terça-feira, 6 de outubro de 2015

Era “poucochinho”

Diogo Agostinho
O povo falou. Soberano, no seu exercício do voto, disse o que queria depois de quatro anos de mandato. Pode parecer normal, mas uma legislatura foi concluída, a primeira com um Governo de Coligação.

Quem diria que quatro anos depois de um duro exercício de poder executivo, muitíssimo constrangido por um difícil e exigente Memorando da Troika, a Coligação que governou o País, em tão pouco auspiciosas circunstâncias, voltaria a vencer eleições?

Aconteceu. Já algo semelhante tinha acontecido no Reino Unido, com David Cameron e agora com Tsipras, versão moderada, depois de um enorme pacote de austeridade.

Teremos um quadro parlamentar e político novo. Novas dinâmicas, que obrigam a novas respostas. No entanto, as pessoas depositaram novamente a sua confiança em Pedro Passos Coelho e Paulo Portas para prosseguirem com a liderança do País.

É espantosa a multiplicação dos discursos de vitória. Todos querem a taça e apresentam-se como vencedores, mas cuidado com as tentações de querer ganhar na secretaria. É confuso, mas é bom diferenciar. Não existe hoje uma maioria absoluta na Assembleia da República. Porém, também não existe um mandato objectivo para uma Maioria negativa, sem ligação, sem coerência e sem alicerces para Governos à esquerda, que não seria mais do que um vazio exercício de bota abaixismo, descurando o sentido de responsabilidade para com as exigências externas do país.

Apesar das incertezas podemos apontar vencedores e vencidos e são claros. Porque ontem também foi dia de futebol podemos elencar os diferentes vencedores e derrotados.

Vencidos:

António Costa – Chegou qual D. Sebastião, da política em Portugal, em dia de nevoeiro, um pouco como Rui Rio à Direita. Na hora da verdade, provou-se que o país não é apenas a Pastelaria Versailles, o Martinho da Arcada, a Baixa de voltinhas pelo Chiado e as ruas com tuk-tuk em Lisboa. Não bastava falar grosso e ser agressivo. Levou um banho de realidade e de humildade, foi a desilusão eleitoral e a desilusão do serão eleitoral. Agarrou-se ao lugar e não percebeu que deveria ter de colocar o lugar à disposição. Perdeu-se entre a esquerda e o centro. E tem um belo número pela frente no que toca a Presidenciais. Novamente partindo com um Ferrari, acabou de burro.

Rui Rio – Por falar em Presidenciais, Rui Rio ainda olhava para este dia com uma centelha de esperança. Era a outra solução. Não havendo Belém, poderia existir São Caetano à Lapa. Terá uma palavra a dizer no que toca à próxima campanha eleitoral, mas, não terá um caminho fácil. Nada de triunfalismos em ombros.

Jerónimo de Sousa – O quase grande animador da campanha. O homem sereno, perdeu o lugar para um Bloco jovem e surpreendente. Afinal o PCP, perdão, a CDU, perde eleições. E é bom relembrar o maior embuste democrático que é esta coligação Democrática Unitária, que nunca foi a votos separada e que procura atenuar a “imagem pesada” do Partido Comunista no eleitorado.

Pacheco Pereira e Manuela Ferreira Leite – São dois grandes derrotados neste dia. Disseram, criticaram, verdadeiros guerrilheiros sénior, e atacaram o Governo da Coligação e Pedro Passos Coelho. A raiva cegou, por muitas vezes, estes dois militantes do PSD.

José Sócrates – Foi lastro que puxou António Costa para baixo. Começar um mandato com o último Chefe de Governo do seu partido preso não é fácil. No entanto, esta campanha passou, em grande medida, ao lado do Engenheiro Sócrates. E ainda bem. Ainda bem, porque não era o tema, porque não se trata de um preso político e porque a Justiça deve estar sempre separada da Política.

Marinho e Pinto – Foi um epifenómeno claro, uma espécie deone hit wonder político. A demagogia é muito bonita, mas os portugueses só caíram à primeira, na cantiga do malandro.

Livre – Não foi Tempo de Avançar. O sonho deste Partido vindo quase na maioria do Bloco, perdeu o comboio. Uma desilusão.

Vencedores:

Pedro Passos Coelho – É o grande vencedor da noite. Em quem poucos, ou quase nenhuns acreditavam, ele acreditou e segurou um Governo austero, no meio de uma crise política em 2013, vinda de dentro. De irrevogável, passou a incontestável. Começou nesse momento decisivo a mudar a percepção que as pessoas tinham de si. Mostrou uma dureza e friezas que ficam para a história. Esta vitória é sua e de mais ninguém.

António José Seguro – É também um vencedor da noite eleitoral. Não saberemos quais seriam os resultados se fosse ele o líder. Mas depois da vitória de Pirro, poucochinha, nas eleições europeias, tem demonstrado um sentido de dever enorme, recolhido nas Caldas da Rainha, soube manter um silêncio de ouro. A política é, hoje, gestão de expectativas. E Seguro demonstra o valor de se afastar, no momento certo.

Paulo Portas – É o sobrevivente nestas eleições. O líder político com mais tempo, em exercício de funções, soube negociar uma coligação que lhe foi muito benéfica. Mais uma vez o seu instinto de sobrevivência foi providencial para o CDS-PP e soube fazer as despesas nos ataques da coligação ao PS, entre chapéus e arruadas. Está aí e continuará no Governo.

Catarina Martins – Sofreu um lifting político tremendo. De uma oposição histriónica no Parlamento, percebeu a mais valia que, a estrela da Comissão de Inquérito ao caso BES, Mariana Mortágua trouxe à esquerda e regressou a serenidade que tanta falta fazia ao Bloco. Mudou o tom e foi a surpresa desta campanha.

PAN – Um resultado surpreendente, que denota a tendência de um maior cuidado das pessoas para com o tema dos animais. O Facebook que o diga.

Marcelo Rebelo de Sousa – Acaba por ter a passadeira vermelha estendida para ser Presidente da República. Era o melhor cenário que tinha pela frente. Este ou uma vitória por poucochinho de Costa. Ter Maria de Belém e Sampaio da Nóvoa (quem?) como opositores é o mesmo que jogar sozinho com a bola. Contra a parede. Veremos se não entrará em mais cenários e faz o de sempre: perde por falta de comparência.

Tem agora a palavra o Presidente Cavaco Silva. Será dele o papel central, neste novo quadro político. Hoje, dia 5 de Outubro, não estará nas comemorações do Dia da República. Mal. Como sempre teimoso, quis deixar o seu contributo em vésperas de eleições. Terá agora de chamar os Partidos e obrigar a um entendimento para o futuro.

Teremos política. Agora, é tempo de exigir sabedoria, cabeça fria, capacidade de diálogo e entendimentos.

Os portugueses foram claros: querem este Governo e responsabilidade do PS. Agora, entendam-se. 
Título e Texto: Diogo Agostinho, Expresso, 5-10-2015

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.

Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.

Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-