Joana Petiz
Governos e sindicatos nunca se
entendem quando chega a hora de fazer contas à adesão a uma greve. Cada qual
puxa a percentagem para mais perto da fasquia que colocou - mas o que ambos
contabilizam são os estragos. Ontem não foi assim. Pela primeira vez,
assistimos - e não foram estimativas, foi a realidade - a uma greve realmente
falhada. Todos os voos intercontinentais chegaram ao destino. Quatro quintos
dos passageiros viajaram na companhia de bandeira. Cumpriram-se 83% dos voos da
TAP.
Os números deste primeiro dia
de greve revelam bem a verdade sobre o protesto: não é a vontade da classe,
está longe de representar os desejos da maioria. É uma greve de um pequeno
grupo de pilotos que não está disposto a abdicar de um conjunto de exigências
umbiguistas mesmo que isso destrua a empresa onde trabalham e deixe no
desemprego, no mínimo, um terço dos colegas.
Felizmente, a maioria dos
profissionais da TAP revelou ter consciência quer da má-fé subjacente aos
motivos invocados para a paragem quer do que dez dias sem sair do chão poderiam
fazer à TAP. E, perante estes números, o sindicato percebeu que estava no
caminho errado e retratou-se, certo? Errado. O senhor que conhecemos há dois
dias pela televisão, a anunciar que não havia negociação possível, veio ontem
encolher os ombros e dizer que a greve vai continuar. Mas vai continuar sem a
adesão da maioria.
Os pilotos viraram a cara à
inflexibilidade cega do sindicato - que poucos ainda sentem que os representa -
e vão continuar a garantir que se cumpre o máximo de voos programados. São eles
os heróis desta história. Acima de tudo, mostraram que respeitavam os
passageiros e que lutariam até ao fim para preservar a companhia.
O vice-primeiro-ministro
encontrou a expressão mais certeira: "Estes pilotos não são fura-greves,
são salva-empresas."
Mas o sindicalista tem uma
versão diferente. Sem piscar os olhos, teve a coragem de dizer que a greve só
não regista números mais elevados porque alguns pilotos "colocam
interesses individuais à frente de interesses coletivos". Faz-nos
desconfiar - de tão verdadeiro o comentário e tão errado o alvo - que teria um
espelho à frente dos olhos.
Título e Texto: Joana Petiz, Diário de Notícias, 2-5-2015
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