O presidente dos EUA veio ao mundo para
assumir os pecados da humanidade. Ele é culpado, agora, de ameaçar a Coreia com
a bomba atômica
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O presidente dos Estados
Unidos, Donald Trump, durante reunião sobre a reforma das Nações Unidas na sede
da ONU em Nova York - 18/9/2017. Foto: Brendan Mcdermid/Reuters
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J.R. Guzzo
É curioso. Até alguns dias
atrás, qualquer pessoa com a sua atividade cerebral razoavelmente em ordem
seria capaz de jurar que quem ameaçava os inimigos, os vizinhos ou o resto do
mundo com um ataque nuclear era a Coreia do Norte. Disparou um míssil que
sobrevoou o Japão – e se passou de um lado para outro, poderia muito bem cair
dentro. O foguete não era um buscapé; era uma bomba atômica. Antes disso, o
ditador coreano, indivíduo até agora considerado realmente capaz de detonar
armas nucleares de ataque, ameaçou sabe-se lá quantas vezes bombardear os
Estados Unidos e quem mais lhe desse na telha. Faz isso há meses, aliás. De
repente, vai se ver o noticiário e ficamos informados que quem ameaça a Coreia,
e possivelmente o resto da humanidade, é Donald Trump – sim, ele mesmo, o
presidente dos Estados Unidos. O que houve com “a narrativa”, como qualquer
mané adora dizer hoje, a respeito de qualquer coisa? Houve que Trump anunciou o
seguinte: a Coreia do Norte será “destruída totalmente” se jogar uma bomba
atômica no país que ele preside.
Ninguém é a favor de um horror
desses, é claro – a não ser o próprio ditador da Coreia, caso se acredite no
que ele diz. Mas a ameaça passou a ser Trump. O perigo agora é ele. Quem põe em
risco a paz mundial é ele. O governante irresponsável é ele. O maluco beleza é
ele. Tudo é ele. E o outro? Parece que já não vale mais. Não é “à ganha”; é “à
brinca”. Deve ser só o gordinho sinistro dos gibis. No fundo, ele não quer
fazer mal a ninguém, coitado. Problema, mesmo, é esse Trump. Daqui a pouco, a
continuar assim, teremos a CNBB, as classes artísticas brasileiras e os
militantes dos direitos humanos lançando manifestos em solidariedade ao povo da
Coreia e exigindo um boicote mundial contra os Estados Unidos.
É possível que tudo isso só
exista na mídia, ou muito mais na mídia do que na realidade, como foi com o
“bug do milênio”, o fim das reservas de petróleo e o colapso do capitalismo por
causa da Grécia. Falam, falam, falam e no fim acaba não acontecendo nada. A
bomba atômica só foi usada uma vez na história mundial, em duas explosões
separadas 72 anos atrás. Não quer dizer que não possa ser jogada de novo, mas
seria bom admitir que nesse meio tempo houve uma guerra fria inteira, uma
guerra no Vietnã, várias guerras do Oriente Médio, etc. – ou seja, não se sai
por aí jogando bomba atômica nos outros como se vai na farmácia comprar um melhoral.
Mas é justamente para não ter
o trabalho de pensar que tanta gente, cada vez mais, recorre à ajuda de Trump.
O que seria do mundo se não houvesse aí um Trump, disponível 24 horas por dia,
para levar a culpa de tudo? Nada mais cômodo, em momentos de incerteza real ou
imaginária, do que acusar alguém e dar o problema por resolvido. Donald Trump é
o grande Judas multiuso que o mundo tem hoje.
Título e Texto: J. R. Guzzo, VEJA, 20-92017
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