quarta-feira, 21 de maio de 2025

Jornalista é mordida por morcego na Zona Sul

Comuns em áreas urbanas do Rio, morcegos que se alimentam de frutas e insetos habitam telhados e árvores — e podem trazer perigos à saúde humana

 Patricia Lima 

Morcego da Artibeus lituratus, comum na cidade do Rio / Flickr (Arthur Tahara)

Conhecidos por sua imagem simpática na ficção — como o icônico Batman —, os morcegos podem representar sérios riscos à saúde humana. Na última semana, a jornalista Rosane Serro foi mordida por um desses mamíferos voadores dentro de seu apartamento na Zona Sul do Rio de Janeiro, enquanto assistia à televisão no sofá da sala.

O ataque foi inesperado, mas os sinais deixados pelo animal — urina, fezes e movimentação incomum — permitiram que Rosane identificasse o problema e buscasse ajuda médica rapidamente.

A jornalista procurou atendimento no Hospital Rocha Maia, em Botafogo, o único no município com um Centro de Referência de Imunobiológicos Especiais (CRIE), responsável pela imunização contra mordidas de animais silvestres e domésticos. No local, ela apresentou inchaço no braço esquerdo, além de dormência do pulso até a axila.

Após ser atendida, a dormência foi superada por volta das 19h. Enfermeiras do Super Centro Carioca de Vacinação, que funciona no hospital, confirmaram a mordida. Rosane também recebeu atendimento no Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI) e na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

Vacinação contra raiva e cuidados imediatos

A rápida visualização do morcego foi determinante para a aplicação do protocolo vacinal, que inclui:

·         Aplicação da vacina antirrábica e antitetânica;

·         Administração imediata do soro antirrábico.

O esquema vacinal contra raiva dura 15 dias e deve ser iniciado em até 24 horas após o ataque. As doses subsequentes ocorrem no 3º, 8º e 15º dias após o início do tratamento. O protocolo exige que as etapas sejam seguidas rigorosamente. O soro antirrábico, crucial para a imunização, precisa ser aplicado imediatamente — mesmo pacientes vacinados podem morrer de raiva se não receberem o soro.

Fezes e urina de morcego também transmitem doenças graves

Mesmo sem mordida, o contato com fezes e urina de morcego pode causar doenças. Entre elas:

·         Histoplasmose: afeta pulmões, baço e fígado;

·         Criptococose: pode evoluir para meningite e levar à morte;

·         Leptospirose: transmitida pela urina, caso o animal esteja contaminado por determinadas bactérias.

Rosane relatou tosse persistente, sintoma comum da criptococose, desenvolvida após contato com fezes deixadas pelo morcego em sua casa. Ela alerta: as fezes não devem ser varridas, pois os esporos se dispersam no ar. Segundo ela, os dejetos são pequenos, pegajosos e grudam facilmente em superfícies.

Ação da Prefeitura e análise laboratorial

Rosane acionou o número 1746 da Central de Atendimento ao Cidadão. Uma equipe de Investigação Zoossanitária do Centro de Controle de Zoonoses foi enviada ao local no mesmo dia. O agente Rafael Pereira, com 20 anos de atuação na Prefeitura e no SUS, encontrou um morcego morto, provavelmente por fome — a espécie era insetívora e pode consumir até 150 insetos por dia.

O animal foi encaminhado ao Instituto Municipal de Medicina Veterinária Jorge Vaitsman, responsável por análises laboratoriais que monitoram riscos à saúde pública.

Perigos do contato com morcegos: até o toque pode ser fatal

Segundo Rafael Pereira, até o simples toque em um morcego pode causar infecção por raiva. Ele relata o caso de um jovem de 22 anos que morreu após acariciar um morcego encontrado pela família em uma piscina.

Rafael alerta: todos os morcegos podem transmitir raiva. O contato com saliva (lambidas), arranhões ou mordidas é altamente perigoso. Animais domésticos, como cães e gatos, também devem ser vacinados anualmente, independentemente da idade ou do acesso à rua.

Limpeza hospitalar e prejuízo financeiro

Diante da contaminação por dejetos biológicos, Rosane precisou contratar uma empresa especializada em limpeza hospitalar para higienizar seu apartamento. O custo elevado a levou a contrair um empréstimo. O sofá onde foram encontradas fezes foi doado, por motivo de trauma.

Morcegos mais comuns no Rio de Janeiro

O Brasil abriga cerca de 182 espécies de morcegos, sendo que 84 podem viver em áreas urbanas. No Rio de Janeiro, os mais comuns pertencem às famílias Phyllostomidae e Molossidae:

Família Phyllostomidae:

·         Artibeus lituratus: frugívoro, com listras na face; ajuda na dispersão de sementes.

·         Platyrrhinus lineatus: frugívoro, também contribui para polinização.

·         Glossophaga soricina: nectarívoro e polinívoro, poliniza flores à noite.

·         Desmodus rotundus: conhecido como morcego-vampiro, se alimenta de sangue de animais; principal transmissor da raiva.

Família Molossidae:

·         Molossus molossus: insetívoro, adaptado ao meio urbano.

·         Tadarida brasiliensis: insetívoro que forma colônias em telhados e pontes.

Na Lagoa Rodrigo de Freitas, pode-se observar o morcego-pescador, que se alimenta de peixes.

O que fazer em caso de ataque ou contato com morcegos

·         Lave imediatamente a área afetada com água corrente e sabão;

·         Procure atendimento médico urgente para avaliação e início do protocolo vacinal;

·         Evite contato com morcegos — principalmente os encontrados no chão, voando de dia ou em locais incomuns;

·         Isole o local onde o animal morto foi encontrado. Se vivo, cubra-o com um balde até a chegada da equipe da Prefeitura.

Importante: morcegos são protegidos por lei

Lei Federal nº 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais) proíbe a caça, perseguição ou eliminação de morcegos. Esses animais silvestres são essenciais para o equilíbrio ecológico, participando da polinização e dispersão de sementes.

Descumprir a legislação pode resultar em multas e até prisão. A responsabilidade de controle populacional e vigilância cabe às secretarias municipais de Saúde, em parceria com instituições de pesquisa.

Título e Texto: Patricia Lima, Diário do Rio, 21-5-2025

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