segunda-feira, 11 de dezembro de 2017

[Língua Portuguesa] O advérbio “só” obriga próclise (pronome antes do verbo)

dicionarioegramatica.com

Já falamos (aqui e aqui) daquele que deve ser o mais feio dos erros de português: as ênclises (pronome átono depois do verbo, como em “torna-se”) erradas, cometidas por brasileiros que, tentando parecer chiques e usar uma colocação típica do português de Portugal, acabam metendo o pronome após o verbo em casos em que todos os portugueses usam o pronome antes do verbo (“se torna”, como todo brasileiro), porque a gramática obriga a próclise nesses casos.

No português brasileiro oral, praticamente só ocorre uma única colocação espontânea: o pronome antes do verbo (o que se chama próclise): eu me chamo; me diz uma coisaeu te disse.

Já no português de Portugal de hoje (nem sempre foi assim), ocorrem, em aproximadamente metade dos casos, ênclises – isto é, o pronome depois do verbo: eu chamo-mediz-me uma coisaeu disse-te. Mas em cerca de metade dos casos – quando há na frase, antes do verbo, qualquer uma de uma série de palavras que “atraem” o verbo, como conjunções como a palavra “que” ou advérbios como “também” -, os portugueses também usam, obrigatoriamente nesses casos, a próclise: “Não me diga; Eu também me chamo RobertoO que eu te disse foi que não“. Exatamente como os brasileiros.

E são tantos esses casos em que há, na frase, alguma palavra que obriga o pronome a vir antes do verbo, que na prática aproximadamente metade das frases escritas ou ditas por um português usa a próclise – o pronome antes do verbo. Nesses casos todos, a gramática diz que é errado usar a ênclise. É um erro horrível, portanto, escrever ou dizer coisas como *Não diga-me; *Eu também chamo-me; *o que eu disse-lhe.

São erros especialmente feios porque conseguem ao mesmo tempo violar a gramática tradicional, do português de Portugal, e também o português brasileiro oral. Em resumo, são erros feios que só ocorrem quando alguém tenta artificialmente falar “difícil” – e falha.

Um caso desses acaba de ser publicado no jornal O Estado de S. Paulo:

Advérbios como “só” obrigam que o pronome venha antes do verbo. Todo português, culto ou inculto, escreveria e diria “só se tornou”. Todo brasileiro naturalmente também diria, corretamente, “só se tornou”. Mas o jornalista, querendo escrever de maneira “chique”, acabou cometendo um erro de português.

E mais: palavras como “que”, “onde”, “quando” e os advérbios que obrigam próclise (“só”, “também”, …) continuam a obrigar próclise mesmo que haja outras palavras entre a palavra atrativa e o pronome.

Ou seja, mesmo no caso abaixo, extraído da Folha de S. Paulo, a colocação está absolutamente errada. A única forma correta, tanto em Portugal quanto no Brasil, nos dois casos, continuaria sendo “se tornou”:


Nessa frase da Folha de S.Paulo, aliás, o erro é duplo: o “se” deveria vir obrigatoriamente antes do verbo não apenas por causa da palavra “só”, mas também por causa do “que” – palavra que, como já vimos, obriga a próclise.

Pode surpreender muitos brasileiros, que foram mal ensinados na escola, que mesmo havendo vírgula logo antes do verbo, mesmo com uma oração inteira intercalada, o pronome continua devendo vir antes do verbo em casos como este:

Até hoje ele não sabe que o filho, contra todas as expectativas, se divorciou logo depois do casamento.

Sim; apesar de a maioria dos brasileiros cultos e que se creem “bons de português” acreditar que, depois de vírgula, sempre se pode (ou se deve) usar a ênclise, não. Foram mal ensinados na escola. Mesmo em casos como o acima, com uma oração intercalada por duas vírgulas, aquele “que” continua obrigando que o “se” venha antes de “divorciou”. Nada de “divorciou-se”, portanto.

Em outras palavras: na dúvida, é só não inventar: deixe o pronome antes do verbo, como lhe seria natural – “se divorciou“, “se arrependeram“, etc.

E esse erro – esse uso de ênclises erradas quando a norma culta obriga a próclise – é, aliás, muito comum na Folha de S. Paulo, como se vê nos exemplos abaixo, todos tirados do jornal – e todos absolutamente errados de acordo com a norma culta da língua:

Quem sabe – se a consultora linguística da Folha parasse de se preocupar em policiar se os jornalistas estão seguindo sua instrução de usar um acento desusado e ridículo em triplex, quem sabe aí, talvez, poderia começar a se preocupar com esse erro de português de verdade, que parece passar batido quase diariamente nesse jornal.
Título, Imagens e Texto: dicionarioegramatica.com

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