quinta-feira, 24 de janeiro de 2019

[Pensando alto] O desarmamento, a insegurança e o velho bacamarte

Pedro Frederico Caldas

Não adianta discutir com o inevitável. O único argumento disponível contra o vento de leste é vestir o sobretudo.
James Russel Lowell

Todos os profetas armados venceram, e os desarmados foram destruídos.
Maquiavel

Decisões têm consequência. Indecisões, mais ainda.
Jair Bolsonaro

Quem, em sã consciência, seria contra o desarmamento geral e um mundo sem crime e sem violência? Como seria bom se todos, absolutamente todos, seguissem as palavras do Bom Samaritano e preferissem, antes do revide, oferecer a outra face. Se todos fossem bons, nem esse gesto teria a oportunidade de se materializar. A outra face jamais seria oferecida porque a face oposta jamais teria sido esbofeteada. Simples como uma porta aberta.

Nem Deus acreditava na bondade humana. Se assim não fosse, qual sentido faria os Dez Mandamentos? Ao bom não haveria necessidade das recomendações: honrar pai e mãe, não matar, não roubar... O homem, segundo o catecismo da Igreja Católica, já traz em si o pecado original. Esse pecado foi contraído, não praticado. Trá-lo em si como que por sucessão hereditária, eis que todos seriam descendentes de Adão e Eva que, por seu turno, decaíram por desobediência a Deus.

Independentemente da dissertação religiosa, o homem é imperfeito e pode cair em falta. A concupiscência marca-o. Por conseguinte, não é de se estranhar que a legítima defesa, própria ou de terceiros, está presente na doutrina religiosa.

O catecismo da Igreja Católica, como suma da santa doutrina, diz que “O amor a si mesmo permanece um princípio fundamental da moralidade. Portanto, é legítimo fazer respeitar seu próprio direito à vida. Quem defende sua vida não é culpável de homicídio, mesmo se for obrigado a matar o agressor” (Catecismo, parágrafo 2264). Para santo Agostinho, o doutor da Igreja, a paz é a preservação da ordem.

Jesus, Ele mesmo, ao falar das armas, chega a recomendar, se bolsa não houver, a venda da túnica para a compra de uma espada (Lc. 22, 35-36). E ao uso da violência, para a restauração dos bons costumes, não trepidou em recorrer ao brandir o chicote no açoite aos vendilhões do templo.

E o nosso enfezado Deus do Velho Testamento? Para punir culpados era capaz de destruir cidades, como se regalou em fazer. Jesus amaciou o Demiurgo, mas, como acima relatado, não vacilou em empunhar o relho, quando necessário, nem censurava Pedro por andar armado de espada. Quando o fez, por Pedro ter decepado a orelha de Malco, disse apenas que naquela circunstância não fora necessário.

E por que digo o que disse acima e busco a legitimação religiosa? Fi-lo para aplacar a consciência das almas pias, para dizer-lhes que ser pio e manso de coração não significa se abster da defesa de si próprio ou de terceiros contra o injusto ataque.

E a doutrina dos homens?

A legítima defesa é uma realidade presente desde que o mundo é mundo. Todas as codificações a chancelam. E por que essa unanimidade num terreno tão controverso como o é o do sistema de normas de conduta, principalmente o das normas impositivas? Acho que a estas alturas todos nós já suspeitamos tratar-se de um direito natural. Mesmo que não esteja chancelada em nenhuma codificação, tal conduta (a legítima defesa) seria assumida por qualquer que veja sua incolumidade física periclitar, mesmo que a legítima defesa lhe fosse interdita. Seria humanamente impossível se exigir de alguém quedar passivo contra uma injusta agressão. Qualquer regra nesse sentido seria desacatada pelo mais pacífico dos homens.

Tomado como pressuposto que o direito de defender a si próprio, ou a terceiros, contra uma injusta agressão é uma atitude legítima, irrefragável, e, portanto, não apenável, quais seriam os meios a que se poderiam lançar mãos para assegurar a efetividade de tal conduta?

Todos os meios razoáveis e compatíveis. Logicamente aí está inclusa a arma, de qualquer tipo ou espécie. A arma mais efetiva para a defesa é, indiscutivelmente, a arma de fogo. A arma de fogo deixa um homem frágil, franzino ou uma mulher impotente em condições iguais ou superiores às do agressor, do criminoso violento em geral ou de qualquer trinca-fortes.

