito corajoso, muito combativo, luta pelos
ideais, acredita que é possível melhorar o país. Eu também acredito. Foi o
fator familiar somente. Ele já teve diversos problemas, ainda mais nesses
últimos anos — muitas representações no Conselho Nacional do Ministério Público
(CNMP), ações movidas contra ele por corruptos — e ele sempre continuou firme e
forte. Foi mesmo essa questão desse probleminha de saúde da filhinha dele. Ele
está certíssimo.
Vai continuar trabalhando no
combate à corrupção, evidentemente, com outras causas, mas tem de se dedicar à
família e à filha. Quando a menininha ficar um pouquinho melhor, quando os
tratamentos forem concluídos, pode voltar para essa batalha. Uma batalha que
durará muitos anos ainda.
A saída dos procuradores da
Lava Jato nesta sexta-feira em SP esvazia a força-tarefa no Estado?
Claro que, a princípio, nunca
é bom que todos os integrantes queiram sair de uma vez só. No entanto, houve
uma questão interna deles, teve alguns conflitos com a procuradora natural, que
é a responsável dos feitos. Talvez tivesse sido melhor que eles tentassem
entrar numa composição, para que os trabalhos não fossem prejudicados. Talvez
agora o procurador-geral [da República, Augusto Aras] forme uma outra equipe, a
Unidade Nacional de Combate à Corrupção [e ao Crime Organizado, Unac, motivo
pelo qual o PGR ameaça, inclusive não dar continuidade a operações de combate à
corrupção, como a própria Lava Jato e a Greenfield, por exemplo] para ser
implementado.
Como a senhora vê a
interferência da Procuradoria-Geral República na operação?
Embora nós tenhamos o
procurador-geral que é nosso chefe, superior, ele é um chefe apenas
administrativo. Não é uma chefia hierárquica. Porque nos termos da Constituição
de 1988, todos os membros do Ministério Público são independentes e autônomos.
Ou seja, trabalhamos e nos baseamos apenas na nossa convicção, na lei e na
Constituição. Então interferências superiores, seja do procurador-geral, dos
procuradores hierarquicamente superiores, isso não pode acontecer. Não me
parece saudável que o procurador-geral queira interferir nos trabalhos, na
atividade-fim. Isso não deve acontecer. Ele deve exercer apenas a chefia administrativa
e não hierárquica. Sou contra qualquer interferência no trabalho direto dos
procuradores.
A senhora acredita na
continuidade da Operação Lava Jato?
Sim, acredito. Há muito
trabalho a ser feito ainda. Semanalmente há resultados. Podemos recuperar, na
Lava Jato do Rio de Janeiro juntamente com a Procuradoria-Geral da República,
que na semana passada ofereceu uma denúncia contra o governador do Estado
[Wilson Witzel], porque ele tem foro prerrogativo. A Lava Jato de Curitiba
também, oferece denúncias, celebra acordos de delação premiada e leniência, tem
muita coisa a ser feita ainda.
Acredito, sim, que vá
continuar. Claro que é uma perda a saída do Deltan [Dallagnol], não há dúvidas,
mas temos outros colegas competentes. Como o próprio Alessandro [Oliveira,
substituto de Deltan Dallagnol como procurador da Operação Lava Jato de
Curitiba], que assumiu, é super dedicado, capaz, muito profissional. Tenho
certeza de que eles continuarão a fazer um excelente trabalho.
Título e Texto: Roberta
Ramos, revista Oeste,
6-9-2020, 10h15
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