Fernando Ulrich
Porque o monopólio e a reserva de mercado
acomodam. Fazem com que a mediocridade prospere
Não adianta, é sempre igual:
no momento em que o aplicativo Uber começa a operar em alguma cidade, a
polêmica é instaurada.
Os taxistas que querem proibir
por se sentirem pessoalmente lesados — o que ocorre de fato —
logo elevam o tom e as exigências perante as autoridades para que estes algo
façam. Que se proíba. Que se coíba. Que se regulamente. Que se faça algo para
impedir essa "concorrência desleal, predatória e ilícita".
Normalmente são esses o pleito e a justificativa de quem é contra a tecnologia.
Reconheço o quão prejudicial
pode ser — para os já estabelecidos — quando novos entrantes chegam ao mercado
e passam a disputar o mesmo cliente. Não há dúvidas de que a concorrência
sacode o mercado e afeta os ofertantes que já estão nele há mais tempo. Mas
será que isso deve fundamentar uma eventual proibição? Seria esse o caminho a
seguir?
Não tratarei aqui da questão
técnica legal e nem se os parceiros da Uber têm de arcar com todas as
exigências das municipalidades, isentando-os de inúmeros custos. Há diversos
pareceres jurídicos e análises comparativas para quem desejar se ater a esse
tema (ver aqui, aqui e aqui).
O ponto aqui é outro. A
reflexão aqui é mais profunda e transcende um simples aplicativo de smartphone.
Todos somos, em princípio, a
favor da livre concorrência. Quem não quer ter ao seu dispor diversas opções de
pães, bebidas, vestimentas, restaurantes, carros, telefones, enfim, de qualquer
produto ou serviço ofertado no mercado? Quem seria contra isso? O problema
surge quando a concorrência bate à nossa porta, "roubando-nos"
potenciais clientes. Aí tudo muda de figura. A partir desse momento, a
concorrência passa a ser negativa, nociva e contrária ao "bem
público".
Se tanto apreciamos a
abundância de bens e serviços à disposição para nosso consumo, por que lutamos
ferozmente contra a abundância dos bens e serviços produzidos no setor em que
somos ofertantes? Não seria um paradoxo?
Se todos os produtores
adotarem a mesma postura nos seus respectivos mercados, reduziremos
artificialmente a oferta de bens e serviços na economia. No lugar de
abundância, teremos escassez. O "direito de escolher" será inócuo,
pois não haverá alternativas. Será como as opções de refeições em um voo: sim
ou não.
A Uber incomoda porque
qualquer concorrência incomoda. Quem compete no mercado pelo mesmo cliente tem
de se empenhar para proporcionar o melhor serviço, o melhor atendimento, enfim,
a melhor experiência ao cliente. Restringir artificialmente, por decreto
estatal, a oferta de algum serviço no mercado jamais fará dele um produto de
qualidade. O temor da concorrência impele os ofertantes a buscarem a
excelência. A concorrência repele a mediocridade.
Não são a regulamentação e as
obrigações legais que elevarão a qualidade de um serviço. A municipalidade pode
coagir os taxistas a atuar dentro de diversos parâmetros impostos desde cima,
mas o que melhorará o serviço de fato é o medo de "perder" o cliente,
ou, dito de outra forma, a necessidade de "ganhá-lo" todos os dias.
Isso foi precisamente o que
aconteceu na cidade de Nova Iorque,
notória pelos táxis sujos com motoristas antipáticos. "Não foram os
reguladores da cidade que ordenaram que o serviço de táxi melhorasse, foram os
meros cidadãos de Nova Iorque que preteriram os táxis em favor de uma
alternativa melhor."
Curiosamente, o resultado
não-premeditado da atitude dos nova-iorquinos é que o próprio serviço de táxi
melhorou consideravelmente desde que Uber e similares passaram a operar na
cidade. O mesmo fenômeno está acontecendo nas cidades brasileiras.
Contudo, o desconforto não
acomete apenas os produtores do mercado de transporte individual. A Uber causa
embaraço também nos entes públicos.
