segunda-feira, 17 de junho de 2013

E o povo negou Dilma três vezes no Mané Garrincha! O que isso quer e não quer dizer

Reinaldo Azevedo

Foto: Ricardo Matsukawa/Terra
 Neste sábado, antes do jogo, perto de 500 pessoas tentaram protestar contra o uso de dinheiro público na Copa do Mundo. Diziam que ele deveria ser direcionado para saúde e educação. Era uma manifestação pacífica, sem armas, sem lança-chamas, sem coquetéis molotov. Mesmo assim, a Polícia Militar do Distrito Federal, governado pelo PT, desceu o sarrafo na turma. Até quando escrevo, a OAB não deu um pio, o José Eduardo Cardozo não deu um pio. As sedizentes organizações de defesa dos direitos humanos não deram um pio. Quando o PT bate em alguém, certamente é por bons motivos, certo? Os que se manifestavam também expressaram seu apoio ao movimento contra a elevação de tarifas de ônibus Brasil afora. Dentro do estádio, o povo — ao menos aquele que foi ver o jogo entre as seleções do Brasil e do Japão — vaiou Dilma três vezes. É grande a tentação para juntar mal-estares “diferentes e combinados”, como diria o companheiro Trotsky, num único movimento. Se caímos nessa tentação, acabamos por obscurecer a realidade. Então tentarei fazer as distinções.
Começo pelas vaias a Dilma. É claro que existe um grande eleitorado que se opõe ao governo. O que tem faltado nesses 10 anos é oposição. Pirandello cuidou das seis personagens em busca de um autor. No Brasil, há milhões de eleitores em busca de quem os represente com clareza. E não encontram. As forças políticas que não aderiram ao governismo têm se mostrado tímidas; uma parcela, eleita para se opor, traiu o eleitor e se bandeou para o poder. O eleitorado que disse “não” ao PT tem motivos de sobra para se sentir pouco representado. Mas seu descontentamento continua.
Foto: AFP

Cumpre lembrar alguns números. Em 2010, havia 135,8 milhões de eleitores no país. No segundo turno, Dilma foi eleita com 55.752.529 votos, contra 43.711.388 do tucano José Serra. Percebam: apenas 41% dos brasileiros aptos a votar a escolheram. Os outros 59% preferiram a oposição, a abstenção ou o voto branco ou nulo. No primeiro turno, a petista obteve 47.651.434 votos. Ou por outra: apenas 35% do eleitorado a tinham como primeira opção. É claro que Dilma é uma presidente legítima, escolhida segundo as regras do jogo. Mas dava para perceber de saída que estava longe de constituir uma unanimidade. A política é que deveria ter se encarregado de manter mais ou menos mobilizada uma fatia que fosse daqueles que ativamente disseram “não” à candidata do PT. Isso não aconteceu, como sabemos.

É bobagem supor que o estádio inteiro vaiou Dilma e que não havia lá pessoas que apoiam o governo. É até possível que, fosse aquele o colégio eleitoral, ela ainda se sagrasse vitoriosa. Impossível saber. Uma coisa, no entanto, é certa: os que a reprovam — ou, ao menos, repudiam a exploração política de um evento esportivo — estavam lá em número suficiente para se fazer ouvir. Com certeza absoluta, a porcentagem de eleitores de oposição no Mané Garrincha é bem superior à de oposicionistas no Congresso. Pode-se inferir mais: a porcentagem de eleitores de oposição no Brasil como um todo é certamente maior do que a de parlamentares oposicionistas. Afinal, estamos lidando com um dado da história: pessoas eleitas para se opor acabaram virando casaca.
Por que estão descontentes? Há uma penca de razões: inflação, corrupção, ineficiência, restrições de natureza ideológica, que são legítimas, sei lá eu…

Agora os protestos
A vaia no estádio nos lembra que existem, sim, eleitores de oposição no país. E cumpre que não misturemos o descontentamento desse cidadão pacífico, pagador de impostos, trabalhador dedicado, com algumas manifestações de rua, degenerem ou não em violência. O movimento contra os gastos na Copa mistura algumas palavras de ordem que estão hoje na boca de partidos à esquerda do PT com outras que poderiam ser encampadas por pessoas comuns, orientadas apenas pela vergonha na cara: contra a roubalheira, por mais transparência etc. Mas o sotaque, é inequívoco, o coloca naquele tronco ideológico da cultura da reclamação, que acaba, no fim das contas, servindo à esquerda. Notem que o repúdio de muitos a Dilma não os impediu de assistir ao jogo. Ou por outra: o movimento que protesta contra os gastos com a Copa do Mundo não resultará, necessariamente, numa corrente de oposição à Dilma.

E o mesmo se diga sobre os baderneiros de classe média que decidiram botar fogo em algumas cidades brasileiras. O Movimento Passe Livre e partidecos de esquerda que lideram essa pantomima violenta podem até considerar adversários os petistas, mas, ATENÇÃO!, TRATA-SE DE DIVERGÊNCIAS no campo dito “progressista”. Num eventual segundo turno entre Dilma e um “candidato da direita” (como eles dizem lá em sua linguagem perturbada), já sabemos como se comportam os radicais: acabam voltando momentaneamente para a nave-mãe, o PT. Os que hoje pedem a redução da tarifa de ônibus em São Paulo — ou a sua gratuidade — exigem um partido mais radical, mais à esquerda, mais comprometido com o que chamam “lutas populares”.
Esses militantes não se misturam com aqueles eleitores de oposição que, percebam, são de oposição justamente porque repudiam parte da agenda petista. À diferença dos incendiários que estão nas ruas, o Brasil oposicionista (o do estádio, não necessariamente o do Congresso) quer mais ordem, não menos; quer mais respeito às leis, não menos; quer indivíduos mais independentes, não menos. Essas agendas não se misturam. Dado o ponto de vista que adoto, que é o de um liberal, as vaias no estádio e a luta pelo “passe livre” são manifestações que estão em polos distintos, antagônicos mesmo. As vaias traduzem um anseio, entendo, de “despetização” do país. O Passe Livre está aí a cobrar que o petismo seja ainda mais…petista!
Título e Texto: Reinaldo Azevedo

Relacionados:

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.

Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.

Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-