sexta-feira, 18 de outubro de 2013

A fuga dos escriturários

Jornal de Angola
Carl Kraus deu ao jornalismo textos elegantes, perfumados com talento e sarcasmo. Num dos seus famosos editoriais na revista “Die Fackel” ele queixava-se amargamente da falta de escriturários porque tinham ido todos a correr para as Redacções dos jornais. O génio do jornalismo independente não exagerava.

Pedro da Paixão Franco, o príncipe dos jornalistas angolanos, dizia que era muito difícil fazer progredir o jornalismo da época, porque da “metrópole” chegavam carradas de analfabetos que mal passavam o Equador eram logo transformados em jornalistas. E como ele sabia o que dizia e do que falava!
Hoje o mundo está quase na mesma. Viena de Áustria deixou de ser o centro do mundo da cultura e do pensamento. Ficou um vazio. E em Portugal surgiu um fenómeno notável e que merecia um estudo profundo. Depois do 25 de Abril de 1974 o analfabetismo foi sendo banido, de uma forma galopante. Até há pouco, ninguém conhecia o segredo de tão simpático sucesso. Só agora se compreende o que aconteceu. Os analfabetos foram todos a correr para o jornalismo. E como eles dão nas vistas!

Carl Kraus, visionário e futurista, não conseguiu prever este êxodo extraordinário. Pensava o mestre que era coisa do outro mundo encher jornais de escriturários. Faltou-lhe assistir à fuga dos analfabetos para a comunicação social portuguesa.
Houve tempo que os jornalistas só eram notícia quando morriam. Os órgãos de comunicação social respeitavam-se entre si. De vez em quando, citavam-se, com a devida vénia. Hoje em Portugal, esse princípio básico está a ser pura e simplesmente ignorado.

Um dia destes, a TVI apresentou num dos seus noticiários o Jornal de Angola como “a voz oficial do regime angolano”. Os analfabetos têm o seu quê de inimputáveis. Mas fica mal a profissionais do mesmo ofício entrarem por terrenos tão pantanosos. O Jornal de Angola é a voz dos seus leitores. E dos jornalistas que livremente escrevem nas suas páginas. Nada mais do que isso. Aqui não há vozes do dono nem propagandistas. Há jornalistas honrados que todos os dias tentam dar o melhor que podem e sabem para fazer chegar aos leitores os acontecimentos do dia.

Esta deslealdade entre órgãos de comunicação social, mesmo que de países diferentes, nada augura de bom. Eu posso dizer que a TVI é a voz oficial da dona Rosita dos espanhóis. Ou a voz oficial do conde Pais do Amaral, o desterro dos rapazinhos.
A TVI é a voz oficial de José Alberto Carvalho, que a jornalista Manuela Moura Guedes tratou por Zé Beto e apodou de burro. O canal de televisão é a voz oficial da segunda dama de Seara, inesperadamente apeada de primeira-dama de Sintra.

O Jornal de Angola tem um estatuto editorial que é seguido com rigor e sem hesitações. Se todos fizessem o mesmo, não assistíamos aos espectáculos deploráveis que vemos na TVI e noutros órgãos de comunicação social portugueses. Se o jornalismo português não estivesse atolado em fretes, se não fosse servido por analfabetos de pai e mãe, provavelmente hoje Portugal não estava a ser destruído pela Troika. E os portugueses não viviam angustiados por desconhecerem o dia de amanhã.

O Jornal de Angola é um órgão de comunicação social sério. E os seus jornalistas não foram recrutados entre analfabetos e escriturários. O que, parecendo que não, lhe dá uma certa superioridade entre os grandes jornais de língua portuguesa. Era bom que os nossos parceiros da CPLP olhassem para nós como somos e não através de lunetas desfocadas e com juízos pré concebidos.
Título e Texto: Jornal de Angola, 17-10-2013
Grifos: JP

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