domingo, 2 de fevereiro de 2014

Empobrecimento ilícito

José Carlos Bolognese

Pintura a óleo de Froilan León Orozco
O título não é contraditório; é apenas o outro lado do enriquecimento ilegal. E nem é preciso que alguém enriqueça ilicitamente – o que sempre resulta no empobrecimento de outros; às vezes de muitos, milhares até. Basta que se  viva num país onde a certeza jurídica que se pode ter, é a certeza da insegurança jurídica. Um contrato – documento levado a sério em países sérios – no Brasil tem a garantia, a validade e a legitimidade do poder econômico e de influência política de um lado, e toda a fragilidade e insegurança do outro. O que significa que para o lado frágil, armado unicamente da confiança nas leis e nas instituições da república, o contrato tenha, por óbvio, que ser respeitado geralmente antes de lhe trazer algum benefício… mas sem nenhuma garantia de que será honrado, como é o nosso caso, de aposentados Varig/Aerus.

Durante a fase de contribuições e pagamentos não há necessidade de a justiça se manifestar, posto que a sua “segurança” não está sendo posta à prova e o contribuinte confia, sem dispor dos meios para verificar se esta “justiça” está de fato operante. Então, quando o pretendente a aposentado ou assistido de um fundo de pensão decide exercer seu direito a uma aposentadoria, ele é apresentado à realidade de um calote. O que ele pagou já não vale mais, os dispositivos “legais” a que seu contrato foi circunscrito se esvaem na bruma das irresponsabilidades e ele se descobre daquele lado do contrato que é coberto pela incerteza e fragilidade da lei. A incerteza de que ela possa valer para ele, tanto quanto valha para uma empreiteira, um banco ou qualquer grupo econômico, que preferencialmente seja contribuinte de campanhas eleitorais.

O enriquecimento ilícito, em muitos casos, é tratado na imprensa com a profundidade de um curso d’água onde uma formiga mal molha as canelas para atravessar. Geralmente se fala por algum tempo sobre o caso, mas eles são tantos que se prefere partir para o próximo sem esclarecer o presente – e aí nunca se sabe o desfecho de qualquer caso. Perdendo-se preciosas oportunidades de esclarecer um grupo de trabalhadores como nós da Varig e outros tantos – e o próprio povo – deixa-se de educá-los no assunto e de informar acima de tudo que se estão empobrecendo de forma ilegal, sofrendo calotes nos seus direitos, alguém está ficando mais rico às suas custas.

Num mundo ideal (esse fica bem longe do Brasil) seria preciso falar muito mais dos delitos de enriquecimento ilegal, sobretudo quando afeta a sobrevivência de aposentados e pessoas desempregadas no limiar da aposentadoria. Mas, o mais importante seria apontar claramente os autores de tais delitos como se faz em países mais sérios que o Brasil no âmbito da segurança jurídica.

No já distante ano de 2009, quando amargávamos três anos do calote do Aerus, o megainvestidor Bernie Madoff já tinha sido condenado a 150 anos de prisão. 
Bernard Madoff, 71 anos (em 2009) um corretor estrela em Wall Street até 2008, viu seu esquema de pirâmide que montou  – e que chegou a enganar vários dos maiores e mais importantes investidores do mundo (incluindo milhões de pequenos investidores nem um pouco diferentes de nós, participantes do Aerus) ser destruído pela crise financeira. O trambique de Madoff foi descoberto em 2008, e já no ano seguinte ele seria condenado a passar o resto da vida na prisão e a ter a maioria dos seus bens confiscados pela justiça.

Será que algum dia a “justiça” brasileira vai – depois de devolver o que nos foi roubado – identificar, processar e condenar à prisão – além de confiscar os bens dos “Madoffs” do Aerus e do fim da Varig? Ou será que seremos para sempre condenados a viver – e morrer – ilicitamente empobrecidos?
Título e Texto: José Carlos Bolognese, 02-02-2014

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