domingo, 20 de outubro de 2013

A “Aristocracia” socialista da China

Francisco Vianna
Mansões na “Côte d’Azur”, jatos particulares em hangares na África, carros esportivos de alto luxo, entre outros ítens, mostram a vida nababesca dos “executivos estatais” que formam a elite da minoria burguesa do politburo comunista de Pequim.

Ex-dirigente do Partido Comunista Chinês (PCC), Bo Xilai, durante seu julgamento por corrupção em Pequim. Foto: AFP

Tenho sido interpelado por alguns leitores que, ingenuamente, me replicam dizendo que estou errado quando falo em capitalismo de estado e de uma burguesia rica que compõe o politburo da maioria dos países ditos socialistas. “Como pode haver burguesia privilegiada num país que privilegia a classe proletária?”, retrucam, ingenuamente, esses leitores. “Aonde é que já se viu ‘capitalismo de estado’ num regime que é, ‘por natureza’, anticapitalista?”, dizem outros.
Poderia usar aqui os argumentos de Bakunin para acordar essa gente crente num socialismo que nunca existiu. Mas não preciso. Basta descrever o tipo de vida que os socialistas passam a levar uma vez que chegam ao poder.

Geralmente pessoas que não conseguem vencer, ou enriquecer, por seus próprios méritos ou iniciativas empresariais privadas, os socialistas vêm no Estado, antes de uma fonte de realização de tudo – como afirmam sempre – um meio de vida e de conseguir, com o dinheiro do povo, levar uma vida milionária, que de outro modo jamais conseguiriam ter.

Para se ter uma ideia aproximada do que afirmo, vamos fazer, a seguir, um rápido tour pela China, um país cujo regime político é o socialismo, mas que migra agora para um regime econômico que mistura o capitalismo estatal com o incipiente capitalismo privado, onde os chamados “executivos estatais vermelhos”, estabeleceram para si um padrão de vida só comparável aos dos principais capitalistas privados do mundo livre. 

Têm mansões na “Côte d’Azur”, no Mediterrâneo, jatinhos de luxo particulares para irem ao Kilimanjaro, “filhinhos de papai” estudando em universidades como a inglesa Oxford ou as americanas Harvard e Yale, conseguem entradas para as Copas do Mundo em camarotes exclusivos, têm à sua disposição carros esportivos de luxo e desfilam com estrelas do cinema americano como Jackie Chan.

O recente julgamento de Bo Xilai, o carismático gerentão do PCC, que acabou exagerando e sendo condenado à prisão perpétua por seus múltiplos e sistemáticos crimes de corrupção, revelou o ostentoso e nababesco estilo de vida da “aristocracia vermelha”, que floresceu graças ao capitalismo de estado – o mais selvagem e inoperante de todos – proliferado graças ao chamado “milagre econômico” chinês. Tal milagre só foi possível pela abertura da economia aos principais capitalistas privados do Ocidente – mormente estadunidenses – que foram para a China para lucrar como nunca com a mão de obra quase escrava proporcionada pelo sistema socialista do país, como ocorre em qualquer outro que o instale.

Filho de uma figura da revolução maoista, tornado herói, Bo Xilai se permitia ter um ‘futuro brilhante’, porque pertencia ao Politburo do Parido Único e se supunha que no ano passado entraria para a sua Comissão Permanente, que reúne os sete homens mais poderosos do regime. Todavia, poucos meses antes de passar a pertencer a essa “camarilha dos sete”, acabou sendo defenestrado como secretário do PCC em Chongqing, uma megalópole do sudoeste da  China nas cercanias de Yangtsé, tendo ‘caído em desgraça’ após uma luta pelo poder que continua em aberto.
O estopim do escândalo foi a morte, em novembro de 2011, de Neil Heywood, seu sócio britânico com o qual Gu Kailai, a esposa de Bo Xilai, tinha uma mansão em Cannes avaliada em 2,2 milhões de euros. Conforme as transcrições do julgamento difundidas pelo tribunal de Weibo, que supre na China o censurado Twitter, essa tão suntuosa propriedade foi um “presente” de Xu Ming, um empresário petroquímico que enriqueceu na década de 1990 embelezando a cidade de Dalian, onde Bo Xilai era prefeito.

