sábado, 2 de maio de 2015

[TAP] Os bons da fita

Joana Petiz
Governos e sindicatos nunca se entendem quando chega a hora de fazer contas à adesão a uma greve. Cada qual puxa a percentagem para mais perto da fasquia que colocou - mas o que ambos contabilizam são os estragos. Ontem não foi assim. Pela primeira vez, assistimos - e não foram estimativas, foi a realidade - a uma greve realmente falhada. Todos os voos intercontinentais chegaram ao destino. Quatro quintos dos passageiros viajaram na companhia de bandeira. Cumpriram-se 83% dos voos da TAP.

Os números deste primeiro dia de greve revelam bem a verdade sobre o protesto: não é a vontade da classe, está longe de representar os desejos da maioria. É uma greve de um pequeno grupo de pilotos que não está disposto a abdicar de um conjunto de exigências umbiguistas mesmo que isso destrua a empresa onde trabalham e deixe no desemprego, no mínimo, um terço dos colegas.

Felizmente, a maioria dos profissionais da TAP revelou ter consciência quer da má-fé subjacente aos motivos invocados para a paragem quer do que dez dias sem sair do chão poderiam fazer à TAP. E, perante estes números, o sindicato percebeu que estava no caminho errado e retratou-se, certo? Errado. O senhor que conhecemos há dois dias pela televisão, a anunciar que não havia negociação possível, veio ontem encolher os ombros e dizer que a greve vai continuar. Mas vai continuar sem a adesão da maioria.

Os pilotos viraram a cara à inflexibilidade cega do sindicato - que poucos ainda sentem que os representa - e vão continuar a garantir que se cumpre o máximo de voos programados. São eles os heróis desta história. Acima de tudo, mostraram que respeitavam os passageiros e que lutariam até ao fim para preservar a companhia.

O vice-primeiro-ministro encontrou a expressão mais certeira: "Estes pilotos não são fura-greves, são salva-empresas."

Mas o sindicalista tem uma versão diferente. Sem piscar os olhos, teve a coragem de dizer que a greve só não regista números mais elevados porque alguns pilotos "colocam interesses individuais à frente de interesses coletivos". Faz-nos desconfiar - de tão verdadeiro o comentário e tão errado o alvo - que teria um espelho à frente dos olhos.
Título e Texto: Joana Petiz, Diário de Notícias, 2-5-2015

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