Porque o interessante sobre a
questão dos aplicativos de carona paga é que, em última instância, é imputado
ao estado o ônus de justificar não apenas por que a Uber tem de ser proibida,
como também por que um serviço como o de táxi precisa ter licença controlada
pelo município.
Por que a oferta desse simples
serviço de transporte individual deve ser regulada pelo município e não pode
ser regulada pelo próprio mercado, com livre entrada de empresas e livre
escolha dos consumidores? Por quê? De onde vem a sabedoria dos reguladores
capaz de determinar com exatidão de quantos táxis uma cidade precisa? E como
definem esses senhores a tarifa a ser cobrada dos usuários?
Se, em algum momento da
história, o controle e a regulação estatal para o serviço de transporte
individual foram necessários, a tecnologia está nos mostrando que hoje esse já
não é mais o caso.
Ao estado, ter que se
justificar é sempre um grande incômodo. E acaba sendo vexatório quando fica
claro para a sociedade a aparente ausência de qualquer justificativa cabível.
Sejamos honestos: a
concorrência nos amedronta. É verdade. Mas ela também beneficia a nós próprios.
De que forma? Fazendo com que nos superemos produzindo com mais rapidez e
eficiência ou nos forçando a buscar novos meios de encantar o cliente. Testando
a nossa capacidade de criar e inovar e conceber soluções antes inimagináveis.
Ensinando-nos a sermos corteses e simpáticos, inclusive naqueles dias em que
acordamos com o pé esquerdo.
Por outro lado, o monopólio ou
a reserva de mercado nos acomodam. Fazem com que a mediocridade floresça. Já a
concorrência tem o efeito oposto. Ela nos desafia, nos instiga, nos impulsiona
a extrair o melhor de nós mesmos e favorecer o próprio convívio em sociedade.
Que os parceiros da Uber sejam
livres para operar nas cidades brasileiras. E que sejam abolidas as regulações
e licenças exigidas dos taxistas — defendo e desejo liberdade para eles também.
Não sou apaixonado pela Uber. Defendo-o pelo que hoje representa: a liberdade,
a livre concorrência. Mas amanhã será outra empresa, noutro setor, com outra
tecnologia, e a polêmica será a mesma — e serei obrigado a republicar este
texto apenas alterando os nomes dos protagonistas.
O grande problema da liberdade
é que ela vale para ambos os lados. Se queremos ser livres para escolher,
devemos exigir e defender a mesma liberdade para produzir, para ofertar aos
nossos semelhantes novas soluções, por mais que estas venham a abocanhar uma
fatia da nossa clientela e, consequentemente, de parte dos nossos rendimentos.
Se, como taxista, não quero abrir mão de usar o WhatsApp para fazer chamadas,
não posso exigir que seja censurado um aplicativo como a Uber.
A Uber incomoda tanta gente
porque assim é a liberdade. A liberdade incomoda. Defender a liberdade é fácil.
Praticá-la, no entanto, requer esforço, empenho e retidão moral. Praticar a
liberdade significa defender a liberdade dos outros mesmo quando ela pode não
nos beneficiar diretamente. Hoje são os taxistas os que devem atentar a essa
lição. Mas ela é válida para todos. Todos, sem exceção. Inclusive você que está
lendo este artigo. Porque, se, em algum momento, no futuro, a tecnologia vier a
ser usada para revolucionar o seu mercado, você deverá ser o primeiro a
defendê-la e a adotá-la. E essa tarefa não será nada fácil.
Título e Texto: Fernando Ulrich, Mises Brasil, 5-4-2017
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ResponderExcluirNossos táxis são caros por causa das vistorias e dos impostos.
UBER não são sujeitos à vistorias e impostos.
Não existe fiscalização fidedigna em ambos.
Depois tem a habilitação profissional, e ambos não exigem atestado de bons antecedentes.
Cada UBER paga 25% para uma empresa estrangeira.
Os governos faturam em cima dos taxistas inclusive no imposto de renda.
Temos é de regularizar essa meleca toda.
E para finalizar táxi é serviço público que as prefeituras os tratem como tal.