Felizmente as armas de fogo, pelo seu grande potencial de promover dano, igualou as pessoas. Um homem forte, pesado e musculoso não terá o domínio absoluto em relação a uma pessoa franzina, desde que esteja armada.

A sequência lógica do raciocínio nos diz que se a pessoa não dispõe de arma para o exercício da legítima defesa, dificilmente poderá colocar em prática esse direito. Assim, leis que proíbem ou dificultam excessivamente a propriedade de armas estão, no limite, colocando as pessoas à mercê dos violentos e dos bandidos em geral. É um verdadeiro desrespeito à cidadania privar o homem de bem dos meios para o exercício de um direito natural e fundamental para o ser humano.

No caso do Brasil, ao cidadão de bem foi praticamente proibida a legitima defesa, no passo em que lhe foi tirado, na prática, o direito a ter ou portar uma arma de fogo. O chamado Estatuto do Desarmamento (Lei 10826/2003) foi uma das mazelas praticadas por Lula contra a sociedade civil. As restrições, a burocracia, a papelada e o custo decorrente dessa malsinada lei deixaram os homens de bem do Brasil à mercê da bandidagem violenta. E olhem que, não satisfeitos, fizeram uma consulta popular, a terceira da história do País, perguntando aos eleitores, em outubro de 2005, dois anos após a edição da porcaria do Estatuto do Desarmamento, se “O comércio de arma de fogo e munição deve ser proibido no Brasil”. Tal consulta nunca fora feita em qualquer outro país! Enorme campanha foi desenvolvida em favor do sim, com as figurinhas carimbadas de sempre, dos meios políticos, esquerda à frente, e aquelas pessoinhas tão boas e generosas, de sentimentos superiores a de qualquer outro ser humano, paridos pelo showbiz, artistas globais à frente, se esgoelaram no rádio e na televisão, explicando a nós outros, pobres idiotas e ignorantes, como seria bom para todos não dispor de meios para se defender.

E qual foi o resultado? Isso todos nós sabemos. Dois terços (63,94%) do Povo Brasileiro, ordeiro e conservador, deram um rotundo NÃO ao governo e aos cretinos politicamente corretos.

Mas essa manifesta vontade do povo não foi respeitada, a população continua desarmada, trancada em suas casas, não podendo usar nada que tenha algum valor, evitando sair à noite e submetida, constantemente, a violências de toda ordem. O homem de bem não pode se defender e o marginal dispõe da arma que quiser.
Contrariamente ao que se pensa e ao que é martelado pelos meios de comunicação e por autoridades pérfidas ou desinformadas, a finalidade precípua da arma não é causar a morte; pelo contrário, a arma mais evita do que provoca a morte. Vamos tentar, no particular, colocar alguma ordem nessa bagunça conceitual. Vamos, por exemplo, examinar os dados de um dos países mais armados do mundo, os Estados Unidos, que, nesse particular, se ombreia à Suíça e a Israel.

Com uma população de trezentos e dezoito milhões em 2013, havia nesse ano, naquele país, em torno de trezentos milhões de armas de fogo em mãos da população civil, cerca de uma arma por habitante. E quantas pessoas morrem por ano vítimas de arma de fogo? Em 2013 morreram 33.636. Desse número, 21.175 foi por suicídio, ou seja, mais de 60% dos mortos por arma de fogo! A arma de fogo não é elemento determinante do suicídio. Quem quer se suicidar, usa qualquer meio disponível. Faço aqui um intermezzo para pontuar que no Brasil, aparentemente por não ter arma de fogo, esse percentual de suicídio (60%) se dá por sufocação, é dizer, a pessoa usa uma via mais cruel para dar cabo a si mesma.

Desta forma, tirados os mortos por arma de fogo via suicídio, restam 11.208 homicídios por arma de fogo. Deve ser levado ainda em consideração que nesse número está o confronto entre bandidos e polícia, bandidos e bandidos e as defesas pessoais, além dos disparos acidentais. O que vocês acham que resta confrontem com uma população de trezentos e dezoito milhões e verão que o percentual vai para duas casas depois da vírgula. E mais. As estatísticas mostram que, enquanto o número de armas de fogo cresceu bastante, de 1993 a 2014, a taxa de homicídios, nesse mesmo período, caiu para quase a metade. Somente de 2007 para 2014 cresceu o número de porte de armas em 178%.

