Escrevi ontem um post em que aponto o crescente movimento de
demonização da política e da divergência que está em curso nas próprias
democracias ocidentais, com especial ênfase na América Latina. Alguns grupos
que se apresentam como donos da “boa opinião” e monopolistas da racionalidade
pretendem que determinadas posições representem não uma escolha ideológica, com
seria a de seus adversários, mas a expressão máxima do humanismo. Logo, para
eles, combater os adversários é uma obrigação ética dos que lutam pelo
progressismo. Quando, no entanto, seus adversários os combatem, bem, nesse
caso, o que se tem é uma agressão à civilização e aos direitos humanos. Nesse
mesmo texto, expliquei por que Barack Obama simboliza a contaminação da
política americana pelas piores práticas ainda vigentes no Terceiro Mundo (ou,
se quiserem, em países com déficit democrático, Brasil incluído).
A despeito daquela casca de
civilidade, Obama, como todos os ícones dos politicamente corretos, pode ser
notavelmente intolerante — ou incentivar a intolerância. Observem: posso até
achar, e acho, que a ala mais dura do Partido Republicano erra ao impor
condição tão dura para aprovar a elevação do teto da dívida. Mas daí a
demonizar a política, tentar jogar a opinião pública contra o partido e ainda
se entregar a digressões sobre o comportamento dos mercados, como fez o
presidente americano nesta quarta, vai uma grande diferença.
Leiam o que informa a
VEJA.com.
Volto em seguida.
Em entrevista à rede de televisão norte-americana CNBC na tarde desta quarta-feira, o presidente dos Estados Unidos Barack Obama afirmou que Wall Street precisa estar “verdadeiramente preocupada” com o que está acontecendo em Washington. “Quando se tem uma situação em que uma facção está disposta a colocar o país em default, é porque estamos com problemas”, disse Obama.
Na entrevista, o presidente
disse estar “exasperado” com o Tea Party, a ala conservadora do Partido
Republicano, afirmando que a hostilidade desse grupo afeta não somente o
funcionamento do governo, mas a saúde da economia. “Estou exasperado com a
ideia de que, a não ser que eu diga a 20 milhões de pessoas que elas não
poderão ter plano de saúde, eles (os republicanos) não vão colocar fim à
paralisação. Isso é irresponsável”, disse o presidente.
Obama também criticou a
difícil tarefa de manter a governabilidade num cenário de completo impasse
entre os dois partidos. “Se isso virar um hábito, nenhum presidente que vier
depois de mim será capaz de governar com eficiência”, afirmou. “Sei que o povo
norte-americano, e acredito que as empresas também, estão cansadas dessa
governança de crise a crise. Será ainda pior se nos colocarem em default pela
primeira vez na história”, disse o presidente, referindo-se à possibilidade de
calote de suas obrigações com os juros da dívida, caso o estado fique sem
recursos para pagar os investidores de títulos públicos.
Obama também se disse irritado
com o fato de os republicanos terem se recusado a retirar demandas que levaram
o governo à paralisação. “Estou irritado? Absolutamente irritado”, disse ele,
acrescentando que a paralisação foi totalmente desnecessária. Apesar de dizer
que não toma decisões baseadas na performance do mercado de ações, o presidente
frisou que o atual impasse pode ter grande impacto nas empresas. A afirmação
feita pelo presidente em entrevista ao vivo é percebida claramente como uma
jogada política para pressionar os republicanos a ceder, por meio da pressão
dos mercados.
(…)
(…)
Voltei
Obama é presidente dos Estados Unidos da América, não um deputado radical da esquerda democrata, que precisa nivelar a sua retórica com algum representante mais entusiasmado do Tea Party. Aonde pretende chegar assim? Ao evocar a estabilidade dos mercados, mexe com coisa muito perigosa.
Obama é presidente dos Estados Unidos da América, não um deputado radical da esquerda democrata, que precisa nivelar a sua retórica com algum representante mais entusiasmado do Tea Party. Aonde pretende chegar assim? Ao evocar a estabilidade dos mercados, mexe com coisa muito perigosa.
É evidente que ele não tem de
ficar contente com o que está em curso, mas, na sua posição, precisa é abrir as
portas da negociação. Nas democracias em que parlamentares não são comprados e
vendidos no mercadão, a exemplo do que se passa no Brasil, o voto é o
instrumento de que dispõe o eleito para negociar saídas que são de natureza
política. Os radicais do Partido Republicano podem, claro, ser acusados de
atuar na base do “ou dá ou desse”. Mas convenham: nos embates políticos, só se
pode agir dessa maneira quando o outro lado também fala essa linguagem.
O que me incomoda no
noticiário, especialmente o brasileiro e, claro!, o da ala democrata da
imprensa americana, é a impressão de que Obama é um exímio negociador,
eventualmente perturbado por extremistas de direita. Qualquer pessoa com um
mínimo de apreço pela história e pela lógica haveria de se perguntar por que,
então, a oposição ao presidente caminhou para o extremo. Seria pela habilidade
de Obama na negociação? Ora…
Título e Texto: Reinaldo Azevedo, 03-10-2013
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