Nuno Saraiva
Já lá vão 11 dias e Portugal
continua à espera. Hoje, e apesar de as eleições terem determinado que a PAF
ganhou, ninguém arrisca apostar em quem será o próximo primeiro-ministro. E, na
verdade, não devia ser assim.
É facto que PSD e CDS perderam
700 mil votos e com eles a maioria absoluta. É verdadeiro que o quadro
parlamentar mudou e, por isso, as esquerdas todas somadas dispõem de mais
deputados na Assembleia da República do que a direita.
E é real que ninguém contava
com um António Costa tão hiperativo a vender cara a derrota que lhe foi
infligida. Porém, quem ande na rua e oiça a voz do país real descobre
facilmente que a perceção dominante é apenas uma: Pedro Passos Coelho ganhou e
por isso deve ter oportunidade de formar governo.
Tudo o que saia fora desta
paisagem é lido como golpada. Sabemos todos que, certamente imbuído de boas
intenções mas de forma precipitada, o Presidente da República quis atalhar
caminho e encarregou o presidente do PSD de arranjar condições que assegurem um
governo "estável e duradouro", atribuindo-lhe um caderno de encargos
que assenta no respeito pelos compromissos internacionais.
Cavaco, que dias antes das
eleições disse que sabia muito bem o que iria fazer a seguir, está afinal em
palpos de aranha e fez má gestão política de um processo que não pode ter
atropelos aos formalismos da democracia. Sim, eles existem e devem ser
respeitados. O que o Presidente devia ter feito era esperar pela publicação dos
resultados e só nessa altura convocar os partidos para os ouvir e dar início
formal a negociações. Teria assim evitado que o país assistisse ao exotismo de
um líder perdedor a comportar-se como se fosse primeiro-ministro indigitado.
Importa pois que o país entenda e aceite o que tem pela frente. E, para que
isso aconteça, não podem queimar-se etapas.
Cavaco Silva deve respeitar a
tradição, mesmo não sendo esta Constituição, e indigitar Passos Coelho
primeiro-ministro. O líder do PSD deve ter a possibilidade de formar governo e
submeter-se à Assembleia da República. E se até lá não houver um acordo que
permita a viabilização do governo, deve então apontar-se a um plano B de acordo
com a maioria que for possível constituir.
Transformar o plano B em plano
A, como alguns pretendem, atropelando a opção natural, seria passar para o país
real a perceção de que o governo, como diz hoje Carlos Blanco de Morais no DN,
é uma aliança de derrotados. Não está em causa a legitimidade política ou
constitucional desta solução. É tão-só garantir que não ficam dúvidas sobre a
legitimidade eleitoral. Porque se o país quisesse que António Costa fosse
primeiro-ministro à primeira tinha votado no PS, mais do que votou na coligação
PAF.
Título e Texto: Nuno Saraiva, Diário de Notícias, 16-10-2015
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