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Foto: Carlos Garcia Rawlins, Reuters |
Os protestos contra o Governo de Nicolás Maduro prosseguem em Caracas e
noutras cidades do país
Ana Gomes Ferreira
O líder do movimento de
contestação ao Governo da Venezuela, Leopoldo López, foi acusado de crimes de
incêndio e de outros danos, instigação à delinquência e associação delinquente.
Esta última acusação é a mais grave e, só por ela, pode ser condenado a dez
anos de prisão. As acusações de “terrorismo” e “homicídio” não foram
formalizadas.
López entregou-se à polícia na
terça-feira, durante a grande manifestação em Caracas contra o Governo e o
regime chavista. Depois de detido, foi levado para a prisão de Ramo Verde, nos
subúrbios de Caracas, onde foi a audiência em que foi acusado. A sessão, que
deveria ter-se realizado na quarta-feira no Palácio de Justiça da capital, só
teve lugar na madrugada de quinta e dentro de um “tribunal móvel”.
As autoridades explicaram que
não quiseram levar López de volta para Caracas para preservar a sua segurança.
A oposição — que na Venezuela está unida numa coligação chamada Mesa de Unidade
Democrática; estão lá todos os partidos que são contra o regime socialista
bolivariano fundado por Hugo Chávez — denunciou a manobra. À porta do Palácio
tinham-se juntado milhares de pessoas em apoio a López e dando continuidade aos
protestos que duram há quase três semanas e alastraram a muitas cidades do
país.
Esta quinta-feira, a oposição
chamou os apoiantes para a porta da prisão de Ramo Verde, onde Leopoldo Lópes
deverá ficar 45 dias, o tempo que o Ministério Público crê ir durar o processo.
O diário espanhol El País dizia que, na capital, uma zona tornava-se o centro
da contestação, a Praça França. Ali, na noite de quarta-para quinta, a polícia
avançou sobre os manifestantes com granadas de gás lacrimogéneo. A polícia motorizada
avançou com os veículos para cima das pessoas.
À porta da prisão, o advogado
de López, Juan Carlos Gutiérrez, disse aos jornalistas que na segunda-feira irá
apresentar ao Ministério Público “provas sólidas” sobre a inocência do
opositor: “Os juízes vão ficar convencidos de que os referidos delitos não
existem.”
López, que é o líder do
Vontade Popular, lançou um movimento de contestação ao regime aproveitando a
onda de protestos iniciada pelos estudantes do ensino superior contra a
criminalidade galopante na Venezuela — mais de 15 mil assassínios no ano
passado. A campanha catapultou-o para a liderança da oposição, deixando para
trás Henrique Capriles, líder do Primeiro Justiça e que por pouco não derrotou
Nicolás Maduro nas presidenciais do ano passado, realizadas após a morte de
Chávez, em Março.
Com López na prisão, Capriles
— da ala moderada da oposição; Lópes está na classificada de mais radical —
tentou tomar as rédeas da contestação. Na verdade, tentou controlá-la, apelando
à luta não violenta, uma vez que na Venezuela parece estar a acontecer uma
escalada de conflituosidade.
138 feridos, 89 detidos
Segundo o jornal La Patilla
(conotado com a oposição mas que explica ter confrontados dados dos
manifestantes e do Governo), na quarta-feira 138 pessoas ficaram feridas (pelo
menos duas com gravidade) e 89 foram detidas pela polícia. Outros jornais
relatavam os confrontos da noite de quarta e madrugada de quinta entre
manifestantes anti-Governo e grupos de apoiantes — brigadas organizadas e armadas
— que terão sido chamadas para limitar ou neutralizar os manifestantes.
Não se sabe ao certo quem
activou estas brigadas civis de defesa da revolução chavista — o governador de
Carabobo, Francisco Ameliach, disse que a ordem partiu do presidente do Parlamento,
Diosdado Cabello —, mas Maduro já disse que não vai permitir que se “diabolize”
a sua actuação.
No total, desde o início dos
protestos, morreram seis pessoas, no caso de quatro delas já foi confirmado que
foram vítimas de disparos.
Outro jornal, El Universal,
explicava que assim que a noite caiu, na quarta-feira, começaram os confrontos
mais violentos em Caracas — que ao amanhecer tinha um intenso cheiro a queimado
— e nas outras cidades onde há revoltas: Maracaíbo, Barquisimeto, Maracay, San
Juan de los Morros, Valência, Carupano, Puerto Ordaz, San Fernando de Apure e
San Cristóbal.
Esta quinta-feira, o
Presidente Nicolás Maduro anunciou que devido ao "grave problema de ordem
pública que se vive em San Cristóbal", pode militarizar todo o estado de
Táchira (na fronteira com a Colômbia). O Estado de Excepção pode ser instaurado
disse. O ministro do Interior e Justiça, Miguel Rodríguez Torres, já tinha
anunciado que devido "aos protestos dos cidadãos" o porte de armas
estava proibido e que tinham sido enviados reforços policiais para este estado.
Os analistas frisavam que é a
primeira vez desde que o "socialismo do século XXI" — como lhe
chamava Chávez — foi instaurado na Venezuela que pode ser declarado o Estado de
Excepção no país. Chávez não o fez nem quando teve lugar uma tentativa de golpe
contra si, em 2002. Mas Maduro classificou o que está a acontecer em San
Cristóbal como um "complot" do presidente da câmara, Daniel Ceballos,
que, aliado a paramilitares e "grupos criminosos da Colômbia" querem
transformar a cidade na "Bengasi da Venezuela". "Não
permitiremos", disse Maduro, nem que seja preciso enviar tropas, tanques e
aviões militares.
San Cristóbal, explica o El
País, fui uma das cidades onde começou a vaga de contestação ao Governo e
regime.
Embate EUA-Venezuela
Na quarta-feira à noite, o
Presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, pediu a Nicolás Maduro para
libertar "todos" os detidos nos protestos e considerou a violência
"inaceitável". Já esta quinta-feira, o Governo de Maduro reagiu
considerando as declarações de Obama "uma nova e grosseira ingerência nos
assuntos" venezuelanos com a "circunstância agravada de usar uma
informação falsa e fazer afirmações sem fundamento".
As relações entre os EUA e a
Venezuela estão, de novo, no ponto zero. Caracas expulsou três diplomatas
americanos por suspeita de conspiração (Maduro diz que os EUA estão a ajudar a
oposição numa tentativa de golpe de Estado e por detrás dos problemas
económicos da Venezuela), o Governo de Washington respondeu dizendo que deverá
retaliar também com expulsões.
Para já, Obama foi o segundo
líder do continente americano a dirigir-se às autoridades venezuelanas devido à
instabilidade social e política na Venezuela. No domingo, os países do Mercosul
e os associados – Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai e Bolívia, mais Chile,
Colômbia, Equador e Peru – emitiram um comunicado de apoio ao Governo
venezuelano: "Os estados-membros reiteram o seu firme compromisso com a
plena vigência das instituições democráticas e rejeitam as acções criminosas
dos grupos violentos que querem disseminar a intolerância e o ódio na Venezuela
como instrumento da luta política". Mas, na terça-feira, dia das grandes
manifestações de Caracas (o Governo também organizou uma em seu apoio), o
Presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, disse estar "preocupado"
com o que se estava a passar; Maduro respondeu-lhe que não se devia meter em
assuntos que não são seus.
Texto: Ana Gomes Ferreira, Público,
20-02-2014
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