O país europeu se alia aos EUA
em sua ofensiva contra a Argentina e busca apoio de outros países europeus e
sul-americanos
Francisco Vianna
Na luta pelo petróleo, cresce
o conflito criado pela Casa Rosada pela estatização da REPSOL-YPF. O governo de
Cristina F. Kirchner disse que não está nem aí para as reações e as gestões da
embaixada norte-americana
O governo espanhol, na pessoa
de seu presidente, Mariano Rajoy, anunciou ontem que obteve o “compromisso” de
apoio dos EUA à sua ofensiva comercial contra a Argentina pela desapropriação
e estatização da petroleira privada hispano-portenha REPSOL-YPF, enquanto o
Departamento de Estado norte-americano informava que realiza gestões em Buenos
Aires para expressar a sua preocupação com a medida que contraria as regras de
mercado em todo o mundo.
O chanceler espanhol, José
Manuel García Margallo, se reuniu em Bruxelas com a secretária de Estado,
Hillary Clinton, e afirmou que os Estados Unidos estão ‘mais próximos’ da
posição espanhola. Margallo anunciou que Clinton se comprometeu em
"estudar as propostas" da Espanha que buscam uma resposta da
comunidade internacional frente à expropriação e estatização da
‘joint-venture’.
Em Washington, no entanto, o
Departamento de Estado informou que a embaixada norte-americana em Buenos Aires
realizou gestões junto à administração de Cristina Kirchner para expressar a preocupação
de seu governo pela estatização de uma empresa privada que não passava por
qualquer situação de dificuldade econômica ou financeira, anunciada na segunda-feira
passada. Em Bruxelas, o chanceler espanhol aparentava muito otimismo ontem com
relação ao seu objetivo declarado de conseguir una "retificação" da
presidente Cristina Fernández de Kirchner quanto ao ocorrido e que mais
preocupou nas relações bilaterais desde que a Espanha retornou à democracia em
sua monarquia constitucional, em 1975.
"Clinton nos pediu que
lhe transmitíssemos isso, que é o que nós esperamos dos EUA e que é o que se
faz entre bons aliados e bons amigos como são Estados Unidos e Espanha",
disse García Margallo, que também lembrou que Washington retirou há "bem
pouco" uma série de benefícios comerciais da Argentina em suas relações
bilaterais.
Dessa maneira, a Espanha levou
ontem adiante sua estratégia de agregar o maior número de países e de
instituições internacionais que puder para protestar contra
a estatização das ações da espanhola REPSOL em ‘joint-venture’ com a YPF e
reclamar junto ao governo de Cristina Fernández de Kirchner que reveja sua
decisão de se apropriar, por decreto, do controle acionário (de 51%) da
petroleira.
Sem dúvida, para o governo
argentino restou dar importância ou não a possíveis represálias internacionais,
que fatalmente ocorrerão, caso Buenos Aires não reveja sua decisão. "O
governo nacional não está preocupado com qualquer tipo de represália",
disse o Ministro do Interior, Florencio Randazzo.
Através de intensas
negociações paralelas na Colômbia, onde Rajoy se achava em visita oficial, e em
Bruxelas, no Palácio da Moncloa, sondou uma série de medidas contra a
Argentina, sobre as quais tratará hoje na reunião semanal do Conselho de
Ministros.
Apesar de que nem o mandatário
nem seu gabinete terem adiantado em que consistem tais represálias, nas últimas
horas ganharam destaque as versões sobre o virtual cancelamento das importações
de óleo de soja e de carne provenientes da Argentina.
A possível aplicação da
primeira medida foi sugerida pelo Ministro da Indústria, José Manuel Soria, à
mídia espanhola, ao assinalar que "existem outros países" que poderão
substituir a Argentina no fornecimento de 40% das importações da Espanha dessas
mercadorias básicas para a fabricação de biocombustíveis. A ser concretizada
esta medida, a Argentina perderia um mercado em que fatura 1,05 bilhão de
dólares por ano.
Por outro lado, também já se estuda
o corte dos auxílios ao desenvolvimento destinados à Argentina, que, segundo o
jornal ABC, nos últimos 4 anos fizeram ingressar no país mais de US$ 130
milhões. A mesma fonte midiática revela ainda que a raiz da tensão produzida
por este enfrentamento "é analisada" como sendo a continuidade da
sede da Fundação Carolina em Buenos Aires.
Em ambos os lados do
Atlântico, os funcionários espanhóis buscam energicamente novos apoios para
pressionar a Casa Rosada através de uma combinação de opções que vão desde uma
declaração internacional conjunta de repúdio à expropriação até a mais difícil
meta de deixar a Argentina fora do G-20.
![]() |
Cúpula do G-20, Washington |
Mas, ontem, as manifestações
de repúdio à estatização da YPF e à desapropriação de ações da REPSOL não
pararam por aí. No mesmo dia em que em Madri o Conselho Geral do Poder
Judiciário (CGCP) decidiu não enviar "por uma questão de responsabilidade
institucional" sua delegação à Cúpula Judicial Ibero-americana que se
realizará em Buenos Aires, García Margallo também garantiu ter convencido os
mandatários de 11 países europeus a dar respaldo a uma possível ‘moção de
repúdio’ contra a Argentina.
