Dinis de Abreu
O título desta coluna é
deliberadamente provocatório. E a resposta, que nunca será unívoca, dependerá
do quadrante ideológico do observador ou da sua relação sentimental com uma
companhia que nos habituámos a ver de bandeira mas que cresceu em dimensão e em
prejuízos - suportados sempre pelo contribuinte.
Esta realidade, contudo, nunca
foi suficientemente dissuasora para os sindicalistas que representam as
tripulações de bordo - e, em particular, os pilotos - com as suas próprias
bandeiras, bem menos nobres, e que emergiram em força a pretexto da
privatização.
De facto, a iniciativa da
privatização - também partilhada em tempos por governos do PS -, descobriu uma
curiosa duplicidade dos pilotos: são contra, a menos que sejam beneficiários de
uma participação accionista na futura empresa, de preferência a custo zero ou
perto disso.
Esta bipolaridade constitui um
dos vínculos marcantes do activismo sindical, praticado por um sector
profissional que não desistiu de se considerar élite, apesar da massificação do
transporte aéreo. E com essa presunção refinou e sofisticou-se, actuando,
porém, com métodos que lembram os da CGTP.
A cereja em cima do bolo foi a
anunciada greve de 10 dias, com início no 1º de Maio. O PCP e a sua central
sindical agradecem. Não podiam esperar melhor…
A 'luta' dos pilotos da TAP -
à qual se juntaram os da Portugália - reacendeu-se, precisamente, quando se
convenceram que o Governo tencionava levar por diante a privatização da
companhia. E veio mesmo a calhar à lógica do PCP.
Ora, os sindicalistas sabem
que o simples anúncio de uma greve - mesmo sem a amplitude desta -, é
suficiente para comprometer as reservas de passagens aéreas e de hotelaria,
afectando gravosamente o fluxo turístico, porque ninguém programa uma viagem
para se defrontar com incertezas.
Feito o mal e a caramunha, de
pouco servem a requisição civil ou a desconvocação da greve de véspera. Os
prejuízos são irreversíveis, no imediato e na imagem exterior da companhia.
É um jogo irresponsável e
lesivo da TAP e da economia portuguesa, como se tem visto, mas prosseguido com
grande frieza e indiferença pelas consequências.
Seria oportuno que o cineasta
António Pedro Vasconcelos, tão lesto, ultimamente, a apadrinhar o slogan 'Não
tap os olhos' (talvez à míngua de filmes subsidiados…), os abrisse para esta
realidade - que entra pelos olhos dentro -, e que é o facto de a TAP se ter
transformado num saco sem fundo, agravando défices insustentáveis.
Se a privatização falhar - hipótese que se desenha na altura em que escrevemos - por que não fechar a TAP, abrindo em seguida outra ao lado que fosse herdeira do melhor do equipamento, destinos, know-how e recursos humanos, sem vícios majestáticos, como foi feito pelos suíços em 2001 após a falência da Swissair?
Por acaso, a Swissair estava à
época a completar 70 anos de existência - tal como agora a TAP - e ensaiava uma
fuga em frente perante o volume de prejuízos que desfiguravam a virtuosa gestão
helvética, negociando a compra de outras operadoras europeias (uma delas, por
acaso, a TAP, imagine-se!).
De súbito, os aviões da
Swissair começaram a ficar retidos em terra, por falta de dinheiro para
combustível. O desfecho estava traçado. E, em Abril de 2002, nascia a Swiss
Air, por fusão com uma companhia regional (a CrossAir), mais tarde adquirida
pela Lufthansa, e hoje lucrativa.
Sejamos claros: a TAP
tornou-se ingovernável e somente um hábil gestor de marketing, chamado Fernando
Pinto, há muito seu presidente - contando com cumplicidades e simpatias nos
media e em sucessivos governos -, conseguiu atenuar o impacto público do imenso
buraco financeiro que estrangula a empresa, desde opções erráticas na operação
aérea (como foi notório no caos do Verão passado) até à aquisição da famigerada
empresa de manutenção no Brasil.
Os pilotos estão a desferir o
golpe de misericórdia, à pala de um alegado acordo datado de 1999, nunca
validado em Conselho de Ministros - como João Cravinho, então governante com a
tutela, veio agora recordar, declarando, preto no branco: «A existência de um alegado
direito adquirido no contexto da reprivatização da TAP é uma total falsidade,
montada a partir do nada».
A questão que se coloca é,
pois, a da viabilidade da empresa. E se esta apenas sobrevive à custa de
endividamentos sucessivos, a solução só poderá ser fechá-la e abrir outra,
expurgada de gigantismos e práticas laborais viciosas.
Pedro Passos Coelho, que teve
a coragem de dizer não a Ricardo Salgado, só poderá seguir o mesmo caminho
perante a chantagem dos pilotos da TAP numa companhia arruinada. Por favor,
'não tap os olhos'!...
Título, Imagem e Texto: Dinis de Abreu, SOL,
28-4-2015
Relacionados:
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-