Henrique Pereira dos Santos
Há quem tenha tido uma grande
comoção com a indicação de Francisco Louçã [foto] para o Conselho de Estado e, agora,
para o Banco de Portugal.
Francamente não me parece que
faça muita diferença face aos que estão nestes órgãos, cuja utilidade não sei
avaliar, espanto-me é que Louçã aceite legitimar o poder da burguesia e ser um
serventuário do capitalismo, mas isso é lá com ele.
Vale a pena perder um minuto a
discutir por que razão esta nomeação é ilustrativa de um processo de escolha e
decisão que deveria ser mais bem ponderado e, para isso, é muito útil ouvir o
comentário político de Louçã sobre as offshores e Paulo Núncio.
Questionado sobre o assunto, e
sabendo que não poderia dar importância material ao que se passou sem pôr em
causa a sua reputação académica (Louçã dificilmente cometeria o erro de falar
em fuga maciça aos impostos sabendo da baixa probabilidade de ser isso que está
em causa), refugia-se primeiro numas generalidades sobre a necessidade de
cumprir as regras com que toda a gente está de acordo (esta costela
institucionalista de Louçã tem vindo a manifestar-se muito desde que a
geringonça chegou ao poder, e ainda bem) e depois atira-se à verdadeira manobra
de diversão: sem nunca acusar diretamente, descreve o percurso de Paulo Núncio
antes de chegar ao governo, relacionando-o com offshores, e depois ligando-o a
decisões que teriam matado o processo dos submarinos.
Sem nunca explicar qual é a
relação do que diz com o assunto sobre que é questionado, insinua que Paulo
Núncio estava no governo para fazer fretes aos interesses económicos, de uma
forma que roça a difamação (sem nunca passar formalmente essa linha).
Louçã é exímio nesta arte de
difamar terceiros sem nunca o fazer explicitamente, é um verdadeiro génio da
insinuação.
Uma frase define tudo: quando
fala da transferência da OI, na sequência da venda da PT, quem ele refere não é
quem faz a transferência, o vendedor, mas sim a Altice, que não tem nada com o
assunto para além de ser o comprador que pagou o dinheiro depois transferido
pela OI. Não é um acaso, é um alinhamento com a agenda política de Louçã para
quem dá mais jeito chamar à colação a Altice (os abutres que compraram a PT)
que a OI, peça central de um obscuro negócio feito no tempo de um governo de
esquerda.
A mim fez-me lembrar uma
resposta de Louçã, quando falava da sua vida privada e, não querendo
apresentar-se como um patrão que explora trabalhadores domésticos, se referia à
sua mulher a dias (empregada, criada, seja qual for o termo a usar, não lhe
dava muito jeito) como sendo "a senhora que ajuda lá em casa".
Imagino o charivari que Louçã faria se algum patrão se referisse aos operários
da sua empresa como "os senhores que ajudam lá na fábrica", mas
adiante.
A questão de fundo consiste em
nos perguntarmos qual é a utilidade em ter conselhos consultivos para os quais
não convidamos pensadores, isto é, pessoas realmente livres que em cada momento
dizem o que pensam da realidade concreta sobre a qual é preciso decidir, mas
sim manipuladores que em cada momento apenas dizem o que entendem que é útil
para fazer avançar a sua agenda política.
Título e Texto: Henrique Pereira dos Santos, Corta-fitas,
25-2-2017
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