Nuno Palma
O debate público, em Portugal,
é francamente infantil. Grande parte dos “comentadores” está mal informado,
limitam-se a fazer comentário que pouco mais são do que “conversas de café”.
O problema fundamental da
economia portuguesa é que esta não cresce há cerca de década e meia. Com
crescimento, o défice público seria sustentável, e não seriam necessárias as
tão detestadas políticas de austeridade – que vão continuar seja quem for que
estiver no governo.
Quase toda a gente concorda
que seria melhor para Portugal crescer. Parece-me haver completo acordo nesta
matéria entre os principais partidos, apesar de poderem existir divergências
sobre a melhor estratégia para gerar esse crescimento, ou sobre a forma de
distribuir os rendimentos daí resultantes.
Uma coisa, no entanto, é
certa: o que nós gostaríamos é que continuassem as taxas de crescimento que
tivemos entre os anos 1950 e 2000. Até meados do século XX, Portugal era um
país verdadeiramente pobre. Em 1950, tinha um rendimento médio por pessoa de
$2086, o que é inferior ao que Moçambique tem hoje ($2613 em 2010, ano dos últimos
dados disponíveis). Mas entre 1950 e 2000, a situação mudou radicalmente. O
rendimento anual por pessoa, em Portugal, aumentou 7 (sete!) vezes, em termos
reais, durante este período. Com as consequências positivas que seriam de
esperar – a mortalidade infantil caiu a pique, a esperança média de vida
aumentou, a qualidade da educação e especialmente o seu acesso também
aumentaram.
Hoje, Portugal é dos países
mais ricos do mundo. E não é apenas por fazer parte da OCDE. Contra factos não
há argumentos: está em 42º na lista do FMI e em 38º na lista do Banco Mundial,
num total de cerca de 200 países (2013 é o último ano disponível). E ainda se
sai melhor quando são considerados outros indicadores de bem-estar para além do
rendimento, como a liberdade pessoal ou a criminalidade. O ranking
multi-dimensional do Legatum Institute
coloca Portugal em 27º, apenas seis lugares atrás da França.
Mas na última década e meia as
coisas não têm corrido bem. Portugal não cresce, e isso quer dizer que, em
termos relativos, está a perder terreno em relação a grande parte do mundo, que
se encontra, geralmente, num processo de crescimento. Não podemos sair desta
situação sem um debate sério sobre algumas questões importantes:
a) quais foram as causas do
sucesso português entre 1950 e 2000,
b) quais são as causas da
paragem da economia desde então, e finalmente
c) o que podemos fazer para
mudar a situação no sentido de a melhorar.
Chamo a atenção para a
absoluta necessidade de não cairmos na tentação de darmos respostas simplistas,
do tipo “a culpa é dos políticos”, porque não são de todo satisfatórias.
No entanto, no debate público
não é isto que encontramos. O debate público, em Portugal, é francamente
infantil. Grande parte dos “comentadores” está mal informado, limitam-se a fazer
comentário que pouco mais são do que “conversas de café”, frequentemente
enviesadas pela ideologia de quem o faz – quando, na maior parte das vezes, até
existe literatura científica sobre o assunto que está a ser discutido, mesmo
que não garanta respostas simples e fáceis.
Portugal está parado desde
2000. Não é credível, por exemplo, argumentar que a culpa da crise foi o chumbo
do PEC IV, como fez recentemente um conhecido jornalista, ou que a fonte da crise foi a troika
ou as políticas de austeridade – elas próprias foram uma consequência, apesar
de terem contribuído para agravar uma crise que poderia ter sido mais suave.
Sem compreender o passado não
podemos compreender o presente, e em particular esta questão das “crises” de
curto prazo não nos pode tornar míopes em relação às origens históricas da
situação presente do país (muito anteriores a 2000), em termos tanto económicos
como políticos.
Título e Texto: Nuno Palma, Observador,
11-3-2016
Economista, especializado
em História Económica. Professor na Universidade de Groningen (Holanda).
Escreve no blog Portugal no Longo Prazo
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