terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Os crocodilos rondam a região serrana do Rio


Sim, não há como escapar das inundações. Os que não foram literalmente soterrados pelas lamas furiosas ficaram arrasados emocionalmente e chocados com as consequências funestas das chuvas da semana passada na região serrana do Rio.
Não bastasse todo o drama dos flagelados, a brutal perda de vidas e o sacrifício e abnegação dos que se oferecem a ajudar, temos de lidar também com os crocodilos que surgem sorrateiros dos lamaçais. Você não percebeu os crocodilos? Não acredito! Não sabia que havia crocodilos nas regiões serranas do Rio de Janeiro? Não? Mas eles existem em todos os lugares! Não reparou neles na tv? Nos jornais? Ah, entendo. Você não os percebeu sob os disfarces variados.
Claro, os crocodilos da serra (assim como os da cidade e os do Planalto) são espertos. Não vão ficar dando mole, como seus colegas do Pantanal, por exemplo, protegidos pelo IBAMA, que chegam a fazer pose, dar tchauzinho e tirar fotos com turistas ecológicos. Os crocodilos que tenho visto surgir das ruínas lamacentas de Teresópolis, Friburgo e outras regiões atingidas pelas chuvas são de uma espécie altamente ardilosa e sofisticada. Usam disfarces. E trocam rapidamente de disfarce quando são desmascarados. E choram muito (é quase impossível diferenciar uma lágrima de crocodilo de uma lágrima comum).

Confundem-se com pessoas, misturam-se às vítimas, oferecem-lhes ombros de crocodilo, tiram fotos com autoridades disfarçando seus sorrisos metálicos de crocodilo. É preciso saber diferenciar os crocodilos daqueles que realmente estão ajudando as vítimas e dando o sangue por elas: bombeiros, soldados, moradores da região, gente do Brasil inteiro que se solidariza e envia mantimentos, roupas, água etc.
O meu amigo Marcos Palmeira, por exemplo, é um desses abnegados que se sacrifica e botou à disposição dos flagelados toda a produção de sua fazenda orgânica, localizada na região afetada pela tragédia. O Marquinhos, como eu, sabe que é preciso tomar cuidado com os crocodilos da serra (ele tem uma fazenda lá!). Caso você não tenha reconhecido os crocodilos, aqui vão algumas dicas de como percebê-los no meio da multidão (e, cuidado, eles fazem bem mais que morder):
1. Crocodilo adora se disfarçar de político. É seu disfarce preferencial, já que pode manter o sorriso constante e cínico. Desconfie de políticos que aparecem com expressão consternada nos locais das tragédias, prometendo para o ano que vem medidas que haviam prometido no ano passado e nunca foram tomadas, sabe-se lá por que – desculpem o trocadilho infame – cargas d’água.
2. Crocodilo ama se disfarçar de jornalistas. É um de seus disfarces preferidos, pois pode falar das desgraças e explorá-las à vontade enquanto a audiência bomba. Desconfie de apresentadores de telejornais e programas de tv que, enquanto mostram uma desgraça terrível, colocam uma musiquinha piegas ao fundo para fazer você chorar e não mudar de canal.
3. Crocodilo chega ao êxtase quando se disfarça de religioso e filantropo. É o ponto alto do disfarce da crocodilagem, já que pode chorar, invocar o nome de Deus e exibir todo o seu talento de ator crocodilo. Desconfie de gente que encontra prazer na dor e mal disfarça a excitação por poder estar no meio da desgraça, como se estivesse numa festa de Revéillon.
Bem, a lista é interminável, mas fico por aqui, pois o teu saco – como o meu – já deve estar cheio de crocodilos.
Imagem e texto: Tony Bellotto

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