![]() |
Juan Manuel Santos |
Estes Estados, que compõem o
chamado "Clube de Berlim", debaterão na próxima segunda-feira, a
pedido especial da Espanha, "todas as opções possíveis" que esse país
possa tomar para responder à altura à "decisão arbitrária",
populista, e demagógica de estatizar a petroleira.
Para isso, o presidente Rajoy
voltou a aproveitar seu giro na América latina para agregar apoios ao seu
enfrentamento com o governo argentino. Na Colômbia, ontem, recebeu um grande e
simbólico elogio. "Aqui
na Colômbia nós não estatizamos, presidente Rajoy", disse Juan Manuel
Santos, o presidente colombiano. “Aqui nós temos regras estáveis para o
jogo comercial”, acrescentou Santos e ainda agradeceu ao Presidente Mariano
Rajoy o apoio que a Espanha tem dado para a assinatura de um tratado de livre
comércio com a União Europeia, nos moldes básicos do tratado que mantém da
mesma natureza com os EUA.
ARGENTINA EM ROTA DE COLISÃO
Apesar de ser considerado um
jornal de ‘esquerda’ – para os padrões americanos, é claro – o Washington Post,
em um dos seus editoriais, disse que quando Cristina F. de Kirchner foi
reeleita em outubro passado, ela tinha duas opções: uma era a de continuar a
praticar sua política populista e autocrática que marcou seu primeiro mandato e
a outra a de liderar seu país de volta aos mercados globais e ao mundo
democrático. “Esta semana” – disse o editorial – “a Sra. Fernandez fez sua
clara escolha ao estatizar a maior empresa privada de petróleo do país”.
Assim como no recente
recrudescimento da causa perdida de propugnar
pela alegada soberania argentina sobre as Ilhas Falklands, a medida
populista e demagógica da Casa Rosada – que recebeu o aplauso barato da
população portenha que ainda se deixa impressionar por essas manobras
cosméticas destinadas a encobrir as dificuldades domésticas e a sua
incapacidade de resolvê-las – assegurou que a Argentina vá mergulhar num
completo isolamento do resto do mundo, e se afastar cada vez mais do progresso
econômico que acontece nos seus países vizinhos.
O jornal da capital americana
explica que a estatização, feita principalmente às expensas da empresa
petroleira espanhola REPSOL, segundo as palavras da presidente argentina, foi
feita “para recuperar a soberania sobre uma empresa estrangeira cuja produção
estava em queda”, mas, é claro, não mencionou que a produção da ‘joint-venture’
hispano-portenha tinha sido causada amplamente por más políticas
governamentais, incluindo o congelamento dos preços domésticos da energia
fóssil e os controles das remessas de lucros. Isso sem mencionar que, já de
caso pensado, a Casa Rosada praticamente obrigou alguns estados a cancelar suas
concessões de exploração e extração de petróleo em diversas áreas, para forçar
a desvalorização das ações da empresa na bolsa.
O fato irá simplesmente
desabilitar a Argentina de atrair capital externo e a competência necessária
para explorar suas grandes reservas de óleo e gás, incluindo seus substanciais
depósitos de xisto betuminoso.
Tamanha guinada em direção à
esquerda é uma má notícia não apenas para os empresários, mas também uma quase
certeza de que a nova estatal não passará de um enorme cabide de empregos para
apaniguados do regime, talvez por inspiração do que ocorre no setor no Brasil,
com a gigante Petrobrás, e também para o consumidor argentino que sentirá no
bolso todo o custo disso ao pagar, na bomba, pelo litro da gasolina, o dobro ou
mais do que está pagando hoje.
Desde que foi reeleita, a
governante continuou a atacar a mídia independente, incluindo os dois jornais
mais importantes do país, o ‘Clarín’ e o ‘La Nación’. Os economistas que ousam
escrever ou dizer que a verdadeira taxa de inflação na Argentina está acima de
20 por cento ao ano são submetidos a perseguições veladas, mas implacáveis,
enquanto personalidades do governo são exaltadas. Cristina Fernandez é
considerada como sendo guiada por um círculo de militantes liderados por seu
filho, Maximo, e nomeado após o governo do presidente esquerdista Hector
Campora, do início da década de 1970.
De nada vale a lição de que
Campora tenha ajudado a precipitar um dos colapsos políticos e econômicos
periódicos que têm vitimado a Argentina por mais de meio século. A maldição que
paira sobre esse país que já foi rico é a incapacidade de sua classe política,
extremamente corrupta, de aprender com seus fracassos e tropeços — ou com os de
seus vizinhos. Enquanto o Brasil e o México crescem a todo vapor, integrando-se
cada vez mais e melhor com a economia mundial e consolidando progressivamente
democracias estáveis, a Argentina da Sra. Cristina Fernandez de Kirchner ruma
inexoravelmente para outro desastre.
Apesar de ser pouco o que o
resto do mundo possa fazer para evitá-lo, uma maneira de enviar um apelo de
‘acorde!’ à Argentina seria removê-la do Grupo dos 20, o suposto clube da elite
das nações que se reúne para avaliar os problemas econômicos mundiais e como
lidar cada uma com eles da maneira mais eficaz. O vizinho Chile, que já
ultrapassou de muito a Argentina em desenvolvimento social (econômico e
político) e em índice de desenvolvimento humano, seria o país ideal, até por
uma questão de justiça, para substituir Buenos Aires no grupo.
Título, Imagens e Texto: Francisco Vianna (com base na imprensa
internacional), 20-04-2012
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