domingo, 29 de março de 2015

Pizza de gafanhoto para ambientalistas

Jacinto Flecha

Em Moscou, antes da revolução soviética, o padeiro Ivanov era fornecedor da corte do Czar. Foi intimado a se apresentar em palácio, devido a grave acusação. 

– Como é que você explica isso?

O Czar exibia pessoalmente um pedaço de pão, onde uma aranha se destacava com todas as suas formas e repugnâncias. Sem se impressionar com a carranca dos presentes, Ivanov pegou tranquilamente o pedaço de pão, deu uma mordida onde se achava a aranha, mastigou e engoliu o corpo de delito. E esclareceu: 
– Era uma passa de uva, majestade.

– Desde quando você coloca passas no pão?

– Desde hoje, majestade.

Liberado impune, pois aquela acusação não se sustentava depois de consumido o corpo de delito, a primeira providência de Ivanov ao sair dali foi comprar bom sortimento de passas. E o pão incrementado dele passou a render elogios e dinheiro. Não poderia ter sido mais engenhosa a presença de espírito desse padeiro, apesar da repugnância natural em engolir uma aranha.

Muitas situações justificam gestos como esse, para tirar pessoas de apuros. Presenciei no colégio a esperteza de um colega, que se apressou a engolir suas “colas” enquanto o professor se encaminhava para flagrá-lo. E relatos de prisioneiros em calabouços infectos apontam baratas, lagartixas, lesmas como alimento habitual.

Um parente idoso, bom contador de casos, costumava manter inalterável a fisionomia ao concluir narrativas evidentemente absurdas. Isso deixava os ouvintes espantados e inseguros, até alguém dar uma boa gargalhada. Lembro-me, por exemplo, de ele afirmar que se pode comer carne de cobra. E explicava:

– Quando você mata uma cobra deste tamanho (e abrindo as mãos, aproximava os polegares de modo a representar dois palmos), basta desprezar um palmo do lado da cabeça, outro do lado da cauda, e comer a parte que sobrou, assada ou frita.

Muitas pessoas não acompanham com atenção as narrativas, e acabam caindo na esparrela. Não sei se ainda se cai na esparrela na linguagem atual, mas assim se dizia quando alguém foi propositalmente enganado.

Consta que os chineses comem com naturalidade coisas que nos provocariam repulsa ou náuseas, inclusive cobras com mais de dois palmos; ou menos. Um prato que se considera requintado é a sopa de ninho de andorinhas, feita com a saliva que elas usam para colar gravetos uns nos outros, ao construírem seus ninhos. De onde vêm esses costumes chineses? Quais calamidades os levaram a isso? Não sei, porém mais de quatro milênios de história nem sempre garantiram vida fácil e agradável na China. Temos disso provas bem recentes.

Não quero criar complicações digestivas para o seu almoço ou jantar, por isso interrompo meu repertório de repugnâncias alimentares, e volto minha atenção para os artífices da decadência humana. Quem são esses? Que tipo de decadência promovem? O que tem ela a ver com repugnância dos alimentos?

Você já deve ter visto na imprensa, infernet e outras mídias uma onda recente propondo o consumo de insetos como alimentos. Consumo habitual de almoço e jantar, não só naquelas circunstâncias extremas que mencionei. Os artífices dessa decadência a consideram normal, até desejável. Não faltam cretinos para experimentar a novidade, como voluntários em sessões de alimentação com insetos. Convidados depois a dar sua apreciação, nunca se declaram envergonhados por terem caído na esparrela, elogiam o alto teor proteico e não sei que outros aspectos da sua cretinice gastronômica. Uma espécie de propaganda para convidar e iludir outros.

Vejo claramente a impressão digital ambientalista nessa proposta de decadência alimentar. Sou condescendente e compreensivo com cretinos de várias espécies, mas não com esses decadentes voluntários a serviço da decadência. Estou pensando em compor um fichário de todos eles, para uso em certas emergências. Por exemplo, naquelas pragas de gafanhotos, quando soltam enxames multitudinários e aniquilam as plantações. Seria muito prático transformar aspiradores de pó em aspiradores de gafanhotos, encher panelões com eles e preparar guisados, sopas, cozidos, moquecas, empadas, suflês, gratinados – pratos deliciosos e variados para ambientalistas desvairados. E haverá sal de frutas à vontade…

Se você conhece algum desses ambientalistas artífices da decadência, envie-me o nome para expandir o meu fichário. Pragas assim são difíceis de eliminar, mas podemos reduzir uma delas usando-a como alimento da outra. Produzindo indigestão grave com a empada de gafanhoto, podemos reduzir as duas pragas. Vale o esforço. 
Título, Imagem e Texto: Jacinto Flecha, ABIM, 29-3-2015

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