Aparecido Raimundo de Souza
ESPECIALMENTE
ESCRITO PARA O DIA 8 DE ABRIL, ‘DIA DA FAMÍLIA’
“Todos os dias quando acordo não tenho
mais o tempo que passou”.
(‘Tempo
Perdido’, Renato Russo.)
De repente, a turma inteira partiu. Foi embora. Cada qual para um canto
diferente, longínquo. Como sempre, fiquei aqui na casa enorme e vazia.
Solitário, a alma combalida, sem rumo, sem esperança, entregue à sorte do
destino ingrato e espavorido.
Sei perfeitamente que nunca mais conseguirei reunir, embaixo do mesmo
teto, meu padrasto Jorge, minha mãe Ana, meus irmãos Cláudio, Rogério e André.
Tampouco a gritaria algazariante dos que aqui viveram em doce harmonia. Jamais
terei o doce e inebriante prazer de ouvir as suas vozes.
Eles por algum motivo inexplicável se afastaram. Foram sem dizer adeus.
Viajaram sem regresso, sem deixar recordações. Suas figuras se diluíram no ar,
como nuvens no firmamento, como o dia tragado pela noite escura.
O espaço aqui deixado engrandeceu demais diante deles, centuplicou como o
infinito aos olhos do astronauta, se agigantou como o mar a frente daquele que
pela primeira vez o contempla, medroso, e encolhido, temeroso de ser tragado
por suas ondas gigantes em procelosos movimentos. A solidão assoberbante e
densa os envolveu a todos. Cingiu, para sempre, na voragem do nunca mais.
Eu fiquei!
Como sempre, sobrou para mim, permanecer aqui assim, dessa forma,
solitário, a casa vazia. Contemplo os aposentos sem os móveis de ontem. Meus
passos ecoam na confusão de um cérebro com devaneios desordenados. Sem o
vínculo da ternura, do aconchego dos meus pares, algo estranho bate na minha
cabeça como uma espécie de látego martirizante.
Sei que jamais terei a oportunidade de me sentar ao redor da mesa enorme
da cozinha e ouvir, cada um dos familiares, comentar como foi o dia, as
andanças, alegrias e desventuras.
De igual forma, nunca mais ouvirei os gritos de mamãe, os berros do velho
Jorge, as gracinhas do mano Cláudio, as impertinências do irmão Rogério e a
fumaça enervante e insuportável dos cigarros do André. Nunca mais essas
pequenas banalidades voltarão a se juntar num só espaço, como antes, como até
bem poucos anos atrás.
Casa vazia – vazia casa, sem a esperança dos que aqui residiram. Alma
vazia – vazia alma, prisioneira, agora e para sempre, dessa morada grandiosa,
oca, destituída do amor maior, da esperança plena, e das afeições que enlevavam
e ajudavam a tornar tudo mais belo e colorido.
Vou viver... viver?! Talvez não seja esse o termo, a palavra certa. Estou
mais para morrer. Morrer de modo lento, penoso, em câmera lenta, morrer de
tédio, como a tristeza enfadonha e desgastante dessa dinastia desfeita.
Aliás, tenho a impressão de que vamos morrer. Morrer os dois, a casa e
eu, eu e a casa, da mesma enfermidade que corrói nossos espíritos, nossas
estruturas, desde a base até a mais alta das paredes.
Na verdade, não há o que discutir. Vamos, realmente, morrer. A casa e eu,
eu e a casa, juntos, unidos num abraço estranho, num desprazimento exagerado e
ingente, numa, enfim, insatisfação indescritível e, pior, na mais completa e
enervante solidão.
EXPLICAÇÃO FINAL:
Senhoras e senhores, há muito tempo NÃO TENHO MAIS A MINHA FAMÍLIA. Se vocês
ainda têm a de vocês, CONSERVEM. Lembrem dessa música. Letra comum, melodia
simples, todavia, de profundo sentimento em prol daqueles que muitas vezes
esquecemos, que vivem ao nosso lado e nada esperam, a não ser um pouquinho de
atenção, carinho e afeto.
Título e Texto: Aparecido
Raimundo de Souza, jornalista, de Carapicuíba Interior de São Paulo.
8-4-2017
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Parabéns por lembrar data tão importante.Um abraço.♥
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