terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Não me apanham. Nem morto

Rodrigo Moita de Deus

Cemitério dos Prazeres, Lisboa, foto: Evelyn Kahn

O imposto sucessório vai voltar. Pode não ser este ano. Mas o imposto necrófago vai voltar. Vai voltar num misto de necessidade de receitas com afirmação ideológica. E a segunda é quase tão perigosa como a primeira. Choca-me mais isto que qualquer outra coisa que possam fazer.

Podemos discutir a legitimidade da coisa.

Ao longo da vida de um cidadão o Estado tributa-lhe o rendimento, tributa-lhe as transações e tributa-lhe o património. Mesmo que este último não gere riqueza. O património, só por existir, é tributado. Vai daí que o imposto sucessório seja uma dupla tributação – como outras que existem. Exceto se o estado considerar que a minha morte é uma transação voluntária de bens. Provavelmente considera.

Podemos discutir a necessidade da coisa. O Estado confisca aos mortos porque geriu mal o dinheiro que os vivos lhe deram. Faz sentido. Faz ainda mais sentido porque os “ricos” são aqueles que mais mecanismos e preparação têm para garantir que não são confiscados. A começar pela opção de não investir em património e de manter o capital em países com um regime fiscal mais sensato. E nem é preciso grande criatividade para fugir ao imposto sucessório. O imposto sucessório é um imposto para distraídos.

Se não há legitimidade nem receita possível para que serve o imposto sucessório? Serve para afirmação ideológica. Para demagogia em programas de televisão. Sem que tenhamos a noção do custo que este tipo de medidas tem para o país.


Uns nascem ricos outros pobres? Isto é assim tão simples? E o papel do Estado é fazer com que todos sejam pobres? É a igualdade por baixo. Como se o confisco da riqueza alheia fosse placebo para a incapacidade de um país gerar riqueza per si. Não é. Não resolve. Pelo contrário. Os mesmos argumentos foram utilizados para o fim dos morgadios. Resultado: o país tem um centenário problema de escassez de capital. Solução: confiscar o capital que resta.

E se levarmos as palavras do cronista à letra então devíamos ilegalizar a herança como um todo e tudo por igual. O resultado era mais eficiente e não descriminávamos ninguém.

O tema até pode parecer pouco importante. É só mais um imposto. Mas não é. É uma espécie de estandarte para uma determinada maneira de pensar e de gerir a res pública. É a materialização legislativa de quem tem mais problemas com a riqueza de uns que com a pobreza dos outros. Em linguagem mais comum…inveja. E enquanto formos um país pequenino mais preocupado em olhar para a casa dos outros em vez de trabalharmos para construirmos a nossa própria casa podem inventar os impostos que quiseram que isto vai dar sempre buraco.

Venha daí o imposto sucessório. A mim não apanham. Nem morto.
Título e Texto: Rodrigo Moita de Deus, 31 da Armada, 1-12-2015

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