Agora, o reverso da moeda. Quantas mortes, estupros, espancamentos e violências de toda ordem foram evitados ou repelidos porque a vítima estava armada? As estatísticas vão de quinhentos mil a três milhões! Os analistas não cansam de enfatizar que os bandidos são contidos porque sabem que tentar invadir a casa de um americano é um risco que não vale a pena. É justamente neste contexto que a arma é erigida a um instrumento de paz, um instrumento de salvação de vidas, da integridade do corpo, da honra e da dignidade das pessoas.

Enquanto isso, no Brasil, toda a população está refém. Quem pode, transforma a casa em uma fortaleza. Dá pena passar nos bairros de São Paulo, onde predominam casas, e ver tudo cercado por barras de ferro. Já nos Estados Unidos, onde quase todo mundo mora em casa, não há muros entre as residências e todo mundo circula pelas ruas com ótimos carros, joias e relógios de ouro e sair à noite não constitui uma temeridade. Não conheço ninguém por aqui que tenha sido assaltado. No Brasil, nós todos fomos, eu, minha mulher, filhos e filha, à mão armada.

Dá nojo ver um político ou um “especialista” brandindo o argumento de que a pessoa não tem que se defender, que ninguém precisa disso, pois à polícia cabe esse dever. O malfadado esquece que o bandido ataca justamente quando está seguro de que a polícia não está presente; assalta nos semáforos porque sabe que nos outros carros não há ninguém armado; invade as casas sabedor que a população está desarmada; estupra porque a vítima está inerme; abusa de tudo e de todos porque é o único detentor do direito de andar armado!

Outro ponto a merecer esclarecimento é a confusão entre o dever do estado de conter a criminalidade e assegurar, no que possível, a segurança a e tranquilidade da população, e o direito à legítima defesa. São duas posições que não se confundem, mas que não são contraditórias nem incompatíveis entre si. Em qualquer país do mundo há crime, há mortes, assaltos, invasão criminosa de lares e propriedades, estupros e outras manifestações violentas de criminalidade. Nuns mais, noutros, menos. Por mais eficiente que seja o aparelho repressor e preventivo estatal, não há a garantia de que a violência se manifeste. Por isso mesmo, a última trincheira do cidadão será sempre o exercício da legítima defesa, sempre que necessária, com o uso dos meios adequados, dentre os quais as armas de fogo. A existência de arma para a defesa pessoal ou de terceiros, do lar e da propriedade é fator de prevenção e contenção do crime. Os dados estão aí e em abundância para a prova disso.

Portanto, as pessoas de bem, os cidadãos ordeiros deveriam fazer um grande movimento para que essa vergonha chamada Estatuto do Desarmamento seja revogado.

Ninguém é obrigado a se armar, mas, ao cidadão ordeiro que quisesse, deveria ser permitido. O resto é intrusão indevida e arbitrária de um Estado sufocante na vida das pessoas.

Se você é contra à posse ou ao porte da arma de fogo, a tanto não está obrigado. É uma deliberação sua que deve ser por todos respeitada. Todavia, querer impor a sua conduta aos demais orça pela arrogância, pela impertinência e pelo desrespeito aos que pensam diferentemente.

Dispa-se, se assim melhor lhe parece ser, do seu direito natural à legítima defesa e da possibilidade de adquirir os meios que a asseguram, mas tenha a humildade de não querer impor a todos uma particular visão de mundo.

Ponham-se em brios, resistam, brasileiros, exijam o direito de ter os meios para o exercício de um direito natural.

Se o governo em curso quer restaurar a todos, com as precauções legais, o direito de ter uma, merece, pelo menos nesse particular, o apoio de todos que assim pensam.

Ah, e onde está o velho bacamarte?

Continua lá, em alguma parede, aguardando a mão intrépida que restaurará a segurança e a ordem.
Título e Texto: Pedro Frederico Caldas, 24-1-2019

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