segunda-feira, 10 de abril de 2017

Populismo à portuguesa

João Marques de Almeida

Muitos em Portugal gostam de dizer que não há populismo entre nós. É falso. Temos um governo populista, apoiado por partidos populistas. Mas há um político que recusa render-se: chama-se Passos Coelho

Um dos mitos da política nacional diz que em Portugal não há populismo. Não há Trump, não há Frente Nacional e não há Farage. Mas há o PCP, há o BE e há António Costa. Em Portugal, o populismo está no poder. O populismo não é uma ideologia política. É um modo de fazer política. Há populismos de direita e de esquerda. Também não é exclusivo de forças radicais e extremistas. Há partidos ideologicamente moderados que fazem política de um modo populista, como por exemplo o atual PS em Portugal.

Os populismos crescem quando há uma maioria suficiente de pessoas assustadas com o presente, inseguras em relação ao futuro e sem confiança no poder político para restituir a segurança perdida. Contextos sociais desta natureza elegeram Trump, votaram a favor da saída do Reino Unido da União Europeia e ajudam Marine Le Pen em França. Em Portugal, o resgate financeiro assustou os portugueses, os quais se tornaram inseguros em relação ao futuro. Em 2015, o PSD e o CDS não conseguiram convencer a maioria dos portugueses que seriam capazes de restituir a segurança perdida. Foi nesta combinação de medo e de insegurança que a geringonça chegou ao poder. E com a necessidade de ultrapassar uma derrota eleitoral do PS e de justificar uma coligação parlamentar que havia sido escondida dos portugueses. Seria necessário ganhar popularidade.

Há traços distintos no modo de fazer política populista. Antes de mais, os partidos populistas, apesar de serem minoritários, falam sempre em nome do “povo”. O PCP e o BE nunca ganham eleições, raramente passam a barreira dos 10% dos votos, mas falam e portam-se como se tivessem o apoio da maioria dos portugueses. Para ultrapassar o problema das votações fracas, recorrem a argumentos populistas, apresentando o povo como vítima de elites “corruptas” ou “egoístas”, como a “banca” ou os “sectores financeiros”. Ou, argumento semelhante, o povo é vítima de poderes estrangeiros, no caso, para o PCP e para o BE, a União Europeia, o Euro, a Alemanha ou os países do Norte. O discurso populista do PCP e do BE sobre o Euro ou sobre a globalização é idêntico ao da Frente Nacional. No essencial, nada os separa. E o governo socialista vai muitas vezes atrás da tentação populista/nacionalista. A figura do Secretário de Estado Ricardo Mourinho a representar um papel perante as câmeras na conversa em Bruxelas com o presidente do Euro grupo, D…, foi um exemplo triste dos piores instintos populistas.

A defesa do povo contra elites corruptas (no discurso do Podemos, “as castas”) ou contra a ameaça externa, procura restituir a segurança aos cidadãos em tempos de crise. Mas não chega. Também é necessário prometer que se resolve todos os problemas que causam insegurança. O BE garante que terminaria com a precariedade se algum dia chegasse ao poder. Alguém acredita que alguma vez um governo poderia acabar com a precariedade? Cada vez mais, a vida profissional é incerta e precária. Em Portugal e em qualquer outro país do mundo. Os populistas também fazem promessas que sabem muito bem que nunca poderiam cumprir se chegassem ao poder. O PCP e o BE sabem muito bem que nunca poderiam “nacionalizar a banca”, a não ser que retirassem Portugal do Euro. Mas nunca explicam os custos da saída do Euro nem o modo como o fariam. Um bom exemplo do populismo irresponsável de quem sabe que muito dificilmente chegará o governo.

Mas não se julgue que, na apresentação da realidade, o PS está imune ao populismo. O PS leu as eleições de outubro de 2015 do seguinte modo: depois do que aconteceu entre 2011 e 2015, cerca de 60% da população portuguesa não confia no PSD e no CDS para restituir a segurança e a confiança em relação ao futuro. Compete ao governo socialista fazê-lo. Obviamente, é positivo garantir segurança económica e social aos cidadãos, tal como restituir-lhes a esperança para o futuro. O problema é fazê-lo através da construção de uma “realidade” que não corresponde à realidade, mentindo aos portugueses. Depois de um ano em São Bento, António Costa sabe muito bem que a “austeridade” entre 2011 e 2015 foi o preço a pagar pelos erros cometidos por um governo do seu partido e necessária para continuar no Euro. Por isso, fez tudo, incluindo a redução do investimento público, para cumprir as regras do défice.

António Costa também sabe que as famosas “restituições de privilégios” foram possíveis por causa da compra de dívida pelo Banco Central Europeu. Não é mérito do seu governo, não resulta de políticas públicas, nem da criação de mais riqueza. É fruto do contexto favorável da zona Euro. O governo culpa o antigo governo pela austeridade e quer convencer os portugueses que a vida voltou ao normal pré-2011. Sabe muito bem que nada disto é verdade. Serve apenas para ganhar popularidade e, se possível, eleições antecipadas. A geringonça não passa de uma coligação de populismos que gere o tempo, manipula a comunicação e anestesia os portugueses. Mas a anestesia é uma falsa segurança.

Muitos em Portugal gostam de dizer que não há populismo no nosso país. É falso. Temos um governo populista, apoiado por partidos populistas. Há na verdade um político em Portugal que recusa a rendição ao populismo. Chama-se Passos Coelho. É, por isso, tão detestado pelos partidos populistas.
Título e Texto: João Marques de Almeida, Observador, 10-4-2017

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