Em troca de seus favores, o rico capitalista privado cobria de atenções a mulher de Bo e seu filho, Bo Guagua, a quem presenteou com um Segway  (um caríssimo veículo elétrico de duas rodas) e pagou por diversas férias passadas na África com mais cinco amigos e que custaram a bagatela de 100.000 euros, uma vez que voaram para lá num jatinho particular de Dubai à Tanzânia.

Bo Guagua trouxe de lá, para o seu pai, carne seca de uma valiosa espécie animal. Além de cobrir os gastos de 30 mil euros com seu cartão de crédito, o empresário assumiu para si os custos com outras passagens aéreas e estadas em hotéis de luxo da viagem que fez à China em março de 2011 uma delegação de 40 pessoas da Escola Kennedy de Harvard, onde o filho de Bo Xilai estudava. “Era conveniente pedir a Xu Ming que pagasse por todas essas coisas porque ele sempre o fazia e não o considerávamos uma pessoa estranha”, depôs em juízo Gu Kailai, a mulher do político.

Para que ninguém relacionasse a mansão no Mediterrâneo com seu “popular” marido, que fazia carreira como marqueteiro de campanhas “neomaoístas” em favor dos mais humildes, Gu Kailai a registrou em nome de uma empresa laranja inicialmente dirigida por um misterioso arquiteto francês, “amigo” da família, Patrick Devillers, e em seguida por Heywood.
Segundo relatou Devillers numa declaração lida em juízo, Heywood ameaçou Gu Kailai em revelar que ela possuía a mansão quando quis retirá-lo da empresa e, além disso, exigiu que ele calculasse o quanto tinha investido em suas “obras de reforma” de sua cidade de Dalian: 1,7 milhões de euros.

Temendo que Heywood sequestrasse e matasse seu filho por causa desta disputa monetária, Gu Kailai o envenenou em 14 de novembro de 2011 no quarto do hotel onde se hospedava em Chongqing, de acordo com a versão oficial, mantida pelo regime chinês, mais própria de uma rocambolesca novela de espionagem. Essa foi a confissão de Gu Kailai no julgamento de seu marido, em agosto do ano passado, da qual resultou a condenação à pena de morte. A sentença ficou suspensa por dois anos, e acabou se transformando em prisão perpétua.

CAPITALISTAS ESTATAIS VERMELHOS
A família Bo, longe de ser a única a ser agraciada pelo empresario Xu Ming, conforme o jornal americano The New York Times, ele chegou a sair com a filha do ex-primeiro ministro Wen Jiabao, inimigo declarado de Bo Xilai, e a ter negócios de diamantes com sua esposa e de seguros com outros parentes. Esse mesmo jornal também tornou público em outubro do ano passado que a família de Wen Jiabao entesoura mais de 2 bilhões de euros.

Essa descoberta gerou um escândalo semelhante ao suscitado em maio pela fortuna da neta de Mao Tsé Tung, Kong Dongmei, estimada em 600 milhões de euros. Embora esta ilustre descendente de Mao tenha fundado em 2001 uma biblioteca em Pequim que se dedica a promover os ideais comunistas do “Grande Timoneiro”, está muito longe de ser uma ‘revolucionária’. Conforme publicou a revista “Nova Fortuna”, ela chegou até a violar a “política do filho único” ao ter duas meninas e um menino com seu marido, um magnata proprietário de uma companhia de seguros, uma casa de leilões e um serviço de embalagens, com quem se casou depois de manter com ele relações extraconjugais durante quinze anos.
E, com base em Bloomberg, o patrimônio familiar do presidente chinês, Xi Jinping, ascende a 310 milhões de euros e a 18 por cento de uma empresa de minerais raros avaliada em 1,34 bilhões de euros. Tais cifras que parecem excessivas não só para quem continua se definindo como comunista, como deixa exposta a realidade de que todo o sistema é montado para tornar seus membros “aristocratas vermelhos” de uma pequena burguesia que vive nababescamente à custa do trabalho semiescravo do seu povo.

No Brasil, ainda não exista uma realidade desse tipo, o que vemos é o “sucialismo” tupiniquim (de socialismo de súcia, de quadrilheiros e ladrões do erário) a desenvolver um ensaio geral para quando se tornarem, de fato, um país socialista. Resta saber se o brasileiro irá ou não permitir que tal desgraça aconteça.
Título e Texto: Francisco Vianna, (da mídia internacional), 20-10-2013

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.

Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.

Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-