quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Onde estão os jovens que elegeram Obama? "Sem emprego" e sem vontade de votar

Chad trabalhou na campanha de Obama, mas, dois anos depois, está desiludido. O Presidente americano tenta mobilizar os jovens para as eleições de 2 de Novembro. Mas eles não vão votar.

Obama reconheceu a importância do "exército" de jovens voluntários para a sua eleição.
Foto: Jim Young/Reuters
George Washington nunca usou peruca. Esta é uma das 16 revelações sobre o primeiro Presidente dos Estados Unidos que Ron Chernow oferece de bandeja ao público que o escuta numa conhecida livraria de Washington sábado à tarde. As restantes 54 estão na biografia que acaba de publicar. E assim se vende um livro.
Chad Robinson espera pacientemente por um autógrafo no fim da fila, que forma um L. Ele é o único afro-americano, mas não parece dar por isso. Aos 24 anos, também está muito abaixo da média etária da sala, maioritariamente pensionista. 
Não é uma coisa que ele faria por muitas outras pessoas, atravessar o rio entre a Virginia, onde mora e trabalha, e Washington DC, mas George Washington talvez seja dos seus mortos preferidos. Chad mostra fotos tiradas com o seu Blackberry na casa recém-comprada: um busto do Presidente na prateleira dos livros, um retrato de Washington por cima de uma poltrona em pele. Bom gosto.

Chad fez parte do exército de voluntários que trabalharam na campanha de Barack Obama entre 2007 e 2008. A campanha que provou que os jovens se podiam interessar e envolver em política. Uma rede de formigas que, reconheceu Obama, foi mais importante do que "todos os anúncios na televisão" ou as grandes contribuições financeiras. 
Como tantos outros estudantes, Chad aprendeu as regras básicas num fim-de-semana - num campo de treino sobre organização comunitária chamado "Campo Obama" - e dedicou-se à campanha como algumas pessoas se dedicam a causas. Fez telefonemas e procurou convencer desconhecidos a votarem. Não descansou nos fins-de-semana. Bateu portas e emprestou um ouvido quando as pessoas queriam falar de si. Às vezes, sentia-se como um vendedor ambulante. "Em Outubro, todos os domingos há futebol americano. E lá ia eu bater às portas quando os Redskins [equipa de Washington] estavam a jogar. As pessoas praticamente fechavam a porta na minha cara, do género: "Por que é que estás a falar comigo?!""
"A primeira porta é sempre difícil", diz Chad, "mas três casas abaixo há sempre alguém que é caloroso. Um par de casas depois, damos com um idiota. Mas a seguir há sempre uma velhinha adorável que fica muito contente por termos aparecido. Conheci um homem, o senhor Harrell, que trabalhou numa fábrica de torpedos. Eu sabia que precisava de tempo extra quando o fosse visitar, porque ele falava durante meia hora. Por isso deixava sempre a casa dele para o fim. Essas duas ou três casas em que falamos com alguém que tem uma história interessante fizeram com que valesse a pena. Adoro falar com as pessoas."
Setembro e Outubro de 2008 foram meses particularmente intensos. "Eu estava realmente dedicado, queria tanto que ele [Obama] ganhasse." Hoje, tudo isto lhe parece uma memória antiga. 
O Presidente Obama vai hoje à MTV americana responder a perguntas de jovens. A emissão, que começa às 21h00 (hora de Lisboa), surge duas semanas depois de uma entrevista à Rolling Stone, cujo público-alvo é jovem, e três semanas após um comício na Universidade do Wisconsin em que disse a 17 mil estudantes: "Se toda a gente que lutou pela mudança em 2008 votar em 2010, nós iremos ganhar". A verdade é que enfrenta a maior taxa de reprovação (53 por cento, segundo uma sondagem Ipsos) desde que foi eleito.
Como chegar a eles?
Os resultados das eleições de 2 de Novembro, que irão determinar a nova composição do Congresso americano, serão sobretudo interpretados como uma avaliação dos quase dois anos de presidência de Obama. E as previsões não lhe são favoráveis. As sondagens antecipam pesadas derrotas para os democratas. As sondagens também mostram uma quebra de interesse entre o grupo que votou pela primeira vez em 2008. Calcula-se que Obama tenha mobilizado 15 milhões de novos eleitores há dois anos, que foram determinantes para a sua vitória. É esse eleitorado incerto, sem o hábito de votar, que o Presidente americano tem privilegiado nas suas participações na campanha democrata, nomeadamente jovens e afro-americanos. E até David Plouffe, o arquitecto da campanha presidencial de 2008, reconheceu ao Washington Post que ia ser difícil voltar a galvanizar esse grupo. 
A abstenção é maior nas eleições intercalares do que nas presidenciais. Ela afecta todas as faixas etárias, mas é particularmente clamorosa no grupo mais jovem. Em 2008, 51 por cento da população entre os 18 e os 29 anos votou. Nas eleições intercalares de 2006, apenas votaram 25 por cento. Nestas últimas, 63 por cento da população acima dos 60 anos votaram. Ou seja, os resultados das eleições intercalares reflectem um eleitorado mais velho. 
"Pode ser que Obama consiga que mais jovens votem do que nas anteriores eleições intercalares", diz Michael McDonald, professor de Política na George Mason University, com experiência em sondagens. "Mas eu ficaria chocado se o número fosse substancialmente maior. Não teremos a mesma participação eleitoral jovem que houve nas presidenciais. Eu estaria disposto a apostar a minha casa nisso."
Fazer campanha junto dos estudantes é fácil, diz. "Sabemos onde eles estão. Mas a abstenção vai ser mais severa nos jovens que estão à procura de emprego. Não há forma de chegar a eles." 
Desemprego e desilusão
A campanha de 2010 também parece uma sombra do que foi em 2008. Onde estão os jovens que fizeram a diferença?
"Sem emprego", responde Chad Robinson. Não é o caso dele. "A taxa de desemprego dos 18 aos 30 anos é 16 por cento, ou algo assim. Os jovens que apoiaram Obama não estão melhor do que estavam há dois anos. A minha irmã ainda anda à procura de trabalho. Tenho amigos que acabaram de se formar em Direito e não têm emprego. O núcleo de apoiantes de Obama, as pessoas que estavam motivadas, estão a viver com os pais e a depender dos cartões de crédito; trabalham no comércio a retalho ou em assistência administrativa quando têm uma licenciatura de quatro anos e a dívida que o prova."
Chad, que se formou em Ciência Política, e é responsável por uma equipa de dez pessoas na empresa onde trabalha como analista legislativo, passou a considerar-se "independente", e não democrata, desde o início deste ano. 
Diz-se "profundamente" desiludido com Obama. O plano de estímulo à economia foi "atroz" porque grande parte do dinheiro foi gasta no Governo quando devia ter ido para os orçamentos estaduais para financiar educação e seguro de desemprego. O novo modelo do sistema de saúde? "Pode dizer-se que ele deu 30 milhões de novos clientes às companhias de seguros e lixou o resto das pessoas." E, quanto à reforma financeira, "os bancos de Wall Street estão em grande forma, nós não".
Antes um Presidente morto.
Kathleen Gomes, Washington, Público, 14-10-2010

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