Henrique Raposo
É sempre cómica a forma como o
jornalismo português transforma um fascista vermelho num grande democrata.
Ontem, uma jornalista até disse que "Cunhal sempre lutou
por um partido livre e transparente". Um sujeito ouve isto e fica a pensar
"mas ainda há células do PCP nas redações?". Meus amigos, Cunhal
lutou toda a sua vida contra a democracia. Cunhal tinha uma concepção
totalitária da política: só compreendia a linguagem da força, só aceitava um
regime de partido único (o dele) e toda a sociedade, dos romances aos tampos
das sanitas, tinha de obedecer a um plano central (o de Moscovo). Por outras
palavras, Cunhal era fascista.
Antes de 1974, Cunhal fez a
vida negra às oposições democráticas, porque o PCP não queria uma transição
para a democracia. É ler Norton de Matos, Eduardo Lourenço, Sophia, Sousa
Tavares, Alçada Baptista, Bénard, Cunha Leal. Todas estas figuras contestaram,
ao mesmo tempo, Salazar e Cunhal. Nos anos 50, Cunha Leal e Norton de Matos
afirmaram que Cunhal era pior do que Salazar. No final dos anos 60, Eduardo
Lourenço declarou que a oposição democrática não podia dançar o tango com a
oposição autoritária (o PCP), porque Cunhal era uma fotocópia de Salazar. Moral
da história? Durante o Estado Novo, o grande alvo do PCP não foi Salazar, mas a
restante oposição. Daí nasceu esta guerra civil entre as esquerdas
(tornada explícita em 1975) e a ditadura intelectual do PCP junto dos meios jornalísticos e intelectuais. Algo que ainda perdura em reportagens que cantam loas a
Cunhal em 2012.
Depois do 25 de Abril, Cunhal
continuou a lutar contra a democracia. Em actos e palavras, Cunhal foi claro:
Portugal não podia caminhar no sentido democrático. É por isso que o líder do
PCP sempre desprezou os actos eleitorais. Cunhal passava a vida a dizer que a
sua "maioria política" era mais importante do que as "maiorias
aritméticas" das urnas. Ou seja, a violência da rua e dos militares do
PCP eram mais importantes do que o respeito pelos processos democráticos.
Em 2012, os jornais e TV estão cheias de pessoas a dizer que "ora, ora,
com tanta manif na rua, o governo perdeu a legitimidade e deve cair". O
fascismo de Cunhal continua vivinho da silva.
Título e Texto: Henrique
Raposo, Expresso,
03-12-2012
PS: para quem desejar rir-se um pouco, aconselho a leitura do
panegírico de São José de Almeida no Público
de hoje. No Avante não haverá artigo de
opinião mais favorável ao PCP do que esse.
Nuno Gouveia
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