Quem nesta vida não carrega sua cruz? Não há por onde
correr para fugir das contrariedades que a vida nos impõe. É claro, todos
procuramos refúgio onde possamos minimizar os infortúnios da vida. Mas, quem
sabe os percalços da vida não nos ensejam ainda mais vida? Já imaginaram em que
situação estaríamos se tudo estivesse num marasmo pacífico, sem contratempo
algum? O que seria de nós sem luta, sem confrontos, sem desafios a vencer?
Sim, a vida não nos oferece moleza; já nascemos berrando
de incômodo ao dar o primeiro suspiro; o último suspiro de nossas vidas também
será de agonia; ninguém escapa da temporalidade angustiante que nos finitiza;
somos jogados neste mundo de sofrimentos, embora seja o melhor dos mundos
criado por Deus, segundo o filósofo Leibniz.
Mas não é o mesmo pensamento do filósofo Schopenhauer que
diria: este mundo é cheio de misérias, “melhor não ter nascido, mas já que
nascemos, melhor morrer cedo, pois viver é sofrer”. Entretanto, tal pessimismo
de Schopenhauer nos tapa os olhos e não enxergarmos a frutificação benfazeja no
sofrimento; temos a possibilidade, pelo sofrimento, da colheita de frutos que
nos alimentam de energia e poder para transformar as vicissitudes em momentos
felizes e poder ver o lado formoso e luminoso da vida; a vida, pois, não deve
ser sinônimo de decepções àqueles que querem e gostam de lutar e se negam em
permanecer na escuridão.
Vida é vontade transformadora; e se essa vontade esbarra
em obstáculos não quer dizer que a vida seja um fracasso. Toda transformação
implica resistência. Embora Schopenhauer tenha a vontade como o elã da vida que
a tudo perpassa, enfatizou-a negativamente como causa de sofrimento, uma vez
que desperta no ser humano, como ele diz, desejos que nunca são satisfeitos a
pleno: tão logo se alcança o objeto desejado, outro desejo se apresenta e,
assim, sucessivamente, infligindo preocupações e sofrimento. A saída que
Schopenhauer nos oferece é a aniquilação da vontade ao molde budista e acabar
com os desejos; simplesmente, não querer o querer e, assim, libertar-nos dos
sofrimentos que angustiam a alma.
Outro filósofo, Nietzsche, embora tenha sido influenciado
por Schopenhauer, direcionou sua filosofia para outro caminho; deu ao conceito
de vontade outro enfoque: vontade é
vontade de poder, é o esforço de ser mais que um simples mortal, ultrapassar
sua condição humana, conduzir-se acima do bem e do mal. A vontade de poder é a
força que faz da vida sofrida a arma com a qual o ser humano possa se superar e
se colocar como Übermensch, além do demasiado humano.
Se Nietzsche combateu a moral cristã por tornar o ser
humano um fracassado, tem, no entanto, em Jesus Cristo o modelo de super-homem,
um modelo de homem em que está patente em seu íntimo essa vontade de poder que
supera a corrompida condição humana, dependente de uma moralidade.
Cristo, segundo Nietzsche, conduziu sua vida acima do bem
e do mal e não teve intenção de fundar religião moralizante alguma; o
cristianismo surgiu com seus seguidores - Paulo o mais importante - de difundir
uma suposta moral de Cristo. Diz Nietzsche: “Na verdade, o único cristão morreu
na cruz... Este ‘alegre mensageiro’ morreu como viveu, como ensinara – não para
redimir os homens, mas para mostrar como se deve viver. A prática foi o que ele
deixou à Humanidade: a sua conduta perante os juízes, perante os verdugos,
perante os acusadores e perante toda a espécie de calúnia e ultraje – o seu
comportamento na cruz... Não se defender, não se encolerizar, não
responsabilizar... mas também não resistir ao mal, ao sofrimento – amá-lo”.
Eis, pois, o símbolo da cruz: nossa vida no traçado
horizontal, representando nossos sofrimentos neste mundo, pode ser direcionada
verticalmente e, assim, vislumbrar outra realidade... além do bem e do mal. É
esta passagem (páscoa) que a cruz nos propõe: a vontade de superar-nos como
humanos e deificar-nos ou ressuscitar como Cristo o fez...
Título e Texto: Valdemar
Habitzreuter, 8-4-2017
Colunas anteriores:
Nietzsche sempre ele, e mais alguns conhecidos mas não tão ilustres
ResponderExcluirpassaram a vida sem " passar " pelo que nós passamos por exemplo em 10 anos de verdadeiro Holocausto. Assim como Marx que nunca fez nada na vida a não ser explorar a mulher e deixar morrer os filho por inanição.
São exemplos pobres para a nossa geração que lutou pela vida o quíntuplo do tempo que eles passaram apenas " filosofando ". Era um pessimista sem saber porquê. Isso não lhe tira o valor como escritor, mas acaba ficando chato ao longo da vida. Que o diga Lou Salomé
